Opinião

STF acerta ao reconhecer ser preciso o aval do Congresso para afastar parlamentar

Autor

  • Adib Abdouni

    é advogado constitucionalista e criminalista e autor do livro "Fake News e os Limites da Liberdade de Expressão".

17 de outubro de 2017, 6h29

A Constituição Federal é a lei maior de um estado democrático de direito e como tal irradia influência direta na interpretação de todo o arcabouço jurídico infraconstitucional que nela deve guardar assento de validade idôneo quando de sua aplicação ao caso concreto.

Críticas políticas e ideológicas apaixonadas à parte, o Supremo Tribunal Federal — ao julgar, por maioria de votos, parcialmente procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.526 — exerceu seu papel institucional de controle constitucional, enquanto intérprete e guardião da Carta da República. Os ministros do Supremo decidiram que a Corte não poderá afastar parlamentares de suas funções sem o aval do Congresso Nacional.

Nem se argumente que o placar apertado de 6×5 represente um racha do Pleno da Corte Suprema ou que deva pairar qualquer suspeita sobre o resultado não unânime aparentemente favorável aos políticos investigados na operação "lava jato", haja vista que o Direito é acima de tudo uma ciência humana, revelando-se natural a ocorrência de entendimentos dissidentes entre si, derivada do livre convencimento de cada um dos magistrados, enquanto exercício intelectual do aplicador da lei.

Reside aí a beleza do sistema de produção de decisões colegiadas, a refletir na formação de um entendimento majoritário, resultante de opiniões e sentimentos diversos dos julgadores, a concluir que a tese final obtida deve afigurar-se como a mais adequada.

O fato técnico intransponível é que o legislador constituinte , motivado pelo movimento de redemocratização do país, quis preservar a garantia do livre exercício do mandato parlamentar na representação do eleitor – o que não deve ser confundido com a figura pessoal de seu titular. Por isso deixou expresso no artigo 53, parágrafo 2º da Constituição Federal, que desde a expedição do diploma o parlamentar não poderá ser preso senão em flagrante delito de crime qualificado como inafiançável, e, mesmo nesse caso, registrou que compete à respectiva Casa Legislativa decidir sobre a regularidade e conveniência da prisão, sem se imiscuir em qualquer juízo prévio de culpabilidade.

Assim, não se afigura mesmo possível – em nome da jurisdição penal – ultrapassar os limites previstos na Carta Magna, sob pena de subverter a previsão constitucional de controle político da prisão, extensível às hipóteses em que a medida cautelar represente o afastamento ou a dificultação do pleno do exercício do mandato parlamentar. A aludida imunidade não se confunde com a hipótese de impunidade, aferível, oportunamente, quando cessado o mandato.

De tal sorte – com a decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal – resta afastada a hipótese de ruptura e violação ao sensível princípio da separação, harmonia e independência que deve haver entre os Poderes da República, com a restauração da ordem constitucional vigente, a repelir a perigosa e nociva supressão do exercício do mandato parlamentar, à revelia do Poder Legislativo, sem que isso implique a impossibilidade de que o próprio Congresso Nacional, impulsionado pela pressão da opinião pública – a exemplo da mitigação do foro privilegiado por prerrogativa de função –, modifique o texto constitucional com supressão desse dispositivo.

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