Ato imoral

Ex-deputada do RS é obrigada a devolver medalha que deu ao próprio irmão

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6 de outubro de 2017, 9h30

Político que concede medalhas a parentes contraria a boa prática administrativa e fere o princípio da moralidade e da impessoalidade, caracterizando flagrante favorecimento pessoal. Por isso, a 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul confirmou sentença que cassou a Medalha do Mérito Farroupilha — distinção máxima outorgada pela Assembleia Legislativa gaúcha — dada a Armando Luiz Formolo pela irmã e então deputada, Marisa Formolo (PT).

O imbróglio começou quando a deputada, prestes a terminar o mandato, homenageou 20 membros de sua família numa cerimônia na Assembleia Legislativa, em 21 de janeiro de 2015. Depois dos discursos, Armando Formolo foi agraciado com a Medalha do Mérito Farroupilha, pela contribuição ao movimento sindical, ao desenvolvimento do setor vitivinícola e à agricultura familiar da serra gaúcha, especialmente Caxias do Sul. Outros nove parentes da deputada também receberam medalhas.

O ato legislativo foi criticado pela imprensa, que viu a atitude da parlamentar como contrária à moralidade pública, o que a obrigou a pedir desculpa a seus eleitores, à sociedade gaúcha e à Mesa Diretora da Assembleia Legislativa.

‘‘Em nenhum momento, quis que minha atitude fosse vista como um ato de vaidade para enaltecer meus parentes. Queria fazer um reconhecimento da importância da família como base da sociedade’’, justificou em nota oficial, dias depois. No entanto, ela não se manifestou sobre a possibilidade de devolução das medalhas, sugestão feita pela comissão executiva do Diretório Estadual do PT-RS.

Em fevereiro de 2015, com o ‘‘silêncio’’ da agora ex-deputada, a advogada Karina Pichsentmeister Palma ajuizou ação popular. Afirmou que a conduta da deputada feriu a moralidade, banalizando o sentido da percepção das honrarias.

Ressaltou que a Assembleia Legislativa é parte legítima para figurar no polo passivo da demanda em razão de ter autorizado a utilização dos recursos e espaço públicos em atividade privada, de interesse familiar da parlamentar. Requereu então a anulação da concessão das medalhas, o ressarcimento dos custos das homenagens e o pagamento de danos morais coletivos ao patrimônio histórico do Rio Grande do Sul.

Sentença parcialmente procedente
O juiz José Antônio Coitinho, da 2ª Vara da Fazenda Pública de Foro Central da Comarca de Porto Alegre, deu parcial procedência à ação popular. Ele anulou o ato de concessão da Medalha do Mérito Farroupilha a Armando Formolo por entender que a Mesa Diretora e a deputada não comprovaram a efetiva aprovação do nome dele pela Assembleia Legislativa.

‘‘Refiro, ainda, que as provas acostadas não comprovam o aludido encaminhamento do memorando, tampouco a sua aprovação. Ao contrário, tais documentos e encartes apenas demonstram a trajetória de vida e labor da ex-deputada e de seu irmão’’, registrou na sentença. Com isso, condenou Marisa a ressarcir os custos relativos à medalha ou a devolvê-la revitalizada e polida.

Situação diversa foi a concessão das nove medalhas alusivas à 53ª legislatura, ponderou o juiz, pois se trata de ‘‘cortesia institucional’’ da Assembleia Legislativa. Essas honrarias são entregues por deputados a pessoas físicas ou jurídicas, independentemente de autorização da Mesa e de qualquer tipo de solenidade oficial. A entrega fica inteiramente a cargo do deputado outorgante, como dispõe a Resolução 942/2009 da Mesa Diretora. A deputada recolheu aos cofres da Divisão de Finanças e Pagamentos da Assembleia Legislativa a quantia de R$ 387, ressarcindo o erário.

Coitinho também negou o pedido de reparação moral, por não verificar, nos autos, ‘‘qualquer efetiva comprovação de dano moral capaz a ensejar o deferimento de indenização’’.

Ato viciado e imoral
O relator da apelação na 1ª Câmara Cível, desembargador Newton Medeiros Fabrício, manteve a decisão do julgador de origem, mas por outros fundamentos. Na sua percepção, a situação relatada nos autos da ação popular pode ser equiparada à figura do nepotismo, visto que o agente público se valeu de sua posição de poder para favorecer um ou mais parentes.

Em geral, argumentou, a avaliação do mérito da própria pessoa é substituída pela valorização do laço de parentesco, sendo suficiente para viciar o ato a possibilidade de exercício dessta influência, ainda que efetivamente não concretizada.

‘‘No caso, a imoralidade do ato é tão flagrante que, à época da concessão, chegou a ser objeto de inúmeras reportagens em vários meios de comunicação, sendo que todas retratavam a desconformidade e a indignação da sociedade gaúcha com o ato praticado’’, escreveu no acórdão, lavrado na sessão de 13 de setembro.

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