Liberdade de informar

Barroso derruba censura imposta à ConJur a pedido de corretora denunciada

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6 de outubro de 2017, 15h53

O tom crítico de uma reportagem não pode servir como argumento para censurar a imprensa. Esse foi o entendimento aplicado pelo ministro Luís Roberto Barroso ao derrubar uma decisão que havia censurado a ConJur, obrigado que a notícia "Corretora ensina' como usar dinheiro de clientes e driblar regras do mercado" fosse retirada do ar. Após a decisão do STF, o texto já foi novamente publicado.

A reportagem mostra que uma corretora de valores que costuma se apropriar de ativos de clientes — e por isso vem respondendo a sanções do Banco Central, da Justiça, CVM, BM&F Bovespa e Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) — está se tornando um verdadeiro manual sobre as fragilidades do sistema financeiro.

A Justiça de São Paulo havia determinado a retirada da reportagem do ar, alegando que a ConJur divulgou informações sigilosas da corretora.

Nelson Jr./SCO/STF
Liberdade de expressão desfruta de posição preferencial na democracia, afirma Barroso.
Nelson Jr./SCO/STF

Representada pelo advogado Alexandre Fidalgo, do escritório Fidalgo Advogados, a ConJur ingressou com Reclamação no STF, com pedido de liminar, afirmando que o texto jornalístico não continha conteúdo sigiloso, uma vez que os hiperlinks inicialmente constantes na matéria não revelavam informações financeiras e, mesmo assim, já haviam sido removidos após pedido. Além disso, o site afirmou que a medida cautelar deferida pelo juízo de primeira instância, sem a oitiva da parte contrária, implica ato de censura.

Ao conceder a liminar derrubando a decisão, o ministro Luís Roberto Barroso ressaltou que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 130, proibiu enfaticamente a censura de publicações jornalísticas, bem como tornou excepcional qualquer tipo de intervenção estatal na divulgação de notícias e de opiniões.

"A liberdade de expressão desfruta de uma posição preferencial no Estado democrático brasileiro, por ser uma pré-condição para o exercício esclarecido dos demais direitos e liberdades", afirmou. Segundo o ministro, eventual abuso no direito à liberdade de expressão deve ser reparado, preferencialmente, por meio de retificação, direito de resposta ou indenização.

Interesse público
O relator afirmou também que a matéria divulgada trata de questões que, em tese, são de interesse público, por tratar de fatos relativos a supostas condutas irregulares praticadas por pessoas jurídicas que, embora tenham natureza privada, prestam serviços a entes públicos.

Para Barroso, não há indícios consistentes de que a ConJur tenha divulgado dados falsos ou utilizado meios vedados pelo ordenamento jurídico para obter tais informações. Afirmou ainda que a decisão da Justiça paulista não individualizou quais dados supostamente acobertados pelo sigilo das operações de instituições financeiras teriam sido ilicitamente divulgados na matéria jornalística.

“Esse modo de proceder contrapõe-se à tese de que a proibição de divulgação de matéria jornalística é medida reservada a casos extremos, a qual, por isso, submete-se a parâmetros restritivos de escrutínio”, disse.

Barroso ressaltou que, partindo da premissa de que os documentos apontados como sigilosos deixaram de ser exibidos pelo site, já que os hiperlinks foram excluídos do texto jornalístico, “não soa plausível a tese de que o restabelecimento de sua divulgação possibilitaria, nessas condições, o conhecimento, por terceiros, de informações relativas às operações de instituições financeiras, as quais, como se disse, estão protegidas por sigilo”.

Por fim, para o relator, o fato de a matéria ter sido redigida com o uso de tom crítico não torna aconselhável, por si só, a proibição de sua divulgação. Para ele, as manifestações jornalísticas que empregam tom ácido demandam, com maior intensidade, a tutela jurisdicional.

“Com isso, não se está a menosprezar a honra e a imagem de eventuais ofendidos, mas a afirmar que esses bens jurídicos devem ser tutelados, se for o caso, com o uso de outros instrumentos de controle que não importem restrições imediatas à livre circulação de ideias, como a responsabilização civil ou penal e o direito de resposta”, concluiu. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

Clique aqui para ler a decisão.
RCL 28.299

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