Opinião

É preciso tributar acréscimo patrimonial obtido por meio de crimes

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11 de novembro de 2017, 6h30

Com base no atual cenário jurídico de aguerrido combate à corrupção, com a delação premiada e a prisão de corruptos e corruptores, a Receita Federal em sua missão fiscalizadora lavrou aproximadamente R$ 1,5 bilhão em autos de infração para pessoas físicas e jurídicas envolvidas nesses esquemas de corrupção.

A Receita tem se valido do teor dos depoimentos colhidos, nas ações penais, para localizar os valores decorrentes de propina ou corrupção, identificar o fato gerador do imposto de renda, e assim efetuar seus lançamentos fiscais, glosando despesas simuladas e aplicando multa de 150% sobre o valor do principal apurado. Tudo acrescido de juros moratórios. Desse material, o Ministério Público Federal ainda pode investigar e enquadrar o acusado pela prática de crime contra a ordem tributária, aplicando-lhe as demais cominações legais, se for o caso.

Dessa forma, a tributação do ato ilícito se tornou um dos temas de maior polêmica na atualidade. Os que defendem a incidência do imposto de renda se baseiam na cláusula tributária conhecida como pecúnia non olet – dinheiro não tem cheiro. Esse termo foi usado pelo Imperador Vespasiano para justificar a criação do tributo pela utilização dos banheiros públicos. Assim, ao fisco pouco importa a origem do dinheiro, vez que nesses casos o sonegador transforma os valores decorrentes de atividades ilícitas em ativos com origem aparentemente legal (lavagem de dinheiro). Ao conceituar tributo, o artigo 3º do Código Tributário Nacional determina que se trata de prestação pecuniária ou compulsória, que não constitua sanção ao ato ilícito.

Ora, em primeira análise, ao rigor da lei, não há como tributar o rendimento decorrente de ato de corrupção, pois se trata de ato ilícito. Contudo, a jurisprudência tem admitido a tributação dessa atividade ilícita, observada a consagração da harmonia entre todos os ramos do Direito. Como bem ensinou o professor Amílcar Falcão, para o Direito Tributário "não importa à configuração do fato gerador a circunstância de consistir ele, concretamente, num ato ou negócio jurídico inquinado de nulidade ou anulabilidade, uma vez que os efeitos econômicos se produzam".

Portanto, pela ótica tributária é irrelevante o aspecto moral do ato, se nulo, anulável ou ilícito. O que importa é o efeito econômico dele decorrente.

Nesse sentido, cite-se também o artigo 26 da Lei 4.506/1964, que continua em vigor e determina: ‘Os rendimentos derivados de atividades ou transações ilícitas, ou percebidos com infração à lei, são sujeitos à tributação, sem prejuízo das sanções que couberem’.

Superada essa polêmica, deparamo-nos ainda com uma celeuma. A Lei 12.850/2013, que – dentre outras providências – disciplinou acerca da colaboração premiada também determinou que o juiz poderá conceder ao colaborador o perdão judicial, a redução em até dois terços da pena privativa de liberdade ou sua substituição pela pena restritiva de direitos.

A legislação ainda prevê que, mediante ofício judicial, os bens objeto do crime poderão ser apreendidos ou sequestrados.

Com isso, há quem alegue que não pode haver tributação, pois o seu objeto foi perdido, e que, no caso em apreço, não se trata da tributação de renda tampouco do acréscimo patrimonial.

Outros sustentam que o que ocorre é a disponibilidade de renda, e nesse caso, tendo em vista a ocorrência do fato gerador do imposto, pouco importando para o Fisco se houve posterior perdimento do dinheiro.

De qualquer forma, não seria justo ao contribuinte "comum" e que age na licitude que o Estado deixasse de tributar o acréscimo patrimonial do réu envolvido em processo de corrupção, sob a pena de estar dando vantagem ao infrator em detrimento do cidadão que atua com retidão de atos.

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