Regulamentação do setor

Transparência nas relações é mais útil que lei sobre lobby, dizem profissionais da área

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9 de novembro de 2017, 14h15

O Congresso Nacional precisa aprovar alguma lei para regulamentar a atividade de “relações governamentais”, ou lobby. Mas também deve tomar cuidado para não transformar o assunto em demanda corporativa. O mais importante, segundo profissionais da área que vêm acompanhando os debates legislativos, é dar transparência às relações entre o Estado e o setor privado.

Em dezembro de 2016, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara aprovou a terceira versão de um projeto que regulamenta a profissão e a atuação de lobistas. A comissão seguiu o terceiro substitutivo feito pela relatora, deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ), e o projeto foi enviado ao Plenário. E até hoje nunca foi discutido.

Para lobistas que participaram de debate promovido pelo Instituto de Relações Governamentais (Irelgov) nesta quinta-feira (9/11), mais importante do que a lei é garantir acesso a informações à sociedade. “Todo cidadão deve saber com quem o agente público esteve e por que”, comenta o advogado Christian Lohbauer, diretor de assuntos corporativos da Bayer no Brasil. O encontro aconteceu na sede da banca Tozzini Freire, em São Paulo.

“Sou a favor da regulamentação. O profissional da nossa área precisa ter uma cara. Mas tenho medo de que isso se transforme numa demanda corporativa, de atendimento a interesses de classe”, afirma Lohbauer, diretor de assuntos corporativos da Bayer. “A capacidade de as corporações organizarem demandas deu no caos institucional que temos hoje. No Brasil, conseguimos explicar quase tudo pelo corporativismo, crise previdenciária, corrupção, enfim.”

A superintendente de relações institucionais e governamentais do Itaú Unibanco, Luciana Nicolo, corrobora. Segundo ela, o caminho é “uma lei simples, sem se preocupar com crachá, clubinho, essas coisas”. “Ali é o espaço democrático. Se o processo legislativo limita esses espaços, afasta ainda mais a sociedade do debate público e da política”, analisa.

Para a diretora de relações governamentais da Nestlé no Brasil, Helga Meuser, é preciso ter cuidado para não “complicar o que já é complexo”. “Deve haver regulamentação, mas adicionar complexidade e isolar o público não favorece o diálogo, nosso maior instrumento de trabalho”, afirma.

O presidente do Irelgov, Erik Camarano, vice-presidente de relações governamentais da General Electric para América Latina, concorda. Ele lembra que organizou um curso sobre o tema para os associados ao Irelgov em Bruxelas, na Bélgica. A União Europeia, diz, é quem tem tratado o lobby de maneira mais avançada e madura. “Lá eles nos falaram muito no gradualismo, para não darmos o remédio certo para o problema errado. Ou seja, não tentar resolver corrupção com a regulamentação do lobby”, afirma. “Lei não vai resolver más práticas”, completa Lohbauer.

Segurança
O projeto sobre lobby é de autoria do deputado Carlos Zarattini (PT-SP), mas, desde que foi protocolado, em 2007, já sofreu inúmeras alterações. Hoje, segundo os presentes ao evento do Irelgov que acompanham a tramitação, o texto está muito superior ao que já foi. Ainda assim, reforça algumas confusões inerentes ao setor, como definir que a atividade de relações governamentais se dedica a mudar leis ou projetos em discussão no Congresso.

São incongruências internas ao mercado. Nesta quinta, o Irelgov divulgou pesquisa sobre como os profissionais da área se veem e comparou com os resultados da primeira fase do trabalho, divulgada em 2016, sobre como os executivos de empresas veem a categoria. E concluiu que, em diversos pontos, as opiniões correntes não batem.

Por exemplo, a maioria dos “líderes empresariais” ouvidos pela pesquisa diz acreditar que o papel do lobby é trabalhar para promover “mudanças em políticas públicas”. Já os lobistas acreditam que sua principal função é “melhorar o ambiente de negócios”.

A maioria dos profissionais das relações governamentais também diz ter como principal atividade o “planejamento estratégico” da empresa. Já os CEOs dizem acreditar que o que eles mais devem se dedicar a fazer é networking.

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