Opinião

Lei federal garante direitos para advogado preso no exercício do ofício

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25 de março de 2017, 7h28

Imponentemente está estabelecido em nossa Carta Magna no art. 133 que

“O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”.

Fazendo uma rápida reflexão sob o dispositivo citado, nos questionamos: que limites são esses?

Como o assunto em pauta é a prisão em flagrante do advogado no exercício de seu mister, somente nele que nos atentaremos para que o foco não se disperse.

Pois bem, assim sendo, quando o advogado pode sofrer uma prisão em flagrante no exercício da profissão?

Encontramos a resposta, de forma clara e cristalina, no art. 7°, §3° do Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil – OAB (Lei Federal n° 8.906/94) que dispõe:

“Art. 7º São direitos do advogado:

§ 3º O advogado somente poderá ser preso em flagrante, por motivo de exercício da profissão, em caso de crime inafiançável, observado o disposto no inciso IV deste artigo”.

Para que possamos compreender a real aplicação do dispositivo acima, precisamos saber quais os crimes que a lei estabelece como inafiançáveis, pois somente eles e, frisa-se, unicamente eles, quando cometidos no exercício da profissão, habilitam a prisão em flagrante do advogado.

Nossa Carta Magna de 1988 estabelece em seu art. 5°, incisos XLII, XLIII e XLIV os crimes inafiançáveis:

Art. 5° (…)

“XLII – a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;

 XLIII – a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;

XLIV – constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático”: (grifo nosso)

Dessa forma, o amparo constitucional é suma importância quando o advogado atua fora da zona de conforto e encontra-se diante de uma possível, por exemplo, violação de prerrogativa. Fazer valer um direito seu no exercício de sua profissão é um direito garantido por lei federal e assim deve ser respeitado.

Na prática, o que muito acontece quando o advogado faz valer suas prerrogativas de forma incisiva e segura, mostrando-se conhecedor daquilo que sustenta, logo surge algum tipo de cerceamento de atuação por parte da “autoridade” que está se debatendo a questão e, quase sempre, com a intimidação de voz de prisão, diga-se, em flagrante delito.

Para que consigamos compreender ainda mais o assunto aqui exposto, a CF/88 fala que a prisão em flagrante do advogado se dá, também, pelo cometimento de crimes tidos como hediondos (Lei. 8.072/90).

Que advogado cometerá um crime hediondo ou qualquer outro descrito como inafiançável (tortura, racismo – e não injúria racial -, terrorismo…) no exercício da profissão?

Parece-me fora da realidade imaginar um advogado cometendo alguns dos crimes inafiançáveis descritos quando exerce sua honrosa profissão.

Certo é que para toda regra existe uma exceção, porém, neste caso, enxergo uma exceção bem distante.

Esta reflexão deve ser feita com muita atenção, pois a temeridade da prisão em flagrante que padece alguns advogados quando estão exercendo sua profissão é real e constante, o que não deveria acontecer quando se tem o conhecimento constitucional e penal acerca do tema.

Nosso diploma processual penal, em seu art. 323, reitera o disposto na CF/88 estabelecendo os crimes que são inafiançáveis

“Art. 323.  Não será concedida fiança: 

 I – nos crimes de racismo; 

 II – nos crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, terrorismo e nos definidos como crimes hediondos; 

III – nos crimes cometidos por grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático;” 

Assim, com base constitucional, penal e processual penal afasta-se, por completo, o folclore da prisão em flagrante do advogado pelo crime de desacato, desobediência…ou qualquer outro (cometido no exercício da profissão) que não seja inafiançável.

Apenas para complementar o tema, recomenda-se a leitura e estudo dos artigos 61 e 69 da Lei n.º 9.099/95 que tratam sobre as infrações penais de menor potencial ofensivo e do termo circunstanciado, respectivamente.

Jamais um profissional de tamanha importância deve ser privado de exercer o seu ofício por represálias ilegais, inexistentes no ordenamento jurídico ou, pior, criadas para a conveniência de alguma classe sem amparo legal.

Ainda, por fidelidade jurídica, ressalta-se que o advogado pode cometer crimes no exercício da profissão como qualquer outro profissional e responderá por isso na medida de sua responsabilidade, porém, a prisão em flagrante delito somente será legal quando fundamentada nos casos expressamente previstos em lei.

Como estamos abordando o §3° do art. 7° do Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, devemos fazer menção, também, ao inciso IV do artigo supracitado, a saber:

“IV – ter a presença de representante da OAB, quando preso em flagrante, por motivo ligado ao exercício da advocacia, para lavratura do auto respectivo, sob pena de nulidade e, nos demais casos, a comunicação expressa à seccional da OAB;”

Com base no dispositivo acima, sendo o flagrante legal ou ilegal (o que será apurado em cada caso concreto), o advogado tem o direito de ter um representante da OAB para acompanhar toda a situação que se encontra fortalecendo, ainda mais, o livre exercício da advocacia quando realizado dentro dos padrões éticos, morais e profissionais.

Corroborando todo o exposto quanto à liberdade de atuação profissional do advogado, dispõe o art. 31, §§ 1° e 2° da Lei 8.906/94:

“Art. 31. O advogado deve proceder de forma que o torne merecedor de respeito e que contribua para o prestígio da classe e da advocacia.

§ 1º O advogado, no exercício da profissão, deve manter independência em qualquer circunstância.

§ 2º Nenhum receio de desagradar a magistrado ou a qualquer autoridade, nem de incorrer em impopularidade, deve deter o advogado no exercício da profissão.”

Por fim, sabendo o advogado desta importante prerrogativa estabelecida em lei federal, quando se ver diante de uma situação arbitrária no exercício da profissão, não deve nada temer e, se for o caso, buscar amparo no ordenamento jurídico para fazer valer um direito seu (e não um favor) como, por exemplo, na Lei n° 4.898/65 (abuso de autoridade), pois, conforme esta dispõe em seu art. 3°, “j”:

Art. 3º. Constitui abuso de autoridade qualquer atentado:

j) aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício profissional.

Nada é mais atentatório à justiça do que uma afronta às prerrogativas advocatícias!

O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons” – Martin Luther King

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    é advogado, consultor jurídico, vice-presidente da Comissão de Direito Penal e Direito Processual Penal da OAB/SP - Subseção Lapa, membro da Comissão de Prerrogativas da OAB/SP - Subseção Lapa.

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