Lavagem eleitoral

Leia o voto de Celso de Mello na denúncia contra Valdir Raupp

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9 de março de 2017, 10h21

A prestação de contas à Justiça Eleitoral pode constituir meio de viabilizar o crime de lavagem de dinheiro se os recursos oficialmente doados a um candidato ou a um partido tiverem origem criminosa, resultante da prática de outro ilícito penal. Esse foi o entendimento do ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal no Inquérito 3.982, que tem como denunciado o senador Valdir Raupp (PMDB-RO).

"Configurado esse contexto, que traduz engenhosa estratégia de lavagem de dinheiro, a prestação de contas atuará como típico expediente de ocultação ou de dissimulação da natureza delituosa das quantias doadas em caráter oficial oriundas da prática do crime de corrupção, por exemplo", explica o ministro.

Celso de Mello foi um dos ministros da 2ª Turma do STF que votou pelo recebimento da denúncia contra o parlamentar. Raupp é acusado de receber doação eleitoral legal, mas de origem ilícita, além de lavagem de dinheiro e corrupção em um dos inquéritos da operação "lava jato".

Na visão de Celso de Mello, é possível a configuração do crime de lavagem de dinheiro ainda que não haja integral exaurimento de cada um dos estágios que caracterizam o modelo trifásico (colocação + dissimulação/ocultação + integração). "Isso significa que o crime de lavagem pode consumar-se já em seu primeiro estágio, revelando-se desnecessário atingir o auge da aparente licitude de bens ou valores", afirma.

A questão básica, explica o ministro, "consiste em identificar, na conduta imputada aos agentes, a sua plena adequação ao modelo típico, abstratamente definido na lei, concernente ao próprio núcleo do tipo penal, pois — é desnecessário dizê-lo —, sem que se evidenciem os atos de ocultação e/ou de dissimulação, não haverá como reconhecer configurado o delito de lavagem de valores ou de capitais".

Em seu voto, o ministro ressaltou que a denúncia deve ser recebida por estar devidamente fundamentada, apresentando elementos indiciários mínimos para a abertura do processo. O ministro destaca também em seu voto a questão do depoimento do agente colaborador como suporte autorizador do recebimento da denúncia.

De acordo com o ministro, o depoimento de um colaborador pode autorizar a formulação e o recebimento da denúncia, desde que corroborado por provas autônomas. Contudo, complementa Celso de Mello, é impossível a condenação penal com suporte unicamente em depoimento prestado pelo agente colaborador.

"Embora os elementos de informação prestados pelo agente colaborador possam justificar a válida formulação de acusação penal, não podem, contudo, legitimar decreto de condenação criminal, eis que incumbe ao Ministério Público o ônus substancial da prova concernente à autoria e à materialidade do fato delituoso", afirma o ministro.

Também votaram pelo recebimento da denúncia o relator, ministro Edson Fachin, e o ministro Ricardo Lewandowski. Os ministros Dias Toffoli, que abriu a divergência, e Gilmar Mendes ficaram vencidos por aceitarem a denúncia somente pelo crime de corrupção.

Clique aqui para ler o voto do ministro Celso de Mello.
INQ 3.982

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