Pressão punitivista

É mais fácil, hoje, condenar do que arquivar um processo, diz Gilmar Mendes

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7 de março de 2017, 19h45

A pressão popular e da imprensa pode levar denúncias vazias a serem aceitas pela Justiça. Segundo o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes, há inquéritos que nem deveriam ser abertos, mas o são por causa dos reflexos do caso na sociedade. Por isso, o ministro conclui: “É mais fácil, hoje, condenar alguém do que arquivar o processo”.

Carlos Humberto/SCO/STF
Ministro criticou também o debate sobre a prerrogativa de foro especial, dizendo que há um estelionato intelectual.
Carlos Humberto/SCO/STF

Em aula magna no Instituto de Direito Público de São Paulo, nesta segunda-feira (6/3), Mendes, que também é presidente do Tribunal Superior Eleitoral, não descartou que a pressão da população e da mídia sobre os Poderes seja importante.

Teoria é teoria, prática é prática
Questionado sobre o sigilo em relação às delações premiadas, o ministro ponderou que o sigilo do material deve ser mantido até que a denúncia seja recebida, conforme o artigo 7º, parágrafo 3º, da Lei das Organizações Criminosas, mas que a realidade impõe novos desafios.

O grande problema, explicou, é que a violação de sigilo tornou-se um crime de persecução praticamente impossível. Por isso, sugere que talvez, na prática, revelar tudo seja a solução. Deixando claro que não falava do caso concreto, Gilmar Mendes citou o que tem acontecido com o ministro Herman Benjamin no TSE, relator da ação que pode cassar o mandato de Michel Temer: “O sigilo imposto torna-se um segredo de polichinelo diante dos vazamentos, inclusive tortuosos e distorcidos, gerando os problemas mais variados”.

“Diante disso é melhor que se curve aos fatos”, complementou o ministro, explicando que essa limitação de acesso é prevista porque aparecem, ao longo das investigações, muitos fatos sem relevância e que não se comprovam. “Pode haver delator que tenha sido induzido. Pode ter havido abuso do investigador. Coisas assim que podem ocorrer. Tudo isso, coberto pelo sigilo, traria mais proteção. Mas o quadro hoje é muito peculiar.”

Outro grande problema com os vazamentos são os ares de prova dados às delações premiadas nas manchetes. O presidente do TSE destacou, inclusive, que o ministro Teori Zavascki (morto no começo deste ano em um acidente de avião), quando despachava sobre homologação de delações, condicionava a efetivação do acordo e a concessão dos benefícios concedidos à verificação do resultado.

“Em função, talvez, da pouca experiência com o tema, e do caráter candente político do tema, isso ganhou até um ranking no Brasil sobre quantas vezes o sujeito foi citado. Tudo isso tem que ser moderado na visão do técnico. Na visão de quem vai fazer uma avaliação e julgar”, complementou.

“Estelionato intelectual”
Para Gilmar Mendes, o debate travado atualmente sobre a extensão do foro especial por prerrogativa e seus efeitos na condenação de parlamentares e membros do alto escalão do governo federal parte de um “estelionato intelectual”. De acordo com ele, o desconhecimento da população sobre o assunto é usado para moldar uma opinião que difere da realidade.

Sobre os apontamentos que ações criminais envolvendo parlamentares prescrevem no Supremo, Gilmar Mendes destacou que isso não é culpa da corte, pois antes de julgar é preciso investigar e apresentar a denúncia. Disse ainda que a possibilidade de a ação perder sua eficácia jurisdicional é um meio de garantir a segurança jurídica do processado, dando um prazo de encerramento.

Em relação à suposta morosidade do STF, o ministro questionou se outras instâncias são diferentes. Ressaltou que a 13ª Vara Federal de Curitiba, onde atua o juiz Sergio Moro — responsável pela operação “lava jato” na primeira instância —, é uma exceção, inclusive porque só está atuando em casos ligados aos desvios ocorridos em contratos da Petrobras.

Para Gilmar Mendes, os julgamentos de parlamentares e membros do primeiro escalão do governo federal pelo STF existe para dar segurança institucional. Essa segurança, continuou, evita que brigas políticas sejam levadas à Justiça apenas para denegrir a imagem de um adversário.

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