Efeito colateral

Graças a Trump, faculdades celebram alta da popularidade da advocacia

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2 de março de 2017, 16h16

Nos últimos dias de janeiro, os aeroportos internacionais dos EUA ferveram. Milhares de americanos foram aos aeroportos para protestar contra o decreto do presidente Donald Trump que permitiu a agentes da imigração barrar a entrada de muçulmanos no país. Milhares de advogados também apareceram para socorrer os barrados — 4 mil se inscreveram para defendê-los gratuitamente nas cortes. Em alguns aeroportos, a multidão gritava: “Thank you lawyers! Thank you lawyers!”.

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Decreto de Trump contra muçulmanos alavancou a popularidade dos advogados.
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Nos dias que se seguiram, diversos juízes decidiram que o decreto de Trump, que visava particularmente cidadãos de sete países muçulmanos, era inconstitucional. No final das contas, Trump desistiu do decreto e anunciou que iria buscar outra forma jurídica de lidar com a questão.

Para a população irritada com a discriminação religiosa, venceu a legalidade. E, para o bem da profissão, os advogados surgiram como os defensores da legalidade — uma coisa que acontece sempre que ela corre perigo. A profissão, que estava em baixa aos olhos dos estudantes, principalmente os mais qualificados, experimentou um surto repentino de popularidade. Estudantes sonham com a advocacia, de novo.

O reitor da Faculdade de Direito de Brooklyn, Nicholas Allard, escreveu em um artigo para o Hill que a ação dos advogados para impedir o sucesso do decreto ilegal de Trump reavivou o idealismo dos estudantes, que voltaram a ver os advogados como “os defensores dos direitos dos cidadãos, da busca da justiça e da preservação da República”.

“Da mesma forma que os jornalistas do Washington Post Bob Woodward e Carl Bernstein, que trabalharam no caso Watergate, inspiraram toda uma geração de estudantes a sonhar com o jornalismo, a ação dos advogados em favor da legalidade está causando o renascimento do ensino jurídico”, escreveu Allard.

O fenômeno repercutiu em todo o país porque, de uma hora para outra, os advogados passaram a ocupar a primeira página de todos os jornais do país e a dar entrevistas nas grandes emissoras de rádio e TV. Muitos advogados se tornaram os comentaristas da vez nas emissoras de televisão a cabo. O trabalho pro bono da classe, diante das circunstâncias, foi altamente recompensado por uma nova onda de respeito pela profissão.

A reitora da Faculdade de Direito da Universidade de Washington disse, em entrevista a emissoras de televisão, que, além da nova popularidade dos advogados com a mídia, muitos advogados foram convidados a fazer palestras em jantares de associações e outros eventos. Advogados foram aplaudidos por pequenas multidões, ao descerem as escadarias dos tribunais brandindo uma decisão judicial em favor dos muçulmanos.

A luta dos advogados foi especialmente benéfica para a União Americana das Liberdades Civis (American Civil Liberties Union – Aclu), uma entidade não partidária, sem fins lucrativos (vivendo de contribuições da população), que mantém uma grande equipe de advogados para “defender e preservar os direitos e liberdades individuais”. A Aclu recebeu mais de US$ 79 milhões em contribuições pela internet, na esteira da luta em favor da legalidade.

“Trump fez um grande favor à advocacia e às faculdades de Direito, mesmo que involuntariamente, ao transformar os advogados em estrelas da noite para o dia”, escreveu Allard. “As faculdades e a advocacia estão precisando de uma injeção de idealismo e de juventude — uma juventude familiarizada com alta tecnologia.”

O episódio também foi benéfico para a classe dos juízes. Em processos movidos em diversos tribunais pelo país, os juízes sustentaram a ilegalidade e a inconstitucionalidade do decreto anti-imigratório de Trump, o que lhes rendeu críticas ácidas do presidente. No final das contas, tais críticas foram absorvidas pela população como elogios.

Advogados contra a ditadura
No Brasil, os advogados brilharam na luta em favor da legalidade, durante o regime militar. Muito dessa luta foi documentada no filme Os Advogados Contra a Ditadura, de Silvio Tendler, e nos livros Advogados e a Ditadura de 1964 – A defesa dos perseguidos políticos no Brasil e Advocacia em tempos difíceis. Na época, a profissão foi chamada de “advocacia-arte”.

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