Fiel da balança

Justiça de SP vai definir quais usuários serão internados pela prefeitura

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26 de maio de 2017, 20h38

A Justiça de São Paulo será quem vai decidir, após uma avaliação clínica, quais usuários de drogas serão internados pela administração João Doria (PSDB-SP). As informações são do jornal Folha de S.Paulo, e a decisão vem dois dias após pedido da administração municipal.

Fernanda Carvalho/Fotos Públicas
Justiça atendeu, em parte, pedido da gestão João Doria sobre dependentes químicos que circulam na cracolândia.
Fernanda Carvalho/Fotos Públicas

Funcionará da seguinte forma: durante 30 dias, agentes de saúde da cidade de São Paulo e guardas civis metropolitanos abordarão usuários de crack na região da Cracolândia e nas imediações para avaliar o estado dessas pessoas. Caso seja decidido que é necessária a internação compulsória, será feito um pedido à Justiça, que analisará caso a caso.

O pedido da prefeitura foi feito em uma ação movida pelo Ministério Público de São Paulo em 2012 para impor limites à ação da Polícia Militar na abordagem de usuários de drogas.

Já há uma cautelar nessa ação impedindo ações policiais que causem situação vexatória, degradante ou desrespeitosa contra usuários de drogas. Também proíbe os agentes de segurança de impedir pessoas nessa condição de permanecer em ruas ou de obrigá-los a ir para outros lugares, exceto em caso de flagrante delito.

Segundo a Prefeitura de SP, a internação compulsória é necessária porque os usuários de drogas não têm mais controle sobre seus atos e precisam de auxílio. Cita ainda como justificativa que as péssimas condições sanitárias da área afetam a coletividade e os próprios dependentes químicos.

“Esse estado de coisas está a deteriorar o ambiente social”, diz a prefeitura, complementando que “era como se a cidade de São Paulo condenasse seus habitantes a morte certa”. Outro fator mencionado é a presença do Primeiro Comando da Capital (PCC) na área.

Os membros do PCC, disse a prefeitura, estariam cooptando usuários de drogas na área. Segundo a administração municipal, a presença do grupo criminoso impede “qualquer aproximação assistencial”. “Se antes a venda de drogas possuía um ponto fixo, agora as 'bocas de fumo' encontram-se flutuantes”, detalha.

Críticas à ideia
A Defensoria Pública de São Paulo e o MP-SP se manifestaram contra o pedido da prefeitura paulistana. Para os defensores públicos, o pedido é extremamente vago, amplo e perigoso, pois daria carta branca para eleger quem são as pessoas nesse estado, sem que houvesse qualquer possibilidade de defesa a elas.

A Defensoria argumenta que a Lei Antimanicomial (Lei Federal 10.216/2001) limita a internação compulsória quando outras tentativas de tratamento forem insuficientes. Diz ainda que essa medida deve ser excepcional, com laudo médico prévio, e que o pedido afronta as leis federais Lei 8.080/90 e Lei 11.343/06.

A primeira, que rege os princípios do Sistema Único de Saúde (SUS), determina a preservação da autonomia das pessoas na defesa de sua integridade física e moral. Já a segunda, que é a Lei de Drogas, garante o respeito aos direitos fundamentais da pessoa humana, especialmente à sua autonomia e liberdade, com respeito aos usuários e dependentes de drogas.

Já o MP-SP afirmou que a prefeitura descumpriu um pacto firmado desde o início deste ano. Entre as medidas que foram descumpridas está a de que não haveria uma grande operação policial na região. “A partir da operação policial, as informações que tivemos, para nossa surpresa, é de que a Guarda Civil, uma guarda sob comando da prefeitura, tomou conta do território, mas não para acalmar a situação ou acomodação daquela região para o atendimento da saúde e assistencial”, disse o promotor Eduardo Ferreira Valério.

Segundo Valério, a operação tinha que ser paulatina, discreta, quase invisível, de forma que os agentes pudessem abordar as pessoas com uma estratégia de singularidade, atendendo caso a caso. "A tônica do projeto é de que ele seria capitaneado pela saúde e pela assistência social e que a atuação da polícia seria secundária de, na retaguarda, garantir o trabalho das equipes de assistência social e de saúde", afirmou Valério.

“Infelizmente a Guarda Civil entrou, após a operação policial, de maneira dura, repressiva, revistando bolsas, pessoas e moradores, impedindo a livre circulação e expulsando usuários”, complementou.

Para o presidente do Conselho Nacional dos Direitos Humanos, Darci Frigo, a operação policial na cracolândia foi “uma intervenção policial violenta, desproporcional e desnecessária". Segundo ele, o ato foi feito "sem nenhum planejamento com as equipes de assistência social e saúde que poderiam garantir que as pessoas em situação de drogas e a população em situação de rua tivessem garantias mínimas de seus direitos preservados".

Barracos no chão
A cracolândia foi palco de confronto no último domingo (21/5) com a entrada dos policiais na região, que alegaram a necessidade de prender traficantes. Depois das prisões, os agentes derrubaram barracos dos moradores de rua que lá estavam e os retiraram da área para que fosse feita a limpeza.

Também foi demolida parte de um prédio sem a confirmação de que pessoas ainda estariam no imóvel. Três ficaram feridos. Toda essa ação foi feita sob bombas de gás partindo da polícia e pedras sendo atiradas pelos moradores da cracolândia.

Decisão proferida nesta quarta-feira (24/5) pela 3ª Vara da Fazenda Pública determina que nenhuma remoção na área da cracolândia aconteça sem que seja feito prévio cadastramento das pessoas para atendimento de saúde e habitação, além de permitir que elas retirem pertences e animais de estimação dos imóveis.

Os membros do CNDH pediram a suspensão de “todo e qualquer ato de remoção compulsória de pessoas e bens, bem como o bloqueio e demolição de edificações na região da Luz”. Com informações da Agência Brasil.

* Texto atualizado às 23h do dia 26/5/2017 e às 11h do dia 27/5/2017 para correção. 
Diferentemente do informado anteriormente, internação de cada usuário de drogas depende de aval do juízo.

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