As diversas operações que tiveram e têm por objeto investigar denúncias de fraude em contratos administrativos e de empresas públicas, como é o caso da atual operação "lava jato", independentemente de qualquer juízo de valor, impactaram diretamente as relações entre contratantes e seus contratados.
Essa mudança no caso da Petrobras é paradigmática, por se tratar de uma das maiores empresas brasileira, sendo direta e indiretamente, quiçá, a maior contratante do país. Ocorre que, por causa do novo ambiente de compliance, a desqualificação ou proibição, ainda que temporária, de as empresas envolvidas nos escândalos de corrupção participarem das novas licitações, o mercado enfrenta agora um grande desafio: como as fornecedoras da Petrobras desenvolverão as suas atividades de agora por diante?
O novo ambiente de contratos com a Petrobras já aponta alterações na forma de execução das obras contratadas. Ao se analisar os novos editais de licitação, notamos que as minutas dos respectivos contratos apresentam crescimento no número de obrigações às contratadas, especialmente em pontos que lhes transferem os riscos inerentes ao contrato.
Uma das mais sensíveis alterações se dá pelo não pagamento pelo que chamamos “dia de chuva”; refere-se à paralisação da obra nos dias em que houver ocorrência de chuva e/ou descargas atmosféricas que ponham em risco pessoas, equipamentos e o próprio local da obra em caso de continuidade de trabalho. Essa paralisação sempre foi remunerada pela contratante, pois impacta diretamente no custo e prazo da obra calculados pela contratada.
Explico: custo refere-se ao pagamento dos trabalhadores diretos e indiretos impedidos de trabalhar, bem como despesas com equipamentos, próprios ou alugados, necessários para execução da obra. O impacto no prazo se dá na medida em que a obra não pode avançar no cronograma nos dias de paralisação. Por causa desses impactos, a contratante tanto remunerava os custos excedentes decorrentes da paralisação quanto acrescia ao prazo final de entrega da obra a quantidade dos dias parados.
O intuito dessa cláusula é a proteção dos trabalhadores e comunidades próximas à obra, bem como do equipamento utilizado e do próprio meio ambiente, visto que a intervenção em dias de chuva tem maior impacto destrutivo.
Nos contratos anteriores se fazia uma média calculando o tempo parado em horas, com o valor HH (homem-hora) determinado para cada atividade e competência, utilizando critérios de cálculos similares para maquinários e equipamentos.
Nos contratos atuais, não há mais previsão de pagamento por dia de chuva, por conseguinte, o risco/custo foi transferido ao empreiteiro. Assim, há que se avaliar qual o custo destes dias parados (mão de obra direta, indireta, equipamento locado ou próprio). Os empreiteiros devem fazer o devido cálculo sob pena de ver todo o lucro da operação ir por água abaixo (com perdão do trocadilho).
Obviamente, está se transferindo o risco climático diretamente à contratada. Sabe-se que, com o setor de óleo e gás paralisado no Brasil, as empresas estarão dispostas a assumir tais riscos para vencer as licitações e retomar as atividades empresariais. De outro lado, com essa transferência de risco implica na necessidade de se analisar de forma pormenorizada o preço ofertado para que o resultado final não seja mais desastroso do que não vencer a licitação.
Mais importante que as questões econômicas ou de prazo de entrega, há, ainda, que se fixar o olhar para as questões de qualidade, segurança, meio ambiente e saúde (QSMS) das empresas, pois não havendo pagamento pelos dias parados nem desconto no prazo de entrega da obra, quais os riscos inerentes à continuidade da obra em dias de chuva no tocante às questões de risco ambiental, risco às comunidades fronteiriças à obra etc. Assim, o risco jurídico do contrato aumentou sensivelmente, na esfera cível, diretamente entre contratante e contratada para discussão de eventuais prejuízos do contrato, ou, ainda, equipamentos locados em caso de danos. Na esfera trabalhista com o provável aumento das reclamações trabalhistas em caso de acidentes pela não paralisação em dias de chuva. Como também, mas não menos importante, na esfera ambiental, caso ocorra danos ao meio ambiente não previstos anteriormente.
Dessa forma, alertamos que a formação do preço deverá ser feita com muita acuidade, e para tanto a análise jurídica dos riscos envolvidos é fundamental. Há que se considerar os impactos trabalhistas, ambientais e cíveis que permeiam um contrato desprovido do anexo referente ao pagamento de dia de chuva para a formação do valor final da oferta. Sob pena de ocorrer um desequilíbrio contratual, com consequências nefastas de discussões judiciais, com quebras de contrato e finalmente a não entrega da obra acarretando em mais prejuízos à já incipiente malha dutoviária nacional.