Novas regras

Lei de Migração garante visto humanitário
e criminaliza "coiote", mas veta anistia

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25 de maio de 2017, 13h47

O presidente Michel Temer (PMDB) sancionou a nova Lei de Migração, que revoga o Estatuto do Estrangeiro de 1980 e busca tornar menos rígidas as regras para a entrada de pessoas no Brasil. O texto, publicado nesta quinta-feira (25/5), entra em vigor em 180 dias e tem 21 vetos à redação aprovada em abril pelo Senado, como a anistia a quem chegou ao país até 6 de julho de 2016.

Pela proposta original, pessoas que estavam em situação irregular conseguiram autorização de residência e ficariam isentas de pagar quaisquer multas, taxas e emolumentos consulares. Já a Casa Civil e o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência entenderam que o dispositivo poderia “esvaziar” a discricionariedade do Estado para o acolhimento dos estrangeiros, ao dar anistia indiscriminada antes de conferir a situação migratória de cada um.

A Lei 13.445/2017 altera o Código Penal para criminalizar a promoção de migração ilegal, praticada pelos chamados “coiotes”. A partir de agora, quem obtém vantagem econômica com a entrada ilegal de estrangeiros em território nacional ou vice-versa — cobrar para colocar brasileiros em outro país — pode ser condenado à prisão, entre 2 e 5 anos, mais multa. A pena é ampliada (um sexto a um terço) se a pessoa envolvida for vítima de violência ou submetida a condição desumana ou degradante.

TIPOS DE VISTO:

I – de visita;
II – temporário;
III – diplomático;
IV – oficial;
V – de cortesia.

Também são criadas novas modalidades de vistos, como o humanitário. Haitianos já haviam conseguido o benefício por meio de ato administrativo do Conselho Nacional de Imigração, mas é a primeira vez que o tema é fixado em lei, de forma abrangente.

Interessados em vir ao Brasil para trabalhar não precisam mais ter proposta de emprego já negociada: agora, o visto para trabalho será concedido se conseguirem vaga depois de desembarcar ou comprovarem formação em ensino superior.

Em casos de deportação, a regra determina ainda que a Defensoria Pública da União seja sempre notificada para prestar assistência em todos os procedimentos administrativos. Apenas a comunicação é obrigatória — se a DPU deixar de se manifestar, a medida poderá ser tomada. A Polícia Federal é reconhecida como responsável pelas “funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteira”, nos pontos de entrada e saída.

A Lei de Migração também garante a todo estrangeiro a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, derrubando a proibição de que esse público se associe a entidades ou sindicatos e fixando expressamente o direito de acesso a serviços públicos (o que já vinha sendo feito com base na Constituição de 1988).

Ficam mantidos direitos e obrigações estabelecidos por tratados vigentes no Brasil, quando mais benéficos ao migrante ou visitante. De acordo com o texto, “autoridades brasileiras serão tolerantes quanto ao uso do idioma do residente fronteiriço e do imigrante quando eles se dirigirem a órgãos ou repartições públicas” para reclamar ou reivindicar direitos. 

Propostas barradas
Entre os 21 vetos, Temer retirou do texto a concessão automática de residência a estrangeiros aprovados em concursos públicos no Brasil e dispositivo que tratava de “grupos vulneráveis”, como requerentes de visto humanitário, menores desacompanhados e vítimas de tráfico de pessoas e de trabalho escravo. O problema é que o texto incluía no grupo migrantes condenados criminalmente, ainda que em liberdade.

Também ficou de fora o direito à livre circulação de índios e populações tradicionais em áreas de fronteira. A ideia do Congresso era dar livre acesso a esses povos em “terras tradicionalmente ocupadas”, mas o Planalto avaliou que a regra prejudicaria o controle de entrada e saída e a competência da União de demarcar áreas.

Análise
A diretora do Departamento de Migrações do Ministério da Justiça, Silvana Helena Vieira Borges, afirma que a lei não acaba com restrições à chegada de pessoas, e sim reconhece ferramentas e garantias já adotadas pelo Estado brasileiro, como o direito de acesso ao Sistema Único de Saúde (SUS) e a possibilidade de se conceder visto humanitário.

Silvana ressalta que as concessões de refúgio ainda seguem normas distintas, estipuladas pela Lei 9.474/1997, para quem vive em condições de grave violação a direitos humanos e é perseguido por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas. Ainda segundo a diretora, vários procedimentos serão regulamentados em seis meses, quando a nova norma entrar em vigor.

Para o defensor público Daniel Chiaretti, coordenador do Grupo de Trabalho de Migrações e Refúgio da DPU em São Paulo, a lei avança ao derrubar burocracias do estatuto de 1980, que considera muito fechadas.

Obrigar a notificação da Defensoria Pública da União em processos de deportação, segundo ele, garante acesso à Justiça e o direito ao contraditório. O defensor diz que o desafio agora é estruturar a instituição para atender à demanda e criar canais para facilitar o acesso do estrangeiro a esse tipo de serviço.

Chiaretti critica os vetos à redação original. Nesta quinta, por exemplo, já teve de contar o fim da anistia a uma pessoa em situação irregular. Ele afirma que a conduta do governo federal vai dificultar a situação desse público e rompe tradição já praticada pelo país nos anos 1998 e 2009, nas gestões Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva.

* Texto atualizado às 18h15 do dia 25/5/2017 para acréscimo de informações.

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