Paradoxo da Corte

Critérios para o cabimento de honorários em sede recursal

Autor

  • José Rogério Cruz e Tucci

    é sócio do Tucci Advogados Associados ex-presidente da Aasp professor titular sênior da Faculdade de Direito da USP membro da Academia Brasileira de Letras Jurídicas e do Instituto Brasileiro de Direito Processual e conselheiro do MDA.

23 de maio de 2017, 8h00

É generalizado o entendimento, no atual ambiente jurídico, de que os tribunais superiores, cumprindo a missão que lhes é outorgada pela Constituição Federal, qual seja a de interpretar e aplicar o direito vigente, têm fornecido expressivos subsídios hermenêuticos, em particular naquelas hipóteses que decorrem de leis ou regras mais recentes, que se apresentam como novidade em nosso ordenamento jurídico.

É exatamente o que se extrai de importante julgado do Superior Tribunal de Justiça, que enfrentou, pela primeira vez de modo mais aprofundado, o tema do cabimento dos honorários advocatícios na esfera recursal, à luz do disposto no artigo 85, parágrafo 11, do Código de Processo Civil: “O tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos parágrafos 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos parágrafos 2º e 3º para a fase de conhecimento”.

Trata-se do acórdão proferido pela 3ª Turma, nos Embargos de Declaração no Agravo Interno no Recurso Especial 1.573.573-RJ, da relatoria do ministro Marco Aurélio Bellizze. Predestinado a constituir excelente precedente na referida matéria, vale examinar tal ato decisório unânime, porque demonstra, antes de mais nada, o talento e a didática que exornam a atuação cuidadosa do aludido ministro relator.

Com efeito, dado o ineditismo da questão atinente à fixação dos denominados honorários advocatícios recursais, no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, o ministro Marco Aurélio Bellizze, depois de investigar as soluções ministradas pela jurisprudência em outras ocasiões pretéritas, parte da premissa de que “a mais adequada é aquela adotada pelo Supremo Tribunal Federal na interpretação das novas regras de honorários advocatícios sucumbenciais advindas da edição do Código de Processo Civil de 1973; e, assim, entendo que as novas regras relativas a honorários advocatícios sucumbenciais devem ser aplicadas imediatamente em qualquer grau de jurisdição, sempre que houver julgamento da causa, com a fixação ou a modificação da sucumbência”. Desse modo, assevera o julgado:

“Se, apreciando o recurso, o julgador reexamina a causa, deve, ao final, fixar os honorários advocatícios segundo os novos critérios trazidos pelo Código de Processo Civil de 2015, sempre que o novo julgamento no grau recursal resultar na alteração da sucumbência. Nessas hipóteses, por exemplo, não poderá admitir a compensação de verba honorária, terá que observar os limites tarifários fixados para as causas nas quais é parte a Fazenda Pública, entre outros regramentos. De outro lado, se no grau recursal o tribunal julgar o recurso sem alterar a sucumbência, não lhe é dado reexaminar os honorários advocatícios tal como fixados na origem para aplicar o novo Código de Processo Civil. Por conseguinte, se não houve provimento do recurso com alteração da sucumbência, não é dado ao julgador afastar, v. g., a compensação autorizada com base no antigo diploma. Pode, é claro, quando for objeto do recurso, reexaminar o valor da verba honorária fixada pelas instâncias ordinárias com respaldo no Código de Processo Civil de 1973, avaliando sua proporcionalidade e razoabilidade. Conclui-se, pois, que, na aplicação do direito intertemporal, as novas regras relativas a honorários advocatícios de sucumbência, advindas da edição do Código de Processo Civil de 2015, devem ser aplicadas imediatamente em qualquer grau de jurisdição, sempre que houver julgamento da causa já na vigência do novo Código. Seguindo essa mesma orientação, entendo que, quanto aos honorários recursais, também deve haver incidência imediata, ao processo em curso, da norma do artigo 85, parágrafo 11, do Código de Processo Civil, observada a data em que o ato processual de recorrer tem seu nascedouro, ou seja, com a publicação da decisão recorrida, nos termos do Enunciado 7 do Plenário do Superior Tribunal de Justiça (‘Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC’). Assim, sempre que o julgador, analisando recurso que inaugurou o grau recursal, confirmar a sucumbência anterior (não conhecendo ou negando provimento ao recurso) poderá majorar os honorários advocatícios a fim de remunerar o advogado do vencedor na fase recursal”.

Pois bem, resolvida a questão relativa ao direito intertemporal, o acórdão estabelece mais cinco requisitos ou critérios para o cabimento dos honorários advocatícios em sede recursal, sob a égide do Superior Tribunal de Justiça.  São eles: 1) o não conhecimento integral ou o improvimento do recurso pelo relator, monocraticamente, ou pelo órgão colegiado competente; 2) a verba honorária sucumbencial deve ser devida desde a origem no feito em que interposto o recurso; 3) não haverá majoração de honorários no julgamento de agravo interno e de embargos de declaração oferecidos pela parte que teve seu recurso não conhecido integralmente ou não provido; 4) não terem sido atingidos na origem os limites previstos nos parágrafos 2º e 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil de 2015, para cada fase do processo; e v) não é exigível a comprovação de trabalho adicional do advogado do recorrido no grau recursal, tratando-se apenas de critério de quantificação da verba.

Como facilmente se observa, a matéria exsurge complexa, porque suscita desde questão sobre direito intertemporal até a quantificação dos honorários nos graus ordinários de jurisdição. 

Cumpre esclarecer, ademais, que tais critérios são cumulativos, ou seja, devem coexistir na mesma situação concreta submetida a julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça. A ausência de um deles implica descabimento da fixação de verba honorária recursal.

Trilhando o mesmo raciocínio lógico e didático, o julgado em tela sugere, outrossim, mesmo que em caráter meramente exemplificativo, alguns parâmetros de cálculo para sua fixação em grau recursal, a saber: 1) respeito aos limites percentuais estabelecidos nos parágrafos 2º e 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil de 2015; 2) observância do padrão de arbitramento utilizado na origem, ou seja, se os honorários foram fixados na instância a quo em valor monetário, por meio de apreciação equitativa (parágrafo 8º), é interessante que sua majoração observe o mesmo método; se, por outro lado, a verba honorária foi arbitrada na origem com base em percentual sobre o valor da condenação, do proveito econômico ou do valor atualizado da causa, na forma do parágrafo 2º, é conveniente que o tribunal mantenha a coerência na majoração utilizando o mesmo parâmetro; 3) aferição do valor ou do percentual a ser fixado, em conformidade com os critérios estabelecidos nos incisos I a IV do parágrafo 2º do artigo 85; 4) deve ser observado se o recurso é parcial, ou seja, se impugna apenas um ou alguns capítulos da sentença, pois em relação aos demais haverá trânsito em julgado, nos termos do artigo 1.002 do Código de Processo Civil de 2015, de modo que os honorários devem ser arbitrados tendo em vista o proveito econômico que a parte pretendia alcançar com a interposição do recurso parcial; 5) o efetivo trabalho do advogado do recorrido.

Diante desse significativo precedente, bem é de ver que se torna mais previsível e segura, perante o Superior Tribunal de Justiça, a aplicação da nova regra estabelecida no artigo 85, parágrafo 11, do Código de Processo Civil em vigor.

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