Entendimento do STF

Mesmo se forem negados, REsp e RE ainda são passíveis de recursos

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21 de maio de 2017, 14h15

A Suprema Corte tem entendido que “recursos especial e extraordinário indeferidos na origem, porque inadmissíveis, em decisões mantidas pelo STF e pelo STJ, não têm o condão de empecer a formação de coisa julgada” (cf. decisão no AI 684.246/RJ, relator ministro Dias Toffoli, p. em 13.3.2017); por isso, seria impossível reconhecer a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva do Estado entre o último marco interruptivo do caso concreto e a data do julgamento do derradeiro recurso tempestivamente interposto.

Outra forma de dizer o mesmo seria: a contagem do lapso prescricional cessaria quando da apreciação do derradeiro recurso “devidamente conhecido”, ignorando-se todo o trâmite efetivamente havido e o julgamento afinal realizado, relacionados ao recurso não conhecido. Ocorre que o que define os marcos interruptivos da prescrição não é a jurisprudência, mas a lei.

Carlos Maximiliano já ensinava que “interpreta-se a lei penal, como outra qualquer, segundo os vários processos de hermenêutica. Só compreende, porém, os casos que especifica. Não se permite estendê-la, por analogia ou paridade, para qualificar faltas reprimíveis, ou lhes aplicar penas; não se conclui, por indução, de uma espécie criminal estabelecida para outra não expressa, embora o juiz pareça ocorrer na segunda hipótese a mesma razão de punir verificada na primeira” (Hermenêutica e Aplicação do Direito. 19. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 263).

Se a Lei diz ser marco interruptivo da prescrição a publicação de sentença ou acórdão condenatórios recorríveis, seguida do início ou continuação do cumprimento das penas (art. 117, IV e V, do Código Penal), não há como se esticar a interpretação. Ainda que o especial e o extraordinário interpostos não sejam admitidos, dessa decisão cabe recurso.

Trata-se, por óbvio, de decisão recorrível. Interposto agravo, recurso apto à espécie, da decisão que eventualmente não o prover também cabe recurso; e se, mesmo assim, o colegiado mantiver o decisum inicial, se eivado de omissão, contradição, obscuridade ou ambiguidade, ainda é possível embargar, subsistindo, portanto, o elemento do tipo processual “recorrível”, a impedir que se dê por transitada em julgado a decisão condenatória.

Enquanto se estiver diante de decisão recorrível, vencido o lapso prescricional adequado, a punibilidade estará extinta, ainda que não seja conhecido o recurso pendente, por força da Lei, por força do Código Penal.

Diante do alarido das ruas pedindo por punições, as que vêm contra a lei são só justiçamentos, não justiça. Apesar de nos sentirmos, como Norberto Bobbio adiantava, “por vezes à beira do abismo e a catástrofe impende”, perguntando-se “Nós nos salvaremos? Como nos salvaremos? Quem nos salvará? ” (A era dos Direitos. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. Nova ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004, p. 96), nós, a sociedade, mas especialmente os militantes da advocacia criminal, não podemos permitir afrontas tão grosseiras ao Direito. Porque pior do que não ter direitos, é tê-los e não os ver respeitados.

A caminho de encerrar e diante da triste constatação de que o Supremo Tribunal Federal, na questão, tem operado mutação do teor evidente da lei contra o acusado – embora a parêmia conhecida seja in dubio pro reo –, lembrei-me do dia em que perguntei ao eterno Arnaldo Malheiros Filho como era advogar na época da ditadura militar, esperando ouvir dele histórias absurdas sobre um tempo em que o direito de defesa era devassado.

E qual não foi a minha surpresa quando ele me disse que o respeito às garantias do indivíduo é muito menor hoje em dia. E ele me fez uma provocação, que divido com todos os defensores do direito de defesa: prevendo tempos difíceis para a advocacia criminal, pediu-me para ser sempre firme e não me deixar abater pelo que estivesse por vir.

Eis um mantra a ser seguido, tomado como inspiração para pedidos incessantes em busca de Justiça, ainda que nos entreguem justiçamentos.

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    advogada da banca Malheiros Filho, Meggiolaro e Prado. Também é membro do Grupo de Litigância Estratégica do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD).

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