Opinião

Proibir manifestações é usurpar direitos em nome da segurança

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9 de maio de 2017, 10h36

*Artigo originalmente publicado no jornal Folha de S.Paulo desta terça-feira (9/5).

As manifestações pelas “Diretas Já” marcaram o mais importante movimento cívico da recente história do país. Em Curitiba, cidadãos marcharam em novembro de 1983 pedindo eleições diretas contra a Ditadura que perdurava há décadas. Em várias cidades do país, o movimento ocupou os mais significativos locais públicos, em verdadeira luta por direitos e em razão da qual podemos, hoje, escolher governantes e viver numa democracia.

Em junho de 2013, multidões foram às ruas por vários objetivos, um deles especialmente coincidente no pedido de impeachment da ex-presidente, tendo isso também marcado a história recente do país. A foto da “ocupação” do Congresso é um símbolo, aliás.

Várias outras manifestações podem ser lembradas, como a dos cariocas pelos royalties do petróleo, ou da Fiesp por menos impostos, ou as greves dos professores no Paraná em 2015, ou a marcha de mulheres por direitos iguais, podendo a lista continuar.

Não consta que nenhuma dessas passeatas tenha sido proibida pelo Poder Judiciário, muito embora tenham tido objetivos (e origens) distintos.

Em comum, possuem uma essência: a vivência democrática, que pressupõe o direito à livre manifestação e circulação.

Há exceções: Egito, janeiro de 2011. Bahrein, outubro de 2012. Turquia, janeiro de 2014. Curitiba, maio de 2017.

Sim, Curitiba. Decisão da Justiça Estadual, proferida na última sexta-feira, proíbe manifestações no entorno da Justiça Federal e, de certa forma, na cidade inteira. Segurança — sempre ela! — foi a palavra da vez, que permitiu usurpar direitos e garantias tão caros à democracia, coibindo cidadãos de se manifestar em favor de seu líder político.

Eu, particularmente, não tenho apreço por Lula, muito menos pela violência.

Mas isso não importa, porque meu apreço pela Constituição é maior. Meu apreço pela garantia de que todos possam se manifestar é maior que o resto; e meu respeito pelas regras democráticas, que nos permitiram chegar aonde estamos, é maior do que qualquer preocupação com tumultos ou antipatia política. A democracia, acima de tudo!

Se tumulto houver, é para isso que a Polícia existe; e é para isso que o Judiciário é um Poder, ou deve ser; que se não deve se apequenar ou acovardar; que não deve usurpar liberdades fundamentais sob alegados pretextos de segurança, mas com claros contornos políticos, pois manifestações favoráveis à  "lava jato" (inclusive com ocupações públicas, aprovadas por seus ídolos) nunca foram objeto de preocupação desse mesmo Judiciário. Mas aqui há a “segurança”. Por ela, foram-nos retirados direitos e garantias por décadas. Sob seu falso manto, mata-se, tortura-se, calam-se vozes opositoras mundo afora e Brasil adentro.

O Judiciário deve garantir direitos. De todos. Da Direita à Esquerda. Sem distinção. O resto é ditadura, ainda que com “segurança”, o que me lembra de Benjamin Franklin: “aqueles que abrem mão da liberdade essencial por um pouco de segurança temporária não merecem nem liberdade nem segurança.

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