Farra das preventivas

Leia os votos vencedor e vencido no Habeas Corpus do ex-ministro José Dirceu

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2 de maio de 2017, 20h54

A decretação da prisão preventiva de José Dirceu “lastreou-se em argumentos frágeis”, afirmou o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, nesta terça-feira (2/5). Ele foi o autor do voto que inaugurou a divergência e cassou a preventiva do ex-ministro da Casa Civil, decretada em agosto de 2015. O argumento venceu o do voto do relator, ministro Luiz Edson Fachin, para quem a continuidade delitiva e a “gravidade em concreto do crime” justificavam a manutenção de Dirceu preso mesmo antes da confirmação de sua condenação pela segunda instância.

Dirceu foi preso ainda durante as investigações da operação “lava jato” pelo juiz Sergio Moro. Justificou-se pela garantia da ordem pública e pela “conveniência da instrução penal”. Um ano depois, Dirceu foi condenado a 20 anos de prisão, e sua preventiva foi renovada com os mesmos argumentos. O magistrado afirmou que Dirceu dedicava-se a crimes graves de maneira profissional e contínua, e por isso deveria ficar preso.

Mas, conforme observa o ministro Toffoli, o último pagamento feito a Dirceu supostamente como suborno aconteceu em outubro de 2014. “A decisão daquela autoridade judiciária”, escreveu Toffoli, “ainda que amparada em elementos concretos de materialidade, os fatos que deram ensejo ao aventado risco de reiteração delitiva estão longe de ser contemporâneos do decreto prisional”.

Toffoli reconhece que os crimes pelos quais Dirceu foi condenado são graves, mas, diante das circunstâncias do caso e da linha do tempo que o processo vem percorrendo, não há motivos para se manter a preventiva em vigor. Em vez disso, a Justiça Federal deve decidir que medida cautelar, dentre as previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal, deve ser aplicada a Dirceu, “o que também repercutirá significativamente no direito de liberdade do réu”.

O ministro lembrou ainda de lição deixada pelo antigo relator da “lava jato” no Supremo, o ministro Teori Zavascki, morto em janeiro. Foi Teori quem deixou registrado que a gravidade do crime não pode, por si só, justificar a provisória. “A credibilidade das instituições, especialmente do Poder Judiciário, somente se fortalecerá na exata medida em que for capaz de manter o regime de estrito cumprimento da lei, seja na apuração e no julgamento desses graves delitos, seja na preservação dos princípios constitucionais da presunção de inocência, do direito a ampla defesa e do devido processo legal”, escreveu Teori, num acórdão publicado em agosto de 2015.

Extraprocessual
O atual relator da “lava jato”, o ministro Luiz Edson Fachin, ficou vencido com seu entendimento de que Dirceu deve continuar preso — mesmo que só tenha sido condenado em primeira instância. Para o ministro, a primeira instância demonstrou em seus despachos “o risco de reiteração delituosa”, a gravidade dos crimes e “o ânimo de permanência ínsito ao delito de pertinência a organização criminosa”. Foi acompanhado pelo ministro Celso de Mello.

Antes do julgamento desta terça, os procuradores da República que tocam a “lava jato” em primeiro grau ofereceram nova denúncia contra José Dirceu. Afirmou que ele continuou recebendo suborno mesmo depois que o Supremo recebeu a denúncia que se transformou na Ação Penal 470. O procurador Deltan Dallagnol explicou a jornalistas que a denúncia estava pronta, mas sua apresentação foi “precipitada” para “trazer à tona informações que são relevantes e que podem ser, ou não, consideradas” pelo STF.

Quase deu certo. Um dos argumentos centrais do voto do ministro Fachin é justamente o de que houve pagamentos a Dirceu posteriores a novembro de 2013. Depois que ele já havia sido condenado no mensalão.

Fachin reconhece que não é papel do Supremo, num Habeas Corpus, analisar a licitude desses pagamentos, que são objeto de recurso ainda não julgado pela segunda instância. Ele também reconhece que esses pagamentos não são objeto do processo discutido nesta terça pela 2ª Turma.

“Todavia”, justificou, “para fins cautelares de aferição da propensão à reiteração delitiva, não se exige exata correspondência entre os fatos atribuídos ao paciente e os já efetivamente objeto de acusação”.

Clique aqui para ler o voto do ministro Toffoli.
Clique aqui para ler o voto do ministro Fachin.

HC 137.728

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