Reflexões Trabalhistas

O Direito do Trabalho e a teoria do contrato-realidade

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30 de junho de 2017, 13h57

O artigo 442 da Consolidação das Leis do Trabalho assevera que o contrato individual de trabalho equivale à relação de trabalho, o que significa que haverá contrato individual tanto nas hipóteses em que o mesmo seja celebrado formalmente, por escrito ou verbalmente, quanto nos casos em que não tenha havido celebração formal, mas resultem provadas as características dos artigos 2º e 3º da Consolidação, pois importa ao Direito do Trabalho a realidade dos fatos, em detrimento da forma.

Essa regra é igualmente adotada pela jurisprudência, quando, por exemplo, a súmula 16 do Tribunal Superior do Trabalho afirma que as anotações apostas na Carteira de Trabalho e Previdência Social geram uma presunção relativa, que pode ser afastada por prova em contrário.

Isso significa que, anotado o cargo de auxiliar de escritório na Carteira de Trabalho do empregado, presume-se que tenha desempenhado tal cargo, mas nada obsta que em juízo prove que na realidade exercia as atribuições de gerente, sendo devidas as diferenças salariais postuladas inicialmente.

De igual modo, caso por equívoco tenha sido anotado na Carteira de Trabalho do empregado o cargo de gerente, mas tenha ele exercido as funções de auxiliar, caberá à empresa provar em juízo que aquela anotação deu-se por lapso, sendo indevidas as diferenças salariais postuladas na petição inicial.

Com efeito, o mandamento contido na referida Súmula 16 do Tribunal Superior do Trabalho, como é óbvio, aplica-se a ambos contratantes, resultando que a presunção relativa da anotação gera igual efeito a empregado e empregador. Tudo isso, repita-se, em obediência ao princípio do contrato realidade, que privilegia a situação de fato em detrimento do ajuste formal, quando ambos não coincidem.

Com fundamento nesse mesmo mandamento decidiu recentemente a 16ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, como noticia seu sítio:

“16ª Turma: portar celular corporativo sem restrição de mobilidade não configura sobreaviso.

Um empregado especialista em sistemas que trabalhou na área de suporte técnico para uma grande empresa do ramo de telecomunicações em São Paulo teve seu recurso negado quanto ao adicional de sobreaviso. Ele alegou que ficava à disposição da empresa para o atendimento de ocorrências e que isso restringia o seu direito de descanso.

A testemunha do funcionário confirmou que ele portava um celular corporativo e que tinha de ficar à disposição para atender ocorrências fora do horário de trabalho, mas que isso ocorria algumas vezes, não todos os dias, e que, quando surgia algum problema, o empregado podia resolver de casa, pois tinha acesso remoto.

Os magistrados da 16ª Turma do TRT da 2ª Região, em acórdão de relatoria do desembargador Nelson Bueno do Prado, citaram a Súmula nº 428, inciso I, do TST: "O uso de instrumentos telemáticos ou informatizados fornecidos pela empresa ao empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso".

E negaram provimento ao pedido, alegando que: "Apesar de se utilizar de celular corporativo, não restou provado que o apelante tivesse redução de mobilidade em face do aguardo de ordens do empregador". (Processo 10000536820155020062).”

Eis aí mais um caso concreto em que a teoria do contrato-realidade superou a formalidade contratual, neste caso resultando improcedente o pedido inicial do reclamante.

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