Disputa pela PGR

"Judiciário e nem mesmo MP podem rever termos de colaboração premiada"

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26 de junho de 2017, 13h30

Ex-locutor de rádio e TV, o subprocurador-geral da República Franklin Rodrigues da Costa trocou a Comunicação pelo Direito e agora quer comandar o Ministério Público Federal, onde está há 28 anos. O candidato à chefia do MPF diz ter “conduta firme e desassombrada” para assumir a função no atual cenário brasileiro, tanto nas investigações contra a corrupção como em temas como meio ambiente, saúde e direitos humanos.

Ele é um dos oito subprocuradores-gerais da República candidatos à cadeira hoje ocupada por Rodrigo Janot. A revista eletrônica Consultor Jurídico publicou entrevista com todos eles, com as mesmas questões, por ordem de resposta aos e-mails enviados pela reportagem.

Associação Nacional dos Procuradores da República / ANPR
Nascido em Boa Vista, Franklin da Costa é o primeiro roraimense membro do MPF.
ANPR

A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) fará consulta ao MPF na terça-feira (27/6), para enviar lista tríplice ao presidente Michel Temer (PMDB). A elaboração dessa lista acontece desde 2001 e tem sido seguida desde 2003, no governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), embora o Planalto tenha livre escolha.

Franklin da Costa afirma que é prerrogativa do MP, como titular da ação penal, negociar todos os termos de delações premiadas, “não sendo possível nem ao próprio Ministério Público nem ao Judiciário” revê-los. A exceção, diz, é quando o colaborador descumpre condições do acordo. Sobre o foro por prerrogativa de função, ele entende que fazer o Supremo Tribunal Federal julgar processos penais “desnatura a vocação” da corte.

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O candidato graduou-se em Direito pela Universidade de Brasília (UnB) e atuou como advogado entre 1985 e 1989, até ingressar no MPF. Foi responsável pela implantação da Procuradoria da República em Roraima (PR-RR), há 22 anos, e atuou como chefe da unidade local. É membro da 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF, focada em assuntos criminais, e pós-graduado (especialização) em Direito Sanitário pela UnB. Foi professor universitário.

Formou-se primeiro em Comunicação, trabalhando como locutor na TV Globo de Brasília, na Rádio Nacional, na Rádio Manchete e no programa Voz do Brasil. Tornou-se dirigente do Sindicato dos Radialistas do Distrito Federal em 1986 e, no ano seguinte, organizou a primeira greve conjunta de radialistas e jornalistas no DF, como conta em breve biografia.

Leia a entrevista:

ConJur — Por que o senhor quer ser procurador-geral da República?
Franklin da Costa —
Apresentei meu nome em razão da experiência de 28 anos no MPF. As questões que estão sob o trabalho do Ministério Público são matérias com as quais sempre atuei com resultados, dentre essas o combate à corrupção, a proteção ambiental, a defesa dos direitos humanos e minorias e da realização das políticas públicas, notadamente nas áreas de saúde – na qual tenho pós-graduação – e educação. Coloco também minha experiência em gestão, seja como procurador-chefe em várias procuradorias, seja como professor de gestão financeira na Universidade Católica de Brasília durante dez anos.

O atual momento do país tem despertado a percepção social para questões até então ocultas, porque passaram a envolver agentes da alta hierarquia de Poderes da República. Há uma sobrecarga de eventos, notadamente no campo do combate à corrupção, que exigem conduta firme e desassombrada na continuidade das investigações e abertura de novas frentes, decorrentes do que tem sido apresentado ao MPF, notadamente nas chamadas colaborações premiadas.

Além disso, há outras frentes de trabalho que necessitam de maturação, como a questão ambiental, principalmente na Amazônia, e as deficiências na execução das políticas públicas, principalmente nas áreas de saúde e educação, bem como de novas vertentes que surgem na questão dos direitos humanos.

Para se visualizar a importância de algumas dessas questões, no caso do meio ambiente o Brasil acaba de perder quase R$ 200 milhões que a Noruega iria repassar ao chamado Fundo para Amazônia, em razão da incapacidade do governo brasileiro de controlar o aumento do desmatamento na região.

Relativamente aos direitos humanos, o fenômeno de ingresso de refugiados no território brasileiro exige um olhar sobre essas pessoas e uma vigilância sobre o risco de virem a ser utilizados em trabalho escravo, diante da sua vulnerabilidade. Trata-se de uma questão humanitária para a qual o MPF não pode fechar os olhos.

Ainda no tema direitos humanos, a violência no campo e o aumento do número de mortes por homicídio é preocupante. O mesmo se diga em relação à violência incontrolável nas grandes cidades. Não se pode esquecer também a violência contra a mulher e à população negra, os quais são os mais expostos segundo dados do último Atlas da Violência do País.

Há uma necessidade de engajar o Conselho Nacional do Ministério Público, cujo presidente é o procurador-geral da República, nos papéis que a Constituição Federal lhe conferiu, dentre esses, zelar pelo princípio da eficiência. O CNMP deve coordenar esforços no cumprimento das funções institucionais voltadas para a consecução dos objetivos fundamentais da República. Isso deverá ser feito por meio da atuação conjunta com os Ministérios Públicos – em decorrência do conhecimento dos assuntos que lhes chegam nessas matérias – por meio da apresentação de proposições ao Poder Executivo, para iniciativas de ações, notadamente aos setores de direitos humanos, no combate à violência e na busca de melhor política penitenciária. O CNMP pode atuar em parceria com o Executivo nas esferas federal, estadual e municipal, em razão da capilaridade que pode estabelecer com os Ministérios Públicos dos estados.

ConJur — Quais principais problemas atuais da PGR o senhor pretende solucionar, caso escolhido?
Franklin da Costa — A vivência das instituições se assemelha à vida das pessoas. A evolução e o aprimoramento somente ocorrem a partir do distanciamento e uma avaliação permanente de como a máquina está se movimentando, da identificação dos pontos de estrangulamento, seja nas atividades-meio, seja na atividade-fim, para extirpá-los e dar maior eficiência e efetividade na atuação.

A PGR tem mantido um curso positivo no que se refere ao desempenho de suas atribuições. Temos um corpo de servidores da mais alta qualificação em todos os setores – administrativo, de gestão, na área de tecnologia de informação, os quais têm atuado com criatividade e inovação, gerando novas rotinas e procedimentos com resultado ma melhoria da eficiência. Necessitamos, sim, de cursos e treinamento para reciclagem, principalmente na área dos serviços auxiliares, de atendimento e na segurança institucional.

Na área-fim, os assessores jurídicos são também os mais qualificados. Há necessidade de incorporar, na atuação, notadamente nas forças-tarefas criminais, a experiência dos subprocuradores-gerais da República, em auxílio aos colegas procuradores de primeira e segunda instância que vêm atuando, para fortalecê-los no trabalho que virá adiante e que não será pouco. Faz-se necessário que as Câmaras de Coordenação tenham um melhor fluxo de comunicação com os procuradores da República, elaborando conjuntamente com eles prioridades de atuação nas respectivas áreas – crime, lesão ao erário, consumidor, minorias e direitos humanos, por exemplo.

Outro problema, que hoje se insere em todos os órgãos, é a limitação orçamentária. A solução está em tratativas com o Executivo, por meio do Ministério da Fazenda, e do Parlamento no curso da Lei Orçamentária.

ConJur — Qual sua avaliação sobre o foro por prerrogativa de função?
Franklin da Costa —
Quero partir do ponto de vista do que deve ser o papel da Suprema Corte de uma nação. Ao Supremo Tribunal Federal deveria ser reservado, em princípio, o trato de questões de índole constitucional, tão-somente. Parece-me que utilizar o STF para cuidar de questões penais, quando envolve agente investido de alta posição hierárquica de poder, desnatura a vocação da Corte Suprema.

Atualmente, a matéria da prerrogativa de foro está em julgamento no STF, por meio da Ação Penal 937. Os ministros parecem estar tomando o caminho de restringi-la, no sentido de que o foro por prerrogativa de função deve valer apenas nos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas, posição com a qual estou de acordo.

No campo legislativo, há a Proposta de Emenda à Constituição (PEC 10/2011) que extingue o chamado foro privilegiado. Já foi aprovada pelo Senado e agora segue para a Câmara. Segundo estatísticas, se a proposta vier a ser aprovada, cerca de 54 mil autoridades do país poderão passarão a responder a ação penal e ser julgadas na primeira instância. Apenas os chefes de poderes da União (Executivo, Legislativo e Judiciário) teriam prerrogativa de foro.

Um dos principais argumentos para acabar com a prerrogativa de foro é que os processos nos tribunais caminhariam mais vagarosamente. No caso da “lava jato”, o procurador-geral da República equipou o seu gabinete com procuradores da República e servidores para assessorá-lo no trabalho com os procedimentos de investigação e com as ações penais que têm curso nos tribunais superiores. Portanto, se o argumento é o risco da prescrição para a aplicação de penas, penso que os tribunais poderiam adotar iniciativas similares.

ConJur — A lei atual sobre abuso de autoridade e órgãos de fiscalização (como o CNMP) são suficientes para conter excessos?
Franklin da Costa —
A proteção contra abuso de autoridade não está apenas na chamada lei de abuso de autoridade, Lei 4.898, em vigor desde 1965. Crimes postos no projeto de lei em curso no Congresso Nacional já estão previstos no Código Penal, como é o caso da prevaricação, da condescendência criminosa, da violência arbitrária, da fraude processual e do exercício arbitrário ou abuso de poder.

Além disso, as corregedorias fazem as apurações internas e aplicam penalidades, tanto nas polícias, nos Ministérios Públicos, no Judiciário, no Fisco e em todos os órgãos da Administração. Particularmente no Ministério Público e na magistratura, há os Conselhos Nacionais, com essas atribuições. Os casos que extrapolam a não observância de preceitos administrativos e constituam crimes de abuso de autoridade sujeitam seus autores à responsabilização penal.

ConJur — Há critério objetivo para definir o que é obstrução da Justiça/embaraço à investigação?
Franklin da Costa — Todo delito penal é caracterizado por uma ação. Desse modo, a obstrução ou embaraço à investigação constitui um movimento que resulte em interferência no procedimento investigatório, que resulte em prejuízo ou potencial prejuízo à busca da verdade real.

ConJur — Acordo de colaboração premiada já homologado pode ser submetido a revisão em Plenário?
Franklin da Costa — Já tive oportunidade de me manifestar anteriormente, e reitero aqui, no sentido de que a Lei 12.850/2013 estabelece ser prerrogativa do Ministério Público, por ser o dono da ação penal, firmar as condições da chamada colaboração premiada, não sendo possível nem ao próprio Ministério Público nem ao Judiciário revê-la, salvo se o colaborador não cumprir os termos do acordo.

Quanto à competência para a homologação nos tribunais, se do relator ou do colegiado, o Supremo Tribunal Federal vem consolidando entendimento – por meio do julgamento da PET 7.074, no qual a maioria dos ministros já votou – no sentido de que compete ao relator de uma colaboração premiada homologar o acordo, exercendo controle de regularidade, legalidade e espontaneidade. Quanto ao cumprimento dos termos do acordo e da eficácia da colaboração, há a ressalva de que caberia ao colegiado competente analisar esses efeitos.

ConJur — O que a PGR pode fazer para reduzir o tempo em que um processo fica no gabinete do procurador-geral, aguardando manifestação?
Franklin da Costa — A atual gestão caminhou muito bem neste sentido de reduzir o tempo dos processos que passam pelo gabinete do procurador-geral da República, adotando o sistema de assessoria prestada por procuradores da República e maior número de servidores na análise e elaboração de peças e pareceres.

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