Anuário da Justiça

STM libera ao público acesso aos arquivos da época da ditadura

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7 de junho de 2017, 7h07

*Reportagem especial do Anuário da Justiça Brasil 2017, lançado na última quarta-feira (31/5) no Tribunal Superior Eleitoral.

O Supremo Tribunal Federal determinou, em março de 2017, que o Superior Tribunal Militar liberasse o acesso ao público de documentos e áudios de julgamentos durante a ditadura militar (1964-1985), incluindo aqueles classificados como secretos. O STF já havia decidido, em 2006, que informações e arquivos do período do regime militar são públicos e devem ser colocados à disposição da sociedade sempre que solicitados. O advogado Fernando Rodrigues Fernandes reclamou ao STF que, apesar da jurisprudência, o STM continuou mantendo parte de seus arquivos sob sigilo.

Segundo o ministro José Coêlho, presidente do tribunal, os documentos referentes a julgamentos ocorridos na corte durante o período militar estão “todos disponíveis” e que a reclamação julgada pelo STF foi equivocada. Coêlho garante que a corte castrense está empenhada em dar acesso público aos documentos e por isso está tratando de digitalizar seu acervo. “Sempre que alguém solicita nós damos acesso. As únicas cautelas são com o manuseio, pois trata-se de material antigo”, disse.

A ministra Maria Elizabeth Rocha, por sua vez, considerou a decisão do STF “previsível e inevitável”. “A uma, porque ao conhecer e prover a reclamação o STF fez cumprir acórdão anteriormente prolatado por ele próprio — o Recurso Ordinário em Mandado de Segurança que determinava a publicidade e o direito à informação dos registros documentais e fonográficos relativos aos julgamentos ocorridos na década de 1970 no STM. A duas, porque a Lei 12.527/2011 é taxativa ao impor a transparência dos atos estatais”.

Em setembro de 2016, o STM publicou edital que franqueou acesso irrestrito a todos os processos julgados pela Justiça Militar da União desde 1808. Entre os processos de relevância histórica, estão disponíveis à sociedade 115.876 julgados que versam sobre temas como a Revolta Tenentista, a Coluna Prestes, a Intentona Comunista, a Segunda Guerra Mundial e a ditadura militar. O acervo de processos históricos inclui, ainda, 41 mil apelações, 33 mil autos findos, 25 mil Habeas Corpus, 5 mil recursos criminais e 347 mandados de segurança. Levantamento da Diretoria de Documentação e Gestão do Conhecimento do STM diz que estão arquivadas no tribunal 22 milhões de páginas.

STM
Plenário do Superior Tribunal Militar.
Hugo Barreto

Apesar de o conteúdo dos processos ter natureza pública, o STM abriu um prazo de 30 dias no referido edital para que as pessoas direta ou indiretamente envolvidas nas ações judiciais pudessem requerer o sigilo de alguma informação, sob a alegação de que pudessem atentar contra sua intimidade, vida privada, honra ou imagem. Especificamente sobre as gravações em áudio, em 2015 o tribunal finalizou um projeto de digitalização de mais de 10 mil horas que registraram as sessões plenárias de 1975 a 2004 na corte.

Em maio de 2017, o STM passou a transmitir os seus julgamentos ao vivo e pela internet. Sessões ordinárias e administrativas podem ser acompanhadas pelo site da corte ou pelo canal do STM no YouTube.

A corte começou a mudar sua posição sobre a aplicação do princípio da insignificância no Direito Militar. Até bem pouco tempo, não se aplicava esse princípio para crimes militares, por entender que tal medida não se coaduna com a disciplina militar. Nos últimos meses, porém, ministros como William Barros, Cleonilson Nicácio e Marco Antonio de Farias passaram a aceitar a sua aplicação. “Nos casos específicos de réus militares, o princípio da insignificância pode ser aplicado, sim, desde que aferidos os seus requisitos, os quais devem ser analisados sob a ótica da preservação dos princípios da hierarquia e da disciplina”, afirma o ministro Cleonilson Nicácio.

O tribunal também firmou entendimento de que desferir tapas, chutes e golpes em soldados durante treinamento não pode ser configurado crime de tortura, e sim de maus tratos por parte de militares contra seus subordinados. O relator do recurso no STM, ministro José Coêlho, chamou a atenção no seu voto para a necessidade de a corte separar os dois temas. Ficou pacificado entre os ministros que o dolo da tortura se caracteriza pelo desejo de causar um sofrimento aviltante, ao passo que o Código Penal Militar prevê os tipos penais de violência contra inferior, ofensa aviltante a inferior e maus tratos, “todos perfeitamente adequados aos fatos apurados no inquérito penal militar, sobretudo o último, que, insculpido no artigo 213 do Código Penal Militar, prevê a conduta de expor a perigo à vida ou saúde abusando de meios de correção ou disciplina, prevendo, inclusive, formas qualificadas, quando dos maus tratos decorrem lesão grave ou morte”, ressaltou o ministro.

Foi publicada pesquisa inédita sobre o tráfico de drogas no âmbito militar. Conforme o estudo, os casos de uso e porte de drogas nas Forças Armadas aumentaram 337% nos últimos 12 anos; 95% dos flagrados são soldados temporários e recrutas com 18 anos. A pesquisa, da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados da Justiça Militar da União, constatou que os principais envolvidos são cabos e soldados com até 21 anos de idade, solteiros e com baixa escolaridade, que alegam em juízo que o uso da droga foi esporádico ou que são viciados.

O processo judicial eletrônico no STM entrou numa fase considerada crucial para o seu desenvolvimento e deve ser consolidado em 2017. De acordo com o gerente do projeto de implantação do PJe criminal militar da União, Adalberto Zavaroni, o tribunal está na fase de elaboração e validação da lista mínima de requisitos, momento que antecede a migração de todos os fluxos das classes penais para o software específico do programa.

O STM aguarda encaminhamento do Congresso Nacional da proposta de modernização do Código Penal Militar. A Câmara dos Deputados criou uma subcomissão especial para avaliar a matéria.

Anuário da Justiça Brasil 2017
Editora: ConJur
Páginas: 330 páginas
Preço: R$ 40 (versão impressa); R$ 20 (versão on-line)
Onde comprar exemplares: Livraria ConJur
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