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Publicar decisão de tribunal não causa dano moral, decide TJ-RS

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4 de junho de 2017, 15h18

Publicar em um site o conteúdo de uma decisão judicial, cujo processo sequer tramitou sob segredo de Justiça, não viola direitos de personalidade. Logo, não dá direito a qualquer reparação por danos morais. Afinal, a Constituição assegura a livre expressão da atividade intelectual, cientifica e de comunicação, independentemente de censura ou licença, como dispõe o seu artigo 5º, inciso IX.

Com este fundamento, a 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul aceitou apelação do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, que havia sido condenado a pagar R$ 10 mil, a título de danos morais, a um advogado de Porto Alegre. A decisão do colegiado também desobrigou o IBCCrim, que tem sede na capital paulista, de retirar do seu site o acórdão de uma ação penal que cita o nome do advogado.

A controvérsia se originou porque o IBCCrim publicou um artigo científico, de autoria do desembargador aposentado Amilton Bueno de Carvalho, que reproduziu acórdão de uma apelação criminal do TJ-RS. A decisão citada anulou um processo por ausência  de defensor na fase de interrogatório.

Ação indenizatória
O advogado que processou o instituto diz que a menção ao seu nome soa como uma "sentença condenatória" no meio da advocacia, a ponto de colocá-lo em situação vexatória. Ele afirma que o IBCCrim não se preocupou em preservar a sua identidade, fazendo com que pessoas alheias ao mundo do Direito se utilizem destas informações para denegri-lo, ridicularizá-lo e até desprezá-lo. Refere que o site do TJ-RS não permite o acesso via internet de acusados ou denunciados por consulta simples, sendo necessário o número do processo para acesso livre.

Notificado pela 4ª Vara Cível do Foro Central da Capital gaúcha, o instituto apresentou contestação. Diz que a simples veiculação de artigo, divulgado com intuito informativo, não traz qualquer lesão à honra ou à imagem do autor. Assim, de nenhuma forma colocou em risco a vida profissional do advogado. Ademais, o acórdão é público, disponível no site do tribunal.

Sentença procedente
A juíza Rosaura Marques Borba julgou procedente a ação indenizatória, determinando o pagamento de R$ 10 mil, pelos danos morais causados ao autor, e a retirada das informações do acórdão do site do IBCCrim, sob pena de multa diária no valor de R$ 1 mil. Ela entendeu que a conduta do instituto mostrou-se abusiva, desnecessária, injustificável e atentatória à dignidade da pessoa humana, bem como à intimidade do autor.

Para a julgadora, não restam dúvidas que a exposição não autorizada do conteúdo ofende o direito à intimidade. Afinal, o autor não pretendia a publicização dos fatos constantes na Apelação 70004507562, assim como o conhecimento de terceiros sobre aspectos ocorridos em sua vida privada. Configurou-se, assim, o nexo causal entre o dano e a conduta perpetrada pela parte ré.

"A verdade é [que] o demandado [IBCCrim] poderia ter mantido o sigilo do nome do autor, ou mesmo o abreviado, evitando, assim, de colocar em risco a atividade profissional deste que atua como advogado. Assinalo que os direitos da personalidade são absolutos – oponíveis erga omnes –, impondo-se à coletividade o dever de respeitá-los, corolário lógico da proteção constitucional inserida no artigo 5º, inciso X, da Carta Magna. Restou, portanto, plenamente justificada a ocorrência de ato ilícito (CCB, artigo 186)", justificou na sentença.

Apelação aceita
Na corte, o desembargador-relator Miguel Ângelo da Silva reformou integralmente a sentença, por entender que a publicação se absteve de qualquer juízo de valor sobre a conduta imputada ao advogado – que foi processado por ex-cliente – e sem especial destaque ao seu nome. E não só: a publicação limitou-se a reproduzir o teor de informação de domínio público, plenamente acessível por qualquer interessado.

"Vale aduzir que o seu nome era aspecto absolutamente secundário do texto publicado, cujo específico escopo era o de fomentar o debate jurídico relacionado à nulidade processual por ausência do advogado (defesa técnica) no interrogatório do réu em ação penal, como ressaltou a sentença invectivada", diz, no acórdão lavrado na sessão de 24 de maio.

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