Ataque a prerrogativa

OAB-SP repudia grampo em conversa entre advogado e cliente em Ribeirão Preto

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21 de julho de 2017, 18h41

Um advogado de Ribeirão Preto teve uma conversa com um de seus clientes, também advogado, grampeada pela Polícia Federal. A interceptação dos telefonemas deste cliente havia sido autorizada pela Justiça. 

A seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil repudiou a gravação do diálogo, que foi divulgado pela afiliada da Rede Globo e pela rádio CBN na cidade.

No material, o advogado Heráclito Antonio Mossin e seu cliente conversam sobre operações feitas pela PF na cidade e sugerem que as investigações têm relação com assuntos envolvendo a prefeitura de Ribeirão Preto e a ex-prefeita da Dárcy Vera.

Os advogados Antonio Mariz de Oliveira, Domingos Stocco, Marcos da Costa, Heráclito Antonio Mossin e Cid Vieira de Souza Filho em sessão que repudiou grampo a profissional.
Divulgação/OAB-SP

A inviolabilidade da comunicação entre advogado e cliente está prevista no artigo 7º do Estatuto da Advocacia. 

"A interceptação telefônica entre cliente e advogado (que não era investigado) é intolerável em um Estado Democrático e de Direito, e a OAB-SP vem apresentar a manifestação pública de repúdio, com o encaminhamento à Comissão de Prerrogativas para as providências cabíveis", diz a nota de repúdio assinada pelo presidente da OAB-SP Marcos da Costa. "Para se ter uma ideia do absurdo de se divulgar os diálogos, imagine se a TV veiculasse a gravação de uma confissão de um fiel ao padre, do paciente ao psiquiatra ou da conversa entre um jornalista e sua fonte", disse o presidente da OAB-SP à ConJur

Sigilo na berlinda
Apesar da garantia constitucional e da proteção do Estatuto da Advocacia, o sigilo das comunicações entre advogado e cliente tem sido relativizado. Em maio, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil pediu ao Supremo Tribunal Federal que defenda o sigilo das comunicações entre clientes e advogados quando estes estiverem no regular exercício da profissão.

Em 2016, a ConJur noticiou que todos os advogados do escritório que atua na defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foram grampeados com autorização do juiz Sergio Moro. À época, Moro argumentou que não sabia que o número apresentado a ele no pedido de grampo era da banca — depois, na sentença em que condenou Lula, reputou o episódio ao excesso de trabalho.

Dialógos entre advogados e clientes no parlatório do presídio de Catanduvas (PR) também foram monitorados. As gravações de áudio e vídeo, autorizadas pela Justiça, foram justificadas pelo grau de periculosidade dos presos da unidade, muitos deles chefes de organizações criminosas. Na ocasião, a OAB-PR criticou a medida e pediu soluções para proteger os direitos dos profissionais.

Em 2010, o Conselho Nacional de Justiça listava um total de 10,5 mil interceptações telefônicas em todo o país. Em 2013, outro levantando oficial, dessa vez pelo Conselho Nacional do Ministério Público, contabilizava 16 mil grampos em investigados feitos só pelos MPs, sem contar os feitos só pela polícia.

Leia a nota de repúdio da OAB-SP:

A Seção São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil, por sua diretoria, a diretoria da Subseção de Ribeirão Preto, os Conselheiros Secionais, os presidentes e diretores das Subseções de todo o estado, os presidentes e membros dos Conselhos de Prerrogativas, Estadual e Regionais, e os Coordenadores e membros das Coordenadorias de Prerrogativas de São Paulo, as advogadas e os advogados, todos presentes no I Encontro Estadual de Prerrogativas da Advocacia, em Ribeirão Preto (21/07/2017), deliberaram por aclamação repudiar publicamente a indevida interceptação e consequente veiculação pública de conversa sigilosa entre advogado e seu cliente, protegida constitucionalmente e por Lei Federal.

A afiliada da Rede Globo de Televisão (EPTV), no município, na data de ontem, e a rádio CBN local, hoje, noticiaram trechos de diálogo mantido por telefone entre o advogado Heráclito Antonio Mossin e seu constituinte – que também é advogado –, cuja gravação já representou grave inobservância à Constituição Federal e à Lei nº 8.906/94 que assegura ao advogado a inviolabilidade das comunicações telefônicas e dá guarida ao sigilo profissional do conteúdo de seus diálogos.

Mais grave, ainda, é o fato dessa indevida interceptação vir a público, devassando o sigilo profissional que é um dos principais alicerces das prerrogativas da advocacia, que representa, em essência, o sagrado direito de defesa do cidadão.

A ofensa assim materializada com a divulgação por órgão de imprensa representa intolerável ataque à cidadania, o que é inadmissível. A proteção profissional concedida ao advogado, aliás, é tutelada em nível constitucional, como também ocorre com profissionais da imprensa, quanto ao sigilo da fonte.

Por tais razões, a interceptação telefônica entre cliente e advogado (que não era investigado) é intolerável em um Estado Democrático e de Direito, e a OAB-SP vem apresentar a manifestação pública de repúdio, com o encaminhamento à Comissão de Prerrogativas para as providências cabíveis."

Marcos da Costa
Presidente da OAB SP

Diretoria da OAB SP

Domingos Stocco
Presidente da Subseção de Ribeirão Preto

Diretoria da OAB RP

Comissão de Prerrogativas e Conselhos Regionais de Prerrogativas".

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