Opinião

Sem estudo prévio, reajuste de taxas pelo IPCA é afronta à transparência

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20 de julho de 2017, 6h37

O artigo 8º da Lei 13.202/2015, fruto da Medida Provisória 685/2015, autorizou o Poder Executivo a atualizar monetariamente diversas taxas cobradas por diferentes órgãos e entidades da administração direta e indireta. Na maioria dos casos, os valores estavam desatualizados há mais de dez anos.

Foi com base nessa autorização que, após a edição de decretos específicos, o Ministério da Fazenda, por si ou de forma conjunta com outros Ministérios, reajustou o valor desses tributos.

Em sua grande maioria, esse reajuste foi baseado no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medido mensalmente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Contudo, além de ter ocorrido desrespeito ao limite fixado para a primeira atualização monetária (artigo 8º, §1º, da Lei 13.202/2015), como quando da edição da Portaria Interministerial MF/MS 701/2015, que inicialmente reajustou a taxa de Fiscalização de Vigilância Sanitária (TFVS), verifica-se que, até onde se tem conhecimento, em nenhum caso foi atendido o princípio da retributividade tributária.

Referido princípio é traço marcante do caráter sinalagmático das taxas e não pode ser considerado respeitado com a mera aplicação do IPCA para fins de reajuste.

Em verdade, não obstante a autorização do artigo 8º da Lei 13.202/2015, há a necessidade de estudo técnico prévio capaz de demonstrar que o índice de correção monetária utilizado corresponde à variação dos custos da atividade estatal, nos termos do artigo 145, II, da Constituição Federal de 1988 e artigo 77 do Código Tributário Nacional (CTN).

Com efeito, a Constituição de 1988, em seu artigo 145, II, seguida do artigo 77 do CTN, outorgou aos entes federativos a competência para instituir taxas em contraprestação ao exercício do poder de polícia ou a serviços públicos específicos e divisíveis, prestados aos contribuintes ou colocados à sua disposição.

Por essa razão, a validade dessa espécie tributária está intrinsicamente vinculada ao custo da atividade estatal que deu ensejo à sua criação, em respeito ao princípio da retributividade tributária. Daí dizer tratar-se de um verdadeiro caráter sinalagmático dessa espécie tributária.

A autorização do artigo 8º da Lei 13.202/2015, embora permita o reajuste com base na variação da inflação ocorrida no período, não anula a necessidade de que seja demonstrada a relação do ajuste com o valor do custo da atividade estatal para o exercício do poder de polícia ou prestação de serviço específico e divisível, que pode ser maior ou menor que a variação da inflação.

Isso significa que, embora o IPCA possa, em tese, servir como um dos critérios para a correção/reajuste dessas taxas, ele não é o único, muito menos sem um estudo prévio da Administração que demonstre que a variação desse índice corresponde exatamente à variação dos custos da atividade estatal.

Ao não proceder desse modo, demonstrando a relação entre o índice adotado para correção das taxas e os custos da atividade estatal, o Poder Executivo desnaturou essa espécie tributária, transformando-a em um tributo semelhante ao IPTU ou ao IPVA, impostos que têm como fatos geradores bens da vida com valores comerciais que variam ao sabor da economia, o que justificaria terem suas bases de cálculo atreladas, necessariamente, a índices de variação da inflação.

Frise-se que não se está dizendo que índices de correção monetária não possam ser utilizados, mas sim que tal instrumento só será válido se previamente demonstrado que o preço do serviço para o Estado sofreu influência da inflação, e que o índice utilizado melhor reflete a variação do custo do serviço estatal.

Por essa razão, é evidente a invalidade das normas infralegais de reajuste dessas taxas quando desacompanhadas de estudo técnico apto a demonstrar que a variação do IPCA corresponde exatamente à variação dos custos para o exercício do poder de polícia ou prestação de serviço. A ausência de disponibilização de tais dados e informações ao público em geral afronta, ainda, a transparência que deve existir nas relações entre administração e administrados.

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