Conhecimento presumido

Aplicar lei ignorada por partes não ofende princípio da "não surpresa"

Autor

1 de julho de 2017, 9h50

O juiz pode usar fundamentação legal diferente das apresentadas pelas partes para decidir, já que o ordenamento jurídico é de conhecimento presumido de todos que estão sujeitos à legislação. O entendimento é da ministra Isabel Gallotti, e foi acompanhado de forma unânime pela 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao julgar embargos de declaração em que se alegava ofensa ao princípio da não surpresa.

Reprodução
Segundo a ministra Isabel Gallotti, "os fatos da causa devem ser submetidos ao contraditório, não o ordenamento jurídico".

O caso envolveu a fixação de prazo prescricional em ação que discutia ilícito contratual. No julgamento da causa, foi aplicado o artigo 205 (prescrição decenal), em vez do artigo 206, parágrafo 3º, V (prescrição trienal), ambos do Código Civil.

Como as partes não discutiam que a prescrição era trienal, divergindo apenas em relação ao termo inicial da contagem do triênio, a embargante entendeu que, ao adotar fundamento que não foi cogitado por ninguém e não ouvir as partes sobre isso, o colegiado desconsiderou o princípio da não surpresa, instituído no artigo 10 do CPC de 2015.

Interpretação equivocada
A relatora, ministra Isabel Gallotti, considerou equivocada a interpretação da embargante. Para a magistrada, o fundamento ao qual se refere o artigo 10 é jurídico — no caso, a prescrição: preliminar de mérito arguida desde a contestação e julgada em ambas as instâncias ordinárias.

“Pouco importa que as partes não tenham aventado a incidência do prazo decenal ou mesmo que estivessem de acordo com a incidência do prazo trienal. Houve ampla discussão sobre a prescrição ao longo da demanda, e o tema foi objeto de recurso, tendo essa turma, no julgamento da causa, aplicado o prazo que entendeu correto, à luz da legislação em vigor, conforme interpretada pela jurisprudência predominante na época para ações de responsabilidade civil por descumprimento contratual”, disse a ministra.

Isabel Gallotti lembrou ainda que os prazos de prescrição não podem ser alterados por acordo das partes e que o órgão jurisdicional não pode deixar de aplicar uma norma ao caso concreto porque as partes, embora tratem do tema, não a invocaram.

Entrave processual
Ainda segundo a ministra, acolher o entendimento da embargante prejudicaria o andamento dos processos, uma vez que exigira que o juiz fizesse um exame prévio da causa para que imaginasse todos os possíveis dispositivos legais em tese aplicáveis e os submetesse ao contraditório.

“A discussão em colegiado, com diversos juízes pensando a mesma causa, teria que ser paralisada a cada dispositivo legal aventado por um dos vogais, a fim de que fosse dada vista às partes. Grave seria o entrave à marcha dos processos, além de fértil o campo de nulidades”, concluiu a ministra. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ. 

REsp 1.280.825

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!