Entrevista à Conjur

Teori era a favor de competência reduzida para STF e revisão de política de foro

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19 de janeiro de 2017, 18h27

Era setembro de 2013, e o Supremo Tribunal Federal havia acabado de ver o "furacão" mensalão chegar ao fim. Foram 53 sessões para julgar a Ação Penal 470, e o ministro Teori Zavascki considerava um tempo excessivo para um caso só. O julgador, que morreu em um acidente de avião nesta quinta-feira (19/1), concedeu entrevista à ConJur logo após a corte retomar outros casos.

Nelson Jr./SCO/STF
Para o ministro Teori Zavascki, juiz não pode ficar ansioso por temas nem escolher processos. Nelson Jr/STF

O longo julgamento do mensalão colocou na pauta da entrevista o excesso de casos ao qual o STF é submetido. Teori definiu que o principal problema do Supremo era a chegada de ações da área criminal que não tratam de termas constitucionais.

Na conversa, declarou-se a favor de que a competência do Supremo seja reduzida no futuro. Para ele, isso seria possível por meio de “reformas constitucionais que abordem, por exemplo, o foro por prerrogativa de função”.

A questão tributária brasileira também foi abordada. Lamentou o excesso de burocracia no Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), grupo formado por todos os estados que estabelece políticas nessa área, mas no qual um veto impede o projeto de prosseguir. “Então, se estabelece a guerra fiscal.”

Notório pela seriedade e rigor, deu mais uma mostra desse aspecto ao responder se os ministros estavam ansiosos para julgar algo que não fosse mensalão: “O juiz não pode ficar ansioso por temas, o juiz não escolhe os processos”.

Leia abaixo a entrevista completa, publicada na ConJur no dia 27 de setembro de 2013:

ConJur — Com o fim do julgamento do mensalão, o Supremo volta à sua rotina. Quais são os temas mais relevantes a serem apreciados?
Teori Zavascki — Só de Direito Tributário temos mais de 120 processos esperando julgamento. O Supremo está com um déficit muito grande de processos pendentes. O sistema de repercussão geral impôs ao Supremo ônus adicional de julgar essas matérias. São temas selecionados que têm, como o próprio nome diz, repercussão geral, e suspendem a tramitação de todos os processos desse assuntos no Brasil.

ConJur — Os ministros estão ansiosos para julgar outras matérias?
Teori Zavascki — Já começamos a julgar outros processos. Essa semana tinha programado oito ou nove desses temas em matéria administrativa e tributária, além de alguns processos penais. Ontem (26/9) começamos o julgamento de um processo contra um deputado federal. O juiz não pode ficar ansioso por temas, o juiz não escolhe os processos.

ConJur — O julgamento da AP 470 vai ficar para o ano que vem?
Teori Zavascki — Não sei.

ConJur — Cinquenta e três sessões de julgamento apenas de um caso não é um exagero levando-se em conta tantos outros processos?
Teori Zavascki — Sim. Os processos de competência originária são um problema, por exemplo. No meu voto na Ação Penal 470 sobre o cabimento de Embargos Infringentes, eu disse que a competência originária deveria ser reduzida drasticamente ou até ser eliminada em matéria criminal.

ConJur — Apesar de ter repercussão geral, ainda chegam ao Supremo muitas ações que não tratam de questões constitucionais, principalmente na área criminal.
Teori Zavascki — Esse é o principal problema. Hoje, qualquer tema criminal chega ao Supremo, seja constitucional ou não. O STF dedica um tempo muito grande a questões penais não constitucionais. E isso tem o custo da demora e de travar processos. Sou partidário de que o Supremo, para se viabilizar institucionalmente, tenha sua competência reduzida no futuro.

ConJur — Como isso seria feito?
Teori Zavascki — Mediante reformas constitucionais que abordem, por exemplo, o foro por prerrogativa de função. A essa altura, o tema está maduro. Parece que há um consenso no sentido de que a redução de competência do Supremo em matéria penal é um passo que tem que ser dado.

ConJur — Apesar do federalismo, o país, principalmente na área tributária, vê desequilíbrios entre os entes. Como o ministro avalia esse quadro?
Teori Zavascki — O país segue o modelo federalista, mas tem vários problemas, inclusive operacionais. O federalismo foi implantado a partir de uma certa autonomia dos estados e municípios, e tem a União que, na área fiscal, mantém uma posição de preponderância. Compete à União estabelecer políticas publicas para reduzir a desigualdade.

ConJur — A crítica é que os estados e municípios não têm autonomia financeira e, consequentemente, acabam não tendo autonomia política. A guerra fiscal é fruto de uma crise do federalismo?
Teori Zavascki — Sim. Essas iniciativas estaduais de conceder isenções e incentivos fiscais para atrair indústrias são um mecanismo de defesa contra os estados mais ricos e industrializados. Isso estabelece a guerra fiscal, que é um problema de federalismo.

ConJur — Mas buscando mais autonomia, os estados atropelam o Confaz.
Teori Zavascki — Exatamente. Porque hoje as políticas fiscais na área de ICMS são muito dependentes do Confaz. E o conselho só pode tomar certas decisões por unanimidade. Cada estado tem poder de veto. Basta um estado ser contra que fica vetada qualquer política nessa área. Então, se estabelece a guerra fiscal.

ConJur — A necessidade da votação unânime no Confaz é um entrave?
Teori Zavascki — Sim. A exigência de unanimidade no Confaz estabelece limites e um tratamento formalmente igualitário, mas que pode importar numa desigualdade material. Isso é um problema político. No âmbito jurídico, as coisas estão estabelecidas.

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