Processo Familiar

Sugar daddy e sugar baby: transparência nas relações afetivas (parte 1)

Autor

  • José Fernando Simão

    é professor associado do departamento de Direito Civil da Faculdade de Direito da USP livre-docente doutor e mestre em Direito Civil pela mesma faculdade diretor do IBDCONT e vice-presidente do IBDFAMSP.

8 de janeiro de 2017, 7h05

Spacca
“O dinheiro é um tema que detona a
emergência e a evidência de todos os
contratos tácitos e implícitos que
invariavelmente permeiam nossas relações.”
(Clara Coria, em O Sexo Oculto do Dinheiro)

Há algum tempo, fui convidado pelos professores Oksandro Gonçalves e Marcia Carla Pereira para proferir uma palestra na PUCPR. O tema era "Análise Econômica do Direito", e tive o prazer de aprender com os professores Ricardo Lupion e Cesar Santolim e com os organizadores do evento, que gentilmente me convidaram para falar sobre os princípios sociais dos contratos.

Na palestra do professor Oksandro, tomei conhecimento de um site chamado Meu Patrocínio e imediatamente acessei a internet para ver do que se tratava. Passei, então, a conhecer a figura do sugar daddy.

Sugar — açúcar em inglês — e daddy — papai — são duas palavras que, somadas, indicam que o homem, mais velho e, por isso, papai, se dispõe a “bancar” mulher mais jovem. Não se trata de um site de prostituição em que homens, após manutenção de relação sexual, pagam pelos serviços prestados. É uma relação em que o homem mais velho tem prazer em se relacionar com mulher mais jovem que gosta de ser mimada, ganhar presentes, viajar, comer em bons restaurantes, sair para lugares chiques. Já o homem mais velho, normalmente em uma fase da vida pela qual poucas mulheres mais jovens sentem atração, paga para ela e proporciona alguns luxos, prazeres que a ela estariam negados em razão do custo.

Imagino que o leitor deva estar se perguntando: não é possível que uma mulher mais jovem se apaixone por um homem mais velho? A resposta é positiva e isso acontece. O site simplesmente proporciona que, se isso não ocorreu com você, homem com mais de 50 anos, com recursos financeiros, você possa estar na companhia de uma mulher mais jovem que dividirá com você os prazeres da vida: viagens, restaurantes, shows, espetáculos etc.

Para as candidatas a sugar babies, o site informa: “Você merece o melhor que o mundo tem a oferecer e está preparada para agarrar uma oportunidade. Quer um mentor, alguém que te apoie nos estudos ou na carreira, emocional ou financeiramente. O Meu Patrocínio te ajuda a encontrar alguém generoso e experiente para um relacionamento maduro, transparente e sem joguinhos, cheio de viagens fantásticas e mimos”.

Já para os possíveis sugar daddies, o texto é o seguinte: “Você trabalhou muito para se tornar a pessoa bem-sucedida que é hoje. Quer o melhor que a vida tem a oferecer, e prefere que seja com alguém que compartilhe dessa energia e tenha conteúdo suficiente para trilhar o caminho com você, onde quer que seja. O Meu Patrocínio te ajuda a encontrar mulheres atraentes e promissoras para um relacionamento verdadeiro e transparente”.

Os adjetivos indicam que o que se oferece é algo maduro, verdadeiro e transparente. O casal não precisa “de joguinhos” para atingir seus objetivos. A relação é clara. Transparência é o que vende o site.

Transparência significa que as partes não ocultam seus interesses. Ela não quer uma relação amorosa, nem ele. São pessoas que buscam companhia e convívio com regras bem claras: "Tudo é combinado, sem mal-entendidos", segundo o texto do site.

Em minha opinião, o site reflete aspectos claros dos novos tempos ou pós-modernidade.

A primeira marca desses tempos é que as pessoas buscam diversas formas de prazer, além das tradicionais. Há muita criatividade e hedonismo. Não é necessários buscar o prazer apenas no sexo, apenas no namoro, apenas no casamento, apenas nas viagens, apenas nos restaurantes e nos presentes.

A segunda marca dos tempos em que vivemos é que são tempos de experimentar novos modelos. Poucos dizem, ninguém escreve, mas muitos sentem que o modelo construído para os relacionamentos heterossexuais e copiados pelas famílias homoafetivas de casamento ou união estável é um modelo decadente e em franca mudança.

No século XX, o Direito mudou apenas as relações entre homens e mulheres por meio da igualdade e ampliou às pessoas do mesmo sexo o acesso a modelos em crise e de pouco ou nenhuma efetividade e afetividade. O século XXI assiste a um questionamento dos modelos de relação e admite que há relações diferentes das tradicionais.

A terceira marca é a transparência. Os aplicativos de relacionamento, que são muitos, exigem que o utilizador seja direto: o que quer, quando quer e em que condições quer.

É isso que faz o site Meu Patrocínio. Demonstra que interesse é palavra avalorativa, nem positiva nem negativa, e que todas as pessoas em toda e qualquer relação o tem. Interesse não é algo pejorativo ou negativo. É simplesmente a vontade de estar com. Nada mais.

Mas há mais a compreender. Na parte 2, Giselle Groeninga fará considerações a partir da Psicanálise a respeito da ideia de transparência nas relações afetivas.

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