Opinião

Aplicado em Minas, método Apac é uma das soluções para sistema penitenciário

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26 de fevereiro de 2017, 7h42

O sistema prisional brasileiro sofreu inúmeras alterações. Atualmente, os presídios centralizados e superlotados colocam presos que cometeram crimes menores em contato direto com criminosos perigosos. 

Sabemos que as péssimas condições em que se encontram os estabelecimentos prisionais não ressocializam, pelo contrário, criam ainda mais delinquentes. No entanto, para o aprimoramento da sociedade, tais questionamentos devem ser acompanhados de novas propostas, isso porque a crítica por si só não é capaz de transformar a realidade. Assim, buscando alternativas para o sistema prisional tradicional e pautando-se pelos questionamentos acima, estudamos o método de administração de presídios desenvolvido pela APAC. 

Através de pesquisas recentes, ficou evidente que o método APAC seria uma tábua de salvação para o sistema prisional durante o cumprimento de pena, ajudando a reduzir o número de reincidentes, bem como os problemas que hoje existem nos sistemas prisionais comuns. 

Por esse motivo o Estado tem como dever oferecer condições concretas para que, após o cumprimento da pena, o condenado possa retomar a sua vida fora do cárcere, sem que lhe impeçam de conviver plena efetivamente em sociedade. 

2 – A crise no sistema prisional brasileiro  

Os índices alarmantes de criminalidade vêm assustando a sociedade, que se encontra impotente diante do crescimento da insegurança. 

A crise no sistema prisional brasileiro reflete a incapacidade dos governos em assumir o gerenciamento das unidades prisionais como ambientes de reeducação e recuperação social. No entanto, os presídios são espaços da desumanização dos indivíduos forçados a conviver em condições precárias. 

Sobre o problema de administrar as prisões brasileiras, Salla (2001, p. 20) ressalta a necessidade de se estudar melhor as rebeliões, motins e fugas. Destaca o quanto estes fenômenos são pouco estudados pela ciência, e que muitos deles estão ligados ao problema estrutural da prisão: deterioração dos espaços físicos e locais de encarceramento, superlotação, condições de higiene, ausência de assistência jurídica, de saúde, educação, corrupção, incompetência administrativa, além da constância da prática de tortura. 

O desrespeito à cidadania dos presos se relaciona com a permanência da tortura em muitos estabelecimentos prisionais, ausência de projetos educativos e esportivos e descumprimento das leis que proíbem justamente a prática de medidas que ofendam a dignidade humana, como por exemplo, a Constituição Federal de 1988 e a Lei nº 7.210/94 – Lei de Execuções Penais. 

A violação dos direitos humanos dos presos é uma constante e vincula-se a um conjunto de causas. Entre elas, uma das mais importantes é, sem dúvida, a ideia de que o abuso sobre as vítimas – presos e, por isso, criminosos – não merece a atenção “pública” (ROLIM, 2007, p. 7). 

Não podemos colocar a responsabilidade pelo aumento da criminalidade exclusivamente na miséria. A miséria é um componente que amplia as possibilidades de que os grupos submetidos as desigualdades sociais sejam as principais afetadas pelo crescimento da criminalidade. 

A Lei de Execuções Penais dispõe no Artigo 1º que: “A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado”. 

No entanto, o Estado não está cumprindo o estabelecido nas normas legais.

Nesse sentido, é importante fazer um levantamento dos principais problemas que atingem os estabelecimentos prisionais para alertar a sociedade, acerca da necessidade de se promover a dignidade dos condenados, evitando assim os altos índices de reincidência. 

4 – O método Apac – Associação de Proteção e Assistência aos condenados 

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais – TJMG (2009, p.17) dispõe sobre a Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (APAC), como sendo: 

(…) uma entidade civil de direito privado, com personalidade jurídica própria, dedicada à recuperação e reintegração social dos condenados a penas privativas de liberdade. O trabalho da APAC dispõe de um método de valorização humana, vinculada à evangelização, para oferecer ao condenado condições de se recuperar. Busca também, em uma perspectiva mais ampla, a proteção da sociedade, a promoção da Justiça e o socorro às vítimas. 

No ano de 1972, na cidade de São José dos Campos, estado de São Pulo, o advogado Dr. Mario Ottoboni liderou o grupo com mais 15 pessoas preocupadas com lotação das prisões no Município. 

Para Mario Ottoboni, a APAC

é um método de valorização humana, portanto de evangelização, para oferecer ao condenado condições de recuperar-se, logrando, dessa forma, o propósito de proteger a sociedade e promover a justiça (OTTOBONI, 2004, p. 23)

A APAC é uma entidade jurídica sem fins lucrativos, imbuída na missão de reestruturar a maneira como a execução da pena é executada. O acompanhamento da sociedade civil é um diferencial no caminho para a reabilitação social.

O método APAC surge com embasamento na Lei de Execução Penal, enfatizando o cumprimento de pena, executando a liberdade progressiva, priorizando a reeducação do preso para desempenhas os requisitos preliminarmente estabelecidos. A APAC é baseada no amor, na confiança e, na disciplina, o objetivo da APAC é recuperar o preso, proteger a sociedade, socorrer a vítima e promover a justiça. 

A filosofia da APAC segundo seu fundador: 

Enquanto o sistema penitenciário praticamente – existem exceções – mata o homem e o criminoso que existe nele, em razão de suas falhas e mazelas, a APAC propugna acirradamente por matar o criminoso e salvar o homem. Por isso, justifica-se a filosofia que prega desde os primórdios de sua existência: “matar o criminoso e salvar o homem”. (OTTOBONI, 2014).

Desta forma, conforme a filosofia introduzida por Ottoboni, o método APAC

pretende propor ao recuperando[1] e a sociedade que o crime cometido seja deixado no passado e que ao adentrar ao estabelecimento prisional, através da valorização e por meio da religião busca-se resgatar o ‘homem’ que existe no criminoso. 

A APAC encontra amparo na Constituição Federal, e esta possibilita sua atuação em presídios, e seu Estatuto vem resguardado pelo Código Civil e pela Lei de Execução Penal. Além disso, opera como entidade auxiliar dos Poderes Judiciário e Executivo, respectivamente na execução penal e na administração do cumprimento de penas privativas de liberdade nos regimes fechado, semiaberto e aberto. 

O que diferencia a APAC do sistema carcerário comum, é que os recuperando são corresponsáveis pela própria recuperação, além de lhe ser oferecida assistência espiritual, médica, psicológica e jurídica prestada pela comunidade local.

A metodologia aplicada leva em consideração experiência vivenciada pelo recuperando. É necessário trabalhar o problema existente; conhecer as questões que levaram o recuperando ao crime e à prisão; trabalhar os fenômenos, os fatores e sofrimentos que o levaram à transgressão.

O Projeto orienta as comarcas e municípios interessados em implantar e desenvolver o Método Apac no Estado de Minas Gerais, como medida de defesa social, já que a Apac atinge até 90% de recuperação do condenado, ao passo que o sistema penitenciário tradicional, gastando três vezes mais, apresenta um índice de apenas 15% de reintegração do egresso. (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS, 2009, p. 13).

Desta forma, restou demonstrado como funciona essencialmente o método APAC, que aplicam nas suas unidades a vigilância constante (exercida pelos próprios recuperandos); a promoção da educação e do laser (através da alfabetização e oficinas de trabalhos artesanais); a progressão por meio do mérito (através da obtenção de benefícios concedidos aos condenados que realizam as tarefas conforme determinado). 

4.2 Recuperação e Reintegração Social dos Condenados

A pena, conforme preceitua a Lei de Execução Penal, tem a finalidade de retribuição, prevenção especial e ressocialização [2].

Segundo o artigo 144 da Constituição Federal de 1988: “A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio (…)”. Nesse sentido, o Estado além de prevenir as condutas criminosas, visando salvaguardar a segurança pública, tem a obrigatoriedade de punir quem atente contra ela.

Para Mirabete:

O direito, o processo e a execução penal constituem apenas um meio para a reintegração social, indispensável, mas nem por isso o de maior alcance, porque a melhor defesa da sociedade se obtém pela política social do estado e pela ajuda pessoal. (MIRABETE, 2002, p. 23)

Realizar somente a punição das condutas criminosas para alcançar a paz social é combater um lado do problema. É importante que O estado promova a recuperação do condenado para evitar a reincidência em crimes, e ainda, a reinserção do egresso que cumpriu a sua condenação e está quite com a justiça e a sociedade.

O art. 10 da Lei de Execução Penal assegura que é dever do Estado dar assistência ao preso e ao internado [3]. Portanto, ao preso é garantido o direito a assistência como forma inicial do processo de recuperação, onde deverão ser resgatados valores humanos.

Importante salientar que o método APAC é inspirado no princípio da dignidade da pessoa humana e ainda, na premissa que ninguém é irrecuperável. Nesse sentido se distingue do modelo convencional de execução penal quanto à valorização do ser humano e a busca pela capacidade de recuperação. Segundo Ottoboni (2014) o método APAC tem uma tripla finalidade: é órgão auxiliar da justiça, protege a sociedade e é um órgão de proteção aos condenados. 

É de notório conhecimento da população que grande parte dos condenados que deixam os estabelecimentos prisionais geralmente cometem outros delitos logo que ganham as ruas. Este é o preço pela falha do Estado no sentido de promover a efetiva recuperação do preso para que possa ser reinserido na coletividade.

A percepção do preconceito da sociedade em relação ao preso, que negava até a humanidade dos sujeitos, está atrelada à visão de falta de oportunidades. Não apenas fora, mas também dentro do sistema prisional faltariam oportunidades, o que constitui outro grande empecilho para a reintegração social. 

Promover a recuperação do condenado significa proporcionar aos presos uma reflexão sobre as condutas criminosas, resgatar os valores socialmente apropriados para o convívio coletivo pacífico, a fim de que ele possa retornar à sociedade e não volte a delinquir. 

5 – Conclusão 
O presente trabalho abordou a estrutura dos estabelecimentos prisionais convencionais, as condições precárias em que se encontram os condenados e a crise do Sistema Prisional Brasileiro. Apontou ainda, a discussão acerca da recuperação do preso através de um comparativo entre o sistema prisional convencional e o método APAC.

O problema da superlotação prisional gera consequências como o aumento de tóxicos, falta de higiene, falta de acesso de todos os detentos ao trabalho e a educação, alastramento de epidemias, violência física e sexual, que afetam tanto a vida do preso, como de seus familiares, afastando a possibilidade de se realizar a finalidade da pena de reclusão: a ressocialização do mesmo para que ocorra a sua reintegração na sociedade. 

Em meio à grave questão social de criminalidade, a reincidência penal permanece como um problema crucial. Às críticas no sistema carcerário enquanto “escola crime”, soma-se ao fato de que os programas voltados para a reintegração social surtem um efeito muito limitado sobre a vida dos detentos. Além disso, tais ações têm alcance ínfimo quanto aos egressos do sistema, que deveriam ser um público primordial de programas dessa natureza.

O que se constata é que em nosso país, e de maneira geral nos países economicamente periféricos, é que o controle social do crime da criminalidade é efetivado apenas pelo Direito Penal, que descreve crimes e comina penas, dissociado de políticas públicas na área social, envolvendo empregos, assistência médica adequada e educação, o que por si só já indica o fracasso a que estão fadadas quaisquer propostas que se prendam somente a atingir os resultados diretos dos problemas criminais, sem o enfretamento simultâneo das causas sociais que em muito se ligam a eles. 

O método APAC mostra-se como um meio viável para a promoção da recuperação do condenado através dos doze elementos fundamentais, sendo assim um exímio mantenedor da segurança pública e da paz social. A APAC apresenta-se como uma esperança para a sociedade em crer que existe um homem por trás da conduta do criminoso e que este precisa ser resgatado. 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ASSIS, Rafael Damasceno de. A realidade atual do sistema penitenciário Brasileiro. Disponível             em:<http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/3481/A-realidade-atual-dosistema-penitenciariobrasileiro>. Acesso em 02 de maio de 2016. 

BARROS FILHOS, José Nabuco Galvão de. O direito à informação e os direitos dos presos – um libelo contra a execração publica. Revista de Informação Legislativa. Brasília a. 34, n.165, jul/set 1997.

BRASIL. Lei nº 7.210, de 11 de julho 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Disponível em:

<https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7210.htm> Acesso em 14 de julho de 2016. 

BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. São Paulo: RT, 1977. 

BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992. 

BUSSINGER, Vanda Valadão. Fundamentos dos direitos humanos. In: Revista Serviço Social e Sociedade. São Paulo: Cortez, 1997, nº 53, ano XVIII, mar. 1997. 

DAC     MINAS     GERAIS.     O      que     é     APAC,      sem     data.      Disponível      em:

<http://www.dac.mg.gov/index.php?option=com_content&viem=article&id=47&Itemid=55> Acesso em 18 de junho de 2016. 

GOMES, Luiz Flávio. Funções da pena no Direito Penal Brasileiro. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1037, 04 de maio de 2006. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/8334> Acesso em 13 de julho de 2016. 

GREGO, Rogério. Curso de direito penal: parte geral. 10. ed. rev. e atual. Niteróis: Impetus, 2008. 

MIRABETE, Julio F. Execução Penal: comentário a Lei n.7.2010. 11. Ed. São Paulo: Atlas, 2006.

 


[1] Nome sugerido por Ottoboni a ser dado ao condenado que está cumprindo pena sob os fundamentos do método APAC.

[2] Art. 1º A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado (Lei de Execução Penal – Lei 7.210/1984).

[3] Art. 10. A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade.

Parágrafo único. A assistência estende-se ao egresso. 

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