Veto a muçulmanos

Tribunal na Califórnia mantém decisão que suspendeu decreto de Trump

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10 de fevereiro de 2017, 9h21

Um painel de três juízes do Tribunal de Recursos de São Francisco (Califórnia) decidiu nesta quinta-feira (9/2), por unanimidade, manter a suspensão do decreto do presidente Trump que vetou a entrada no país de cidadãos de sete países de maioria muçulmana, por 90 dias, e de refugiados por 120 dias. A decisão de suspender o decreto presidencial foi tomada na sexta-feira (3/2) por um juiz federal que Trump chamou de pseudo juiz (so-called judge).

A reação do presidente Trump, pelo Twitter, foi enigmática: “Nos veremos no tribunal. A segurança de nossa nação está em jogo”. Em entrevista à TV, ele afirmou que a decisão do tribunal foi política. O Departamento de Justiça, encarregado da defesa do decreto presidencial foi mais pragmático: “Vamos analisar a decisão e considerar as opções”. As opções são a de pedir ao plenário pleno do tribunal para rever a decisão ou recorrer à Suprema Corte dos EUA.

Se o caso for para a Suprema Corte, o governo terá de lidar com o fato de que são quatro ministros conservadores (nomeados por presidentes republicanos) e quatro ministros liberais (nomeados por presidentes democratas), porque a vaga do nono ministros, aberta com a morte do ex-ministro Antonin Scalia em fevereiro de 2016, nunca foi preenchida. Ou seja, o resultado poderá ser um empate por quatro votos a quatro.

A decisão do tribunal de recursos critica a alegação do governo de que a Justiça não tem de julgar decretos presidenciais sobre imigração, particularmente quando motivadas por questões se segurança nacional e mesmo que tais medidas entrem em conflito com os direitos e proteções constitucionais.

Para os juízes, tal alegação contraria a estrutura fundamental da democracia constitucional do país. “Os tribunais não são impotentes para julgar ações do poder executivo, mesmo em matéria de segurança nacional. Ao contrário, embora se conceda deferência a determinações de segurança nacional, a Suprema Corte já esclareceu que a autoridade e os conhecimentos do governo sobre essa matéria não sobrepujam (a corte usou o verbo “trump") a obrigação dos tribunais e garantir as proteções constitucionais dos cidadãos, mesmo em tempos de guerra”.

“A defesa nacional não pode ser considerada um fim em si mesma, justificando qualquer exercício de poder legislativo para promover tal objetivo… Seria, de fato, irônico se, em nome da defesa nacional, aprovássemos a subversão de uma dessas liberdades, que faça com que a defesa da nação valha a pena”, escreveram os juízes.

Devido processo
A Quinta Emenda da Constituição dos EUA proíbe o governo de privar o indivíduo de sua “vida, liberdade ou propriedade, sem o devido processo da lei”. No processo, o governo deve fornecer à pessoa “notificação e uma oportunidade de responder” ou, em outras palavras, a oportunidade de apresentar suas razões pelas quais a privação de seus direitos deve ser interrompida, diz a decisão.

No decreto presidencial, o governo não diz como vai garantir o devido processo e o que ele requer, tal como notificação e uma audiência antes de restringir a capacidade de um indivíduo de viajar. Ao invés disso, o governo alega que os indivíduos afetados pelo decreto presidencial não têm os direitos previstos na cláusula do devido processo.

Na verdade, dizem os juízes, a cláusula do devido processo não é limitada aos cidadãos. “Ela se aplica a todas as pessoas nos Estados Unidos, incluindo estrangeiros, independentemente do fato de sua presença no país ser legal, ilegal, temporária ou permanente”, diz a decisão.

Discriminação
A decisão do tribunal de recursos também considera que o decreto presidencial faz discriminação contra os muçulmanos. A Primeira Emenda da Constituição proíbe a aprovação de qualquer “lei respeitando o estabelecimento de religião. Qualquer lei que contenha propósitos religiosos, não seculares, viola a Constituição.

De acordo com decisão da Suprema Corte, não se trata apenas de discriminar “contra” – discriminar a favor também viola a Constituição. Qualquer endosso a uma religião transmite a mensagem aos não adeptos de que eles são intrusos.

Em suas alegações ao tribunal de recursos, os advogados do Departamento de Justiça afirmaram que o decreto presidencial não tem a intenção de discriminar contra muçulmanos. Porém, só fizeram essa declaração, sem apresentar qualquer argumento ou prova de que isso seja verdade.

Por sua vez, os procuradores-gerais que representaram os estados de Washington e Minnesota, contra o decreto, apresentaram provas de que essa intenção vem se evidenciando desde a campanha eleitoral, quando o então candidato Donald Trump prometeu barrar a entrada de muçulmanos no país. O decreto presidencial é o cumprimento da promessa de campanha.

Os juízes disseram que o governo não apresentou qualquer prova de que os cidadãos dos sete países discriminados pelo decreto presidencial (Iraque, Irã, Síria, Líbia, Sudão e Iêmen) cometeram qualquer ato terroristas nos EUA.

O governo mencionou na justificativa do decreto os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001. Porém, esses ataques foram realizados por 15 cidadãos da Arábia Saudita, dois dos Emirados Árabes Unidos, um do Egito e um do Líbano (no total, 19 membros da al-Qaeda).

“Nos recusamos a limitar o decreto de restrição temporária a um escopo geográfico. Segundo a decisão de um tribunal federal, a política de imigração fragmentada entre em conflito com exigências constitucionais e legais de que as leis e políticas de imigração sejam uniformes”, escreveram.

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