Medida humanitária

IAB lamenta que indulto natalino seja prejudicado por "discurso repressivo"

Autor

31 de dezembro de 2017, 12h13

O Instituto dos Advogados Brasileiros criticou a liminar da presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, que suspendeu trechos do decreto de indulto natalino. Segundo a entidade, a decisão quebra “tradição humanitária, cristã, criada há quase dois séculos para mitigar o impacto do castigo penal”.

Reprodução
Presidente do IAB, Técio Lins e Silva critica escalada do punitivismo.
Reprodução

Em nota assinada por seu presidente nacional, Técio Lins e Silva, o IAB também considerou reprováveis os questionamentos ao indulto feitos pela Procuradoria-Geral da República.

“Os questionamentos da PGR estimulam um sentimento equivocado da opinião pública em relação à repressão penal. É lamentável que o indulto natalino seja prejudicado por um discurso repressivo, que sublinha o ódio e a ideia da prisionalização, vindo de quem deveria ser o defensor do estado de direito democrático e das liberdades públicas.”

Pedido da PGR
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu ao STF a suspensão do decreto de indulto. Segundo ela, a norma, nos moldes apresentados, fez com que o Executivo se substituísse ao Legislativo e ao Judiciário ao reduzir penas definidas pelo Código Penal sem atenuantes analisadas por juiz ou alteração promovida em processo legislativo.

“Sem as repercussões patrimoniais […] o condenado não tem o mais ínfimo desestímulo de cometer novos crimes e não teria mais nenhum interesses em colaborar com a justiça, seja pela confissão, seja pela colaboração premiada”, diz a PGR especificamente sobre a concessão dos benefícios mesmo sem o pagamento das multas aplicadas.

Raquel Dodge alegou ainda que o decreto não demonstrou a razão de fato e de direito a justificar os benefícios concedidos. "Ao extinguir a punibilidade do réu condenado antes do cumprimento integral da pena que lhe foi aplicada pelo juiz, o indulto resultaria em atuação atípica do Executivo em atividade do Judiciário", disse a procuradora-geral.

Em sua decisão, Cármen Lúcia considerou que houve desvio de finalidade na edição do decreto. Conforme a presidente do STF, pessoas que tiveram a suspensão condicional do processo, como no caso de quem faz acordo de colaboração premiada, não podem ser beneficiadas com o indulto. Isso porque não houve, no caso, juízo de mérito ou formação de culpa pelo Poder Judiciário, tornando o réu “incompatível com a antecipada extinção da punibilidade”.

Ao suspender a possibilidade de o decreto presidencial atingir multas previstas nas condenações, Cármen Lúcia afirmou que a pena pecuniária não provoca "situação de desumanidade" nem é "digno de benignidade".

Além disso, diz a decisão, o STF entende que, para que o condenado possa obter benefício carcerário, como a progressão de regime, é imprescindível que já tenha quitado a pena de multa, salvo por motivo justificado, "o que bem demonstra a inadequação de se prever indulto para tais situações”.

Outro trecho suspenso pela ministra concede o indulto natalino às pessoas que tenham cumprido, até 25 de dezembro deste ano, um quinto da pena, se não reincidentes, e um terço da pena, se reincidentes, por crimes sem grave ameaça ou violência. Já o inciso I do parágrafo 1º do artigo 2º detalha que a redução das penas previstas no inciso I do artigo 1º serão de um sexto para réus primários e de um quarto para reincidentes.

Barulho por nada
Dos 22 condenados na operação "lava jato" até o momento, apenas um poderia ser beneficiado com o indulto natalino deste ano, editado pelo presidente Michel Temer e suspenso parcialmente pela ministra Cármen Lúcia. 

O levantamento foi feito pelo jornalista Ricardo Balthazar, da Folha de S.Paulo. Essa constatação, segundo ele, se dá porque o decreto de Temer concedia comutação de penas e outros benefícios àqueles que já tivessem cumprido 20% das penas definidas pela Justiça. E só o ex-deputado do PP Luiz Argôlo — condenado por fraudes à licitação na Petrobras — já cumpriu esse percentual de sua pena.

Já o ministro do Supremo Gilmar Mendes afirmou que o debate sobre o indulto tem sido guiado por pessoas despreparadas e por "espertalhões". Em entrevista ao jornalista José Luiz Datena, o ministro distribuiu críticas também ao uso da imprensa por membros do Ministério Público e do Judiciário.

“Parece que todos estão discutindo às cegas”, lamentou o ministro, destacando que esse cenário “revela um despreparo geral”. Essa situação, disse, está ocorrendo porque “há muitas mãos no Brasil precisando de bandeiras”, e na mão dessas pessoas “até folha vira bandeira”.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!