Efeito Trump

EUA intensificam guerra comercial contra concorrentes estrangeiros

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28 de dezembro de 2017, 9h35

Desde a posse do presidente Donald Trump, em janeiro de 2017, empresas americanas e o próprio Departamento de Comércio dos EUA abriram 23 processos comerciais contra concorrentes de 29 países, incluindo o Brasil, em busca de mais vantagens no comércio internacional.

Na verdade, foram iniciadas 79 investigações de disputas comerciais, porque alguns desses 23 processos visam produtos de diversos concorrentes. Isso representa um aumento de 65% sobre o volume de disputas do ano anterior. Trata-se de um recorde, nos últimos 16 anos, segundo os jornais Washington Post e Los Angeles Times.

Dados do Departamento de Comércio, analisados pelos jornais, mostram que as empresas americanas estão buscando diversos tipos de proteção comercial, para se tornarem mais competitivas. Os casos mais comuns são os de empresas que querem que mais tarifas de importação (ou sobretaxas) sejam impostas a produtos concorrentes.

Alguns casos se referem a pedidos de criação de price quotas – ou de preços mínimos para os produtos importados. Duas empresas pediram a adoção de um dispositivo de “salvaguarda”, um instrumento “poderoso”, raramente usado pelos EUA no comércio internacional, que impõe blanket taxes (criação de impostos sem especificar projetos específicos) sobre produtos, independentemente do país de origem.

As empresas americanas acusam concorrentes estrangeiras, entre outras coisas, de estarem praticando dumping (despejo de mercadorias a preços abaixo do custo para derrubar concorrentes e conquistar mercado) nos Estados Unidos. E que alguns produtos são “injustamente subsidiados” pelos governos dos países exportadores.

Uma característica dessa nova guerra comercial, sob a bandeira de Trump, é que ela está se desenvolvendo como um esforço concentrado entre empresas e governo. Isto é, o Departamento de Comércio também pode abrir processos comerciais. Efetivamente, em novembro, o Departamento de Comércio moveu uma ação tarifária contra distribuidoras de chapas metálicas da China – a primeira ação iniciada pelo governo deste 1985.

Outra característica é a que as empresas americanas não precisam mais declarar que estão se tornando inviáveis por causa da concorrência de estrangeiras. Graças a uma lei federal aprovada em 2015, a Trade Preferences Extension Act, a Comissão de Comércio Internacional dos EUA não pode mais barrar empresas de mover disputas comerciais só porque são lucrativas.

Esse foi o caso (amplamente noticiado) do processo que a Boeing moveu contra a fabricante canadense de aeronaves Bombardier. A Boeing é uma das maiores exportadoras dos EUA, obtém grandes margens de lucro na venda de jatos comerciais para companhias aéreas e de armamentos avançados para os militares.

Apesar disso, ela alegou que foi ilegalmente prejudicada por uma transação da empresa canadense com a Delta Airlines envolvendo 75 aeronaves CS100, de 100 a 150 lugares. A Boeing não compete nessa categoria de aviões. Apesar disso, foi imposta uma tarifa de importação de 300% sobre a venda dos aviões canadenses.

Mas a Bombardier contornou esse problema, para o futuro: vendeu os direitos de fabricação do CS100 para a Airbus, empresa de origem francesa que é a principal competidora da Boeing. Agora, as aeronaves da série C serão fabricadas no Alabama e não estarão mais sujeitas às regras e tarifas de importação.

A maioria das empresas, porém, se sustenta na lamentação de que seus negócios estão sendo duramente afetados por falta de restrições às importações. O argumento mais comum – e altamente convincente no atual panorama econômico do país – é o de que o comércio internacional sem restrições está não só minando os projetos do governo de criação de empregos, como está resultando em volumes significativos de demissões.

O Departamento de Comércio declara a mesma coisa: “Estamos do lado do trabalhador americano, que sofrem as consequências de práticas comerciais injustas”, diz uma de suas declarações.

Casos anotados
Os jornais Washington Post e pelo Los Angeles Times anotaram diversos exemplos de processos comerciais movidos por empresas americanas – e até mesmo por empresas estrangeiras instaladas nos EUA – contra concorrentes que operam no exterior, inclusive com envolvimento de empresas brasileiras:

  • A Ferroglobe, um conglomerado da área de metais com sede no Reino Unido, pediu ao governo dos EUA que imponha restrições à importação de metais de silício do Brasil, Austrália e Noruega.
  • A DAK Americas, subsidiária na Carolina do Norte da maior firma de têxteis do México, se aliou à Indorama Ventures USA, subsidiária de uma empresa indiana, para pedir restrições à importação de produtos têxteis do Brasil, da Indonésia, da Coreia, do Paquistão e de Taiwan.
  • A North Pacific Paper Co. (Norpac), sediada no estado de Washington, acusou concorrentes canadenses de inundar o mercado americano com produtos mais baratos. Afirma que teve de demitir 100 de seus 450 empregados no ano passado.
  • A Bell-Carter Foods e a Musco Family Olive, duas grandes produtoras de azeitona e derivados da Califórnia, pediu ao governo para impor restrições a produtoras espanholas, que seriam beneficiadas por um “sistema elaborado de subsídios agrícolas”. A propósito, o Departamento de Agricultura dos EUA gasta US$ 25 bilhões ou mais por ano em subsídios à agricultura do país.
  • Uma coalisão de fabricantes de biodiesel dos EUA alega que suas concorrentes na Indonésia e Argentina estão colocando seus produtos no mercado americano “a preços injustamente baixos”. Alega que a Argentina subsidia suas fabricantes.
  • A Suniva (sediada na Geórgia) e a SolarWorld USA (sediada em Oregon), fabricantes de células fotovoltaicas, reclamam que uma inundação de componentes mais baratos de fabricantes chinesas as está levando à falência. No entanto, a Solar Energy Industries Association se opõe a qualquer restrição comercial, alegando que isso causaria a perda de 88 mil empregos no setor.
  • A Whirlpool, gigante de aparelhos domésticos que registrou vendas de US$ 5,4 bilhões no ano passado, afirma que suas margens de lucro estão minguando porque está perdendo participação no mercado de máquinas de lavar roupa para as fabricantes coreanas LG e Samsung. A americana alega que as coreanas mudam suas fábricas para países com baixa carga tributária. A Samsung replica que é uma empresa americana, que emprega 18 mil trabalhadores.
  • A subsidiária americana da Nan Ya Plastics, fabricante de plásticos com sede em Taiwan, está pedindo restrições novas restrições para produtos de poliéster de fabricantes de su próprio país de origem, Taiwan, e da Coreia.
  • A Zekelman Industries, fabricante de tubos de aço, se aliou a quatro outras empresas fabricantes de produtos de aço, a ArcelorMittal, a PTC Alliance, a Webco Industries e a Michigan Seamless Tube, para pedir ao governo a implementação de um sistema de quotas que fixe preços mínimos para produtos importados. Elas querem ainda que o governo declare o mercado interno de aço e de alumínio áreas de risco para a segurança nacional, o que resultaria em restrições ainda mais rígidas aos similares estrangeiros.

O CEO da Zekelman afirma que a estratégia de impor mais tarifas ou sobretaxas sobre produtos de alguns países não funciona bem, porque as empresas estrangeiras mudam sua produção para outros países ou até mesmo para os Estados Unidos para evitá-las.

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