Interferência no Executivo

MPF tenta ditar política ao processar ex-executivos da Petrobras, dizem professores

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7 de dezembro de 2017, 19h01

Ao pedir que sete ex-conselheiros da Petrobras sejam condenados a ressarcir a estatal por terem sido contra o aumento de preços de gasolina e diesel em 2013 e 2014 para controlar a inflação, o Ministério Público Federal extrapola suas funções e intervém indevidamente no poder do Executivo de determinar medidas econômicas e políticas públicas. É o que avaliam professores ouvidos pela ConJur.

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Para especialistas, MPF não pode interferir em política pública que não viole direitos.

O MPF no Rio de Janeiro moveu ação civil pública por improbidade administrativa contra ex-integrantes do Conselho de Administração da Petrobras, como o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, a ex-presidente da estatal Graça Foster e o ex-presidente do Bndes Luciano Coutinho. De acordo com os procuradores da República, ao não adequarem os preços dos combustíveis ao que era praticado no mercado internacional, os executivos teriam gerado um prejuízo de “dezenas de bilhões de reais” à petrolífera.

Por isso, o MPF pede a condenação dos ex-conselheiros ao ressarcimento integral dos "prejuízos" à Petrobras ao segurar os preços dos combustíveis. Os procuradores da República também requerem a suspensão dos direitos políticos deles por até 8 anos. Além disso, MPF pede a condenação da União, de forma subsidiária, ao ressarcimento dos danos causados à Petrobras por abuso de poder, enquanto acionista controladora da estatal. Isso em razão do que seria um uso indevido da empresa para fins de combate à inflação.

Mas, com essa ação, o MPF está interferindo na condução da política econômica, o que cabe ao Executivo – afinal, a União é a controladora da Petrobras –, afirma o jurista Lenio Streck, que é professor de Direito Constitucional da Unisinos e colunista da ConJur.

“No sentido processual, não há lide para o MPF mexer com isso. É um problema político, de políticas de governo. O MPF não pode dizer como a Petrobras deve ser administrada. Isso é ‘ativismo ministerial’”.

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Pedro Serrano também diz que MPF privilegia acionistas privados na ação.
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Por sua vez, o professor de Direito Constitucional da PUC-SP Pedro Estevam Serrano aponta que o MPF não pode questionar atos políticos relacionados à condução da economia, pois isso impede o exercício das funções do Executivo. E é esse Poder que deve determinar as políticas públicas da área, sejam elas eficazes ou não, destaca.

Pior: se o Judiciário aceitar o pedido do MPF e condenar os ex-conselheiros e a União pelos supostos prejuízos causados à Petrobras, estará proferindo uma decisão inconstitucional, que afetaria o princípio da separação de Poderes, opina Serrano.

Nessa mesma linha, o professor de Direito Financeiro da Uerj Ricardo Lodi considera que o MPF está interferindo em políticas públicas, que também devem ser exercidas por sociedades de economia mista, como a Petrobras. A seu ver, a instituição age com dois pesos e duas medidas.

“Interessante perceber que os mesmos cuidados não são adotados quando o BNDES antecipa pagamentos que só venceriam no prazo superior a 20 anos, em fragrante prejuízo à instituição financeira”, declara, referindo-se ao recente repasse de R$ 33 bilhões que o banco público fez ao governo federal.

O Ministério Público só pode mover ação de improbidade contra uma medida econômica se ela violar direitos fundamentais, destaca o professor de Direito Constitucional da Uerj Daniel Sarmento.

Ele também critica a banalização de ações desse tipo – que têm um cunho sancionatório, “quase penal”: “Nem toda política pública que deu errado configura improbidade administrativa”.

Já o professor de Direito Administrativo da PUC-SP Rafael Valim acredita que o MPF partiu de uma premissa errada no caso: a de que uma empresa estatal tem que dar lucro.

“Não se pode tratar uma empresa estatal como se ela fosse meramente privada. A empresa estatal não existe para gerar lucro. Se isso ocorrer, muito bem, mas se não gerar lucro, paciência. O importante é que ela cumpra a missão dela adequadamente. A empresa estatal é um instrumento de ação do Estado como são as autarquias, fundações, em ter outras”, explicou Valim, lembrando que os conselheiros da Petrobras têm uma alta margem de discricionariedade para agir.

Proteção a acionistas
Quando o MPF alega que o não reajuste dos preços dos combustíveis gerou um prejuízo bilionário à Petrobras e pede que os ex-conselheiros e a União devolvam esse valor à companhia, está privilegiando os acionistas privados da estatal em detrimento dos interesses da sociedade, afirma Pedro Serrano.

Segundo o professor da PUC-SP, todos os governos usam o controle do preço da gasolina como medida macroeconômica. E quem investe na Petrobras sabe disso e não pode alegar que foi pego de surpresa, destaca Serrano.

Embora os procuradores possam sustentar que, com a ação, estão querendo proteger a estatal e, indiretamente, a União e o povo, eles estão querendo interferir na gestão da Petrobras, argumenta Ricardo Lodi, lembrando que isso não é função do Ministério Público.

“Se o governo não puder utilizar as estatais para implemento das suas políticas públicas, de nada adianta mantê-las”, analisa o professor da Uerj.

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