O Tribunal de Justiça de São Paulo distribuiu, entre janeiro e agosto, 99 processos envolvendo casos de feminicídio. Sete deles já foram julgados. Em 2016, foram abertos 132 processos relacionados a esse tipo de crime.
Dados do Anuário da Justiça São Paulo 2017 mostram que, em 2016, a Justiça paulista recebeu 90 mil casos de violência doméstica. Segundo a publicação, desde que o feminicídio passou a ser contabilizado, em outubro de 2015, a Justiça de São Paulo processou 13 acusações do tipo por mês. Além disso, foram 136 casos julgados desde a criação do crime até dezembro do ano passado.
Em todo o Brasil, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o número de assassinatos chega a 4,8 para cada 100 mil mulheres. O Mapa da Violência de 2015 aponta que, entre 1980 e 2013, mais de 106 mil mulheres morreram por sua condição de gênero.
Entre 2003 e 2013, houve aumento de 54% no registro de mulheres mortas por seus companheiros, passando de 1,8 mil para 2,8 mil nesse período. Muitas vezes, os próprios familiares (50,3%) ou parceiros/ex-parceiros (33,2%) são os que cometem os assassinatos.
Com a Lei 13.140/2015, o feminicídio passou a constar do Código Penal como circunstância qualificadora do homicídio. A regra também incluiu os assassinatos motivados pela condição de gênero da vítima no rol dos crimes hediondos, o que aumenta a pena de um terço até a metade da imputada ao autor do crime.
Para definir a motivação, considera-se que o crime deve envolver violência doméstica e familiar e menosprezo ou discriminação à condição de mulher. De acordo com a juíza da 2ª Vara Criminal de Santo André, Teresa Cristina Cabral Santana Rodrigues dos Santos, a Lei do Feminicídio trouxe visibilidade a este tipo de crime.
“Nosso diálogo acontece exatamente por conta dessa inserção, por conta do nome que se deu, porque até então ele era um fenômeno que acontecia, mas era invisibilizado”, destaca. Porém, a tipificação não é automática. “A gente ainda demora um tempo para fazer as adaptações, considerar as mortes violentas de mulheres acontecidas dentro do domicílio como feminicídio, nem sempre essa classificação é feita assim de início.”
A promotora de Justiça e coordenadora do Grupo Especial de Enfrentamento à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (GEVID) do Ministério Público de São Paulo, Silvia Chakian, alerta que a lei é um ponto de partida, mas não será, sozinha, capaz de acabar com crimes de feminicídio.
“Como um problema bem complexo de causas sociais que estão relacionadas a aspectos da nossa sociedade – ainda tão patriarcal, machista e conservadora – não existe uma fórmula mágica, é necessário um conjunto integrado de ações”, opina a promotora.
A promotora ressalta ainda que a lei carece de implementação, especialmente em relação a ações de prevenção, por exemplo, educação e concretização de uma rede de apoio às mulheres vítimas de violência. “A gente não vai avançar na desconstrução de uma cultura de discriminação contra a mulher, que está arraigada na sociedade, nas instituições e em nós mesmas, sem trabalhar a dimensão da educação.”
Menos da metade
Desde que foi tipificado como crime hediondo, em março de 2015, até 30 de novembro de 2016, o feminicídio teve 3.213 inquéritos registrados no país. Desses, 1.540 tiveram a denúncia oferecida à Justiça (47,93%), 1.395 estão com a investigação em curso, 192 foram arquivados e 86 foram desclassificados como feminicídio. Os dados são do Conselho Nacional do Ministério Público.
Dados de 2013 da Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública (Enasp) mostram que as denúncias de homicídios em geral no país ficam muito abaixo desse percentual. Dos 136,8 mil inquéritos abertos até 2007, em 2012 apenas 10.168 viraram denúncias, o que corresponde a 7,32%. Outros 39.794 foram arquivados. Com informações da Agência Brasil.