Nome pelo produto

Disputa sobre genericídio da marca Google chega à Suprema Corte dos EUA

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22 de agosto de 2017, 13h40

Dois empresários americanos chegaram à Suprema Corte dos EUA em busca de uma declaração de “genericídio” da marca Google. Eles querem registrar 763 marcas de domínio que incluem a palavra “google”, como "GoogleDonaldTrump.com", "GoogleBarackObama.com e "GoogleDisney.com". Mas foram processadas pela Google.

“Genericídio" é um termo jurídico que significa a generificação de uma marca — isto é, reconhece-se que o nome se tornou, pelo uso popular, um vocábulo comum, usado no dia a dia das pessoas. Ou, para justificar o termo “genericídio”, se tornou um nome genérico.

A ideia é a de que a marca faz tanto sucesso que ela comete suicídio (como marca comercial). Por tornar-se uma palavra de domínio público, ela não mais “merece” a proteção da patente que lhe foi conferida um dia. Nos EUA, já foram marcas – e não são mais – palavras como aspirina, videotape, trampoline, teleprompter, thermos (garrafa térmica), celofane, etc.

No Brasil, há muitos exemplos de nomes de marcas que viraram palavras. Basta ver as listas de compras, nas quais ninguém escreve hastes flexíveis com algodão nas pontas, esponja de aço, achocolatado em pó… Escreve-se cotonete, Bombril, Nescau (ou Toddy), Maizena, Chiclete, Aspirina, Danone, Band-aid, Yakult… Afinal, ninguém sabe qual é (ou foi um dia) o nome do produto. Conhece-se o produto pela marca.

Gramaticalmente, essa troca mental que o consumidor faz do produto pela marca é uma metonímia. Em termos de marketing, é o cúmulo do sucesso. Em termos jurídicos, pode ser um problema, nos EUA. Uma vez que isso acontece, alguém pode pedir à Justiça que declare o “genericídio” da marca.

Em inglês, a questão é mais grave porque é comum transformar substantivos em verbos. Por exemplo, uma pessoa “xeroca” um documento (tirar um xerox), “windexa as janelas” (passou Windex), “photoshoppeia” a foto de uma celebridade (usou o Photoshop para melhorar a foto), “rollerblada” rua abaixo (desceu a rua de patins Rollerblade) e, ontem, um policial “taserou” um suspeito agressivo (usou um taser). E quem não sabe o que é genericídio, pode “googlar” (pesquisar na Internet).

Aliás, hoje em dia alguém pode “googlar” alguma coisa, mesmo que, na verdade, esteja fazendo uma pesquisa em outros mecanismos de busca que não o Google, de acordo com o site Ars Technica e a Fortune.

E é isso, exatamente, o que alega a petição dos empresários David Elliott e Chris Gillespie: “Google não pode ser mais uma marca comercial, porque a palavra ‘google’ se tornou sinônimo na linguagem popular de pesquisar na Internet. As pessoas usam o verbo ‘google’ para se referir à pesquisa em qualquer mecanismo de busca na Internet”.

Por enquanto, as respostas dos tribunais, em primeiro grau e em nível de recurso, indicam que é preciso ir com calma. “O vocábulo ‘google’ pode ser usado como verbo, mas ainda é uma marca por legítimo direito”, decidiu um tribunal de recursos, apoiando decisão de primeira instância.

A decisão do tribunal de recursos reconhece que há evidências, incluindo a letra de uma música do rapper T-Pain, de que o termo “google” pode ser sinônimo de “pesquisar na Internet”, mas o mecanismo de busca ainda se chama “Google”, distintamente de todos os demais mecanismos de busca.

Ninguém diz “google” o Yahoo! – isto é, a não ser que alguém queira se expressar como o folclórico Vicente Matheus, ex-presidente do Corinthians, que um dia agradeceu a Antártica por lhe haver mandado umas Brahmas (presumindo que Brahma era sinônimo, literalmente, de cerveja).

O tribunal de recursos ofereceu a explicação mais clara sobre genericídio de marcas comerciais registradas: “Uma marca só sofre genericídio quando o nome se torna um definidor exclusivo, ficando difícil para os concorrentes competirem, a não ser que usem o tal termo”, escreveram os juízes. Ou seja, como um empresário pode lançar no mercado um cotonete, sem dizer que é cotonete.

Os peticionários argumentam que transformar substantivos em verbos é comum na língua inglesa e essa é uma prática que não deve ser inibida. “A apropriação de uma marca pelo público não é uma coisa para ser proibida. Em vez disso, deve ser encorajada. Ela preenche lacunas no idioma criadas pelo rápido progresso de nossas espécies, possibilitando uma comunicação mais eficiente e eficaz”, alegaram os advogados.

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