Questão preliminar

Entidades de classe têm legitimidade para questionar leis no Supremo

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17 de agosto de 2017, 16h51

A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho e a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho são legítimas para questionar a inconstitucionalidade, no Supremo Tribunal Federal, da Lei 9.055/1995, que disciplina a extração, industrialização, utilização e comercialização do amianto do tipo crisotila.

A decisão, desta quinta-feira (17/8), por maioria, foi tomada em análise de questão preliminar na ação proposta pelas entidades que começou a ser julgada pelo tribunal no dia 10. Com o entendimento, o tribunal alargou a condição de associações exercerem controle difuso da Constituição. Em outras palavras, entidades de classe têm legitimidade para questionar leis no STF. 

O amianto é um produto usado na construção civil por não ser inflamável, ter resistência mecânica superior a do aço e apresentar grande durabilidade. A maior parte da variedade crisotila é usada hoje no Brasil na indústria de fibrocimento, para fabricação de telhas. O produto, porém, é considerado cancerígeno pela Organização Internacional do Trabalho.

A ministra Rosa Weber relata o processo. Ela reconheceu a legitimidade ativa da ANPT e da Anamatra para propor a ação no tribunal e entendeu que havia pertinência temática entre a atividade exercida pelos membros das entidades, procuradores do trabalho e juízes, e o que está sendo discutido nos processos. As associações sustentam que a norma viola a Constituição porque fere a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho.

A indústria, por outro lado, discorda. Segundo o setor, poucos produtos são tão fiscalizados quanto o amianto desde a sua extração até chegar ao consumidor final. Os produtores defendem também que todas as etapas são rigorosamente monitoradas para a segurança da saúde do trabalhador. Afirmam ainda que o Brasil é referência no mundo por suas leis rigorosas sobre o uso seguro do amianto.

Acompanharam a relatora os ministros Edson Fachin, Luiz Fux, Ricardo Lewandowski, Celso de Mello, Gilmar Mendes e a presidente, ministra Cármen Lúcia. Alexandre de Moraes discordou da relatora e votou pela ilegitimidade delas. Ele reconheceu a importância das associações, mas disse que não se pode conceder a entidades de classe a possibilidade de ingressarem com ADIs de forma “universal” no STF questionando leis relacionadas ao trabalho de seus integrantes. “Todas as leis são instrumento de trabalho dos magistrados”, afirmou.

Apesar de acompanhar a relatora, o ministro Gilmar Mendes falou em ativismo e na influência que as entidades de classe exercem sobre os associados. Na opinião dele, o STF deve discutir algum tipo de restrição de legitimidade para essas associações.

Marco Aurélio acompanhou a divergência e disse que o STF tem mudado sua jurisprudência que só admitia como “legítimo universal” o presidente da República, a Procuradoria-Geral da República, os partidos políticos com representação no Congresso e o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil para propor ações de controle abstrato de constitucionalidade. “Por mais simpatia que tenha pelos meus colegas do Ministério Público do Trabalho e dos juízes do trabalho, a ANPT e a Anamatra não têm legitimidade para impugnar a lei em questão.”

Outra opinião
No dia 10, o julgamento foi suspenso após a leitura do relatório pela ministra Rosa Weber e das sustentações orais dos advogados das partes e amici curiae. Pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria, falou o advogado Marcelo Ribeiro, que questionou a legitimidade dos autores da ação, afirmando que as duas entidades não representam a categoria. Ele ressaltou que, conforme cientistas renomados, não há mal algum em usar o amianto crisotila.

Em nome do Instituto Brasileiro do Crisotila, Carlos Mário Velloso Filho lembrou voto do ministro Marco Aurélio na ADI 3.937, quando ressaltou que a vida contemporânea reclama a convivência com substâncias que podem trazer riscos à saúde humana, mas que, ao mesmo tempo, oferecem inúmeros benefícios à sociedade — como é o caso do níquel, carvão, cromo e do próprio amianto do tipo crisotila.

Da tribuna do Plenário do STF, o advogado Rodrigo Alberto Correia da Silva, da Federação das Indústrias do Estado da Bahia, alertou que muitos produtos usados no cotidiano da população levam, em sua fabricação, componentes cancerígenos ou que fazem mal ao meio ambiente. De acordo com ele, diversos produtos comuns na atualidade estão na lista de agentes cancerígenos, como o pó de sílica (utilizado na fabricação de esmaltes, vidros, óculos) e cádmio (baterias).

ADI 4.066

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