Consultor Jurídico

Juiz colecionador de arma é absolvido por ter espingarda adulterada

14 de agosto de 2017, 19h35

Por Felipe Luchete

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Um atirador e colecionador de armas de fogo não tem a obrigação de saber identificar uma peça adulterada, quando não foi ele o responsável pela alteração. Assim entendeu o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo ao absolver um juiz acusado de omitir informações ao Exército por guardar uma espingarda com cano 25 cm mais curto que o original — o que, oficialmente, tornou sua posse ilegal, podendo levar a até seis anos de prisão.

Hoje afastado, cumprindo pena de disponibilidade em outro processo, ele ganhou a arma de um diretor de clube de tiro em Espírito Santo do Pinhal (interior do estado), em 2005. A espingarda foi apreendida anos depois, quando já havia sido transferida a outro colecionador.

Ainda assim, o Ministério Público acusou o juiz de deixar de informar ao Exército a modificação e a existência de registro em nome da antiga dona, com base no artigo 16 da Lei 10.826/2003. O réu respondeu que adquiriu a espingarda de forma lícita, quando estava em vigor anistia a quem registrasse armas de fogo de uso restrito.

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Como é crime modificar características de armas, MP-SP dizia que juiz não informou cano mais curto de forma intencional.
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Ele negou ter conhecimento sobre a antiga proprietária e também sobre o cano serrado, alegando que não havia sinal de adulteração. Disse ainda que abriu processo administrativo para regularizar o artefato, sem qualquer manifestação contrária do Exército.

O caso foi julgado no Órgão Especial por se tratar de ação penal contra magistrado, com sustentação oral do advogado Paulo Rangel do Nascimento.

O relator, desembargador Tristão Ribeiro, disse que o encurtamento da arma foi feito por profissional especializado, que “executou o serviço com perícia, sem deixar vestígios evidentes”, nem mesmo para os diretores do clube de tiro que ganharam a espingarda. O próprio Exército, segundo o relator, não havia constatado a alteração a princípio, pois concedeu a anistia e emitiu parecer favorável ao seu registro.

“Somente após anos da conclusão de referida transferência é que o Exército constatou as irregularidades do procedimento administrativo, tendo, providenciado, então, a apreensão da peça (…). E o réu somente tomou conhecimento de tal circunstância ao obter acesso aos termos da denúncia contra si formulada, sem, jamais, ter sido informado antes a respeito pelo Exército Brasileiro”, afirmou o relator.

Ribeiro disse ainda que o réu ganhou a arma de uma pessoa idônea. “Tampouco o fato de o réu ser juiz de Direito, atirador e colecionador de armas de fogo autorizaria a conclusão de que ele detinha conhecimento suficiente para identificar o encurtamento do cano da peça, pois, como asseverado, essa adulteração fora executado havia muitos anos por um armeiro, que manteve a alça de mira na ponta do cano.”

Assim, o desembargador absolveu o acusado, por falta de provas de conhecimento sobre irregularidades. O entendimento foi seguido por unanimidade.

0086531-12.2011.8.26.0000

* Texto atualizado às 21h25 do dia 17/8/2017 para correção.