Opinião

É preciso um programa educacional sobre os riscos da internet

Autores

  • Luíz Flávio Borges D'Urso

    é advogado criminalista presidente de Honra da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas (Abracrim) e da Academia Brasileira de Direito Criminal (ABDCRIM). Mestre e doutor em Direito Penal pela USP. Conselheiro Federal da OAB e foi Presidente da OAB/SP por três gestões.

  • Luiz Augusto Filizzola D'Urso

    é advogado especialista em Cibercrimes e Direito Digital professor de Direito Digital no MBA da FGV presidente da Comissão Nacional de Cibercrimes da Abracrim (Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas) e coautor da obra "Comentários à Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais".

13 de agosto de 2017, 11h00

A internet é, sem dúvida, uma importante ferramenta do mundo moderno, mas é preciso muita cautela quando se faz uso dela. Não é por acaso que, a cada dia, aumenta a ocorrência de crimes praticados neste espaço da web, são os chamados cibercrimes, que, de certa forma, aparentam proteger o criminoso, todavia, ilusoriamente.

O anonimato na internet é uma falsa sensação, pois, com o avanço da tecnologia, investigações podem detectar a autoria destes crimes. Estas investigações, geralmente, são feitas pelas delegacias de combate a crimes digitais, com policiais habilitados para novas modalidades de investigação.

Existem situações, nas quais, embora a investigação tenha sucesso, detectando a autoria do crime, por vezes, esse autor é um menor de idade, o que resulta em profunda frustração quanto à punição. Atualmente, tem se constatado uma verdadeira onda entre os menores de idade, que se retratam nus e enviam estas fotos a terceiros, por aplicativos de envio de imagens ou mensagens. Estas fotos denominam-se “nudes”.

Infelizmente, em alguns casos, aquele que recebe as imagens, salva as fotos e as repassa para grupos e nas redes sociais, podendo até criar perfis no Facebook e no Instagram, objetivando divulgar estas fotos de nudez, tudo feito, muitas vezes, somente por menores de idade.

Nestes casos, entra-se num beco sem saída, pois, embora a primeira postagem da imagem de “nudes” devesse ficar no âmbito privado, as postagens seguintes ganham domínio público e perde-se totalmente o controle sobre estas fotos.

Caso o autor, que compartilha ou divulga estes “nudes” de menores de idade seja um indivíduo maior de 18 anos, responderá pelo crime previsto no artigo 241-A do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que prevê uma pena de reclusão de 3 a 6 anos para quem oferece, troca, disponibiliza, transmite, publica ou divulga esse tipo de foto, podendo também responder pelo crime de difamação.

Por mais competente que seja a investigação e a respectiva reação, na prática, o que se consegue remover da internet são apenas algumas publicações indevidas dos “nudes”, identificando quem as postou, mas, muitas outras fotos permanecerão espalhadas pela web e armazenadas nos dispositivos de diversas pessoas que as receberam. Aliás, é bom advertir que, o simples fato de um maior, armazenar, sem compartilhar tais fotos de menores, também comete crime, que é previsto no artigo 241-B do ECA, com pena de reclusão de 1 a 4 anos.

A lei estabelece tratamento diferente quando o autor do armazenamento ou do compartilhamento dos “nudes” seja menor de idade. Neste caso, o máximo de consequências que suportará pelas publicações ou armazenamento será uma medida sócio-educativa pelo cometimento de um ato infracional, tudo à luz das previsões também do ECA, que afasta o crime e a pena, justamente por tratar-se de menor. Portanto, existem consequências, embora sejam elas muito brandas.

Apesar de toda essa reação, o problema não estará resolvido, pois estas fotos já em domínio público, é comum a reiteração de seu envio e compartilhamento entre os menores, geralmente conhecidos entre si, integrantes do mesmo colégio, do clube, do bairro, etc.

Novas publicações e novas páginas nas redes sociais com estes “nudes” podem ser criadas com facilidade, reclamando a vigilância permanente da vítima que, a cada nova investida criminosa, terá de tomar providências para diminuir os danos, especialmente psicológicos que suportará.

Pode-se comparar à situação daquele que enxuga gelo, pois, por mais trabalho que tenha, jamais conseguirá seu intento de secar totalmente aquele gelo.  Assim, após o primeiro envio de “nudes” (o que jamais deveria ocorrer), não se controla mais o alcance destas fotos, que poderão ser reproduzidas infinitamente.

As consequências são imprevisíveis. Já se viu notícias de adolescentes, que após a circulação de seus “nudes”, diante do sofrimento suportado em razão do bullying e da vergonha, chegam até ao suicídio.

É por isso que a internet pode ser um beco sem saída para quem está nessa situação, todavia é um beco cuja entrada pode ser evitada. Considerando que estamos falando de jovens adolescentes, frágeis e vulneráveis, que precisam da aceitação do seu grupo, e que são criaturas ainda em formação, há que se reclamar a responsabilidade dos adultos, especialmente dos pais e das autoridades, em preparar estes adolescentes para resistir a tais apelos e modismos.

Por tudo isso, nossa sociedade precisa, urgentemente, de um programa de Educação Digital, não para os adolescentes aprenderem a trabalhar com computadores, pois isso eles já dominam desde tenra idade, mas para alertá-los dos riscos e dos perigos que rondam a internet, reiterando a inexistência do anonimato na web, revelando a eles sobre a falta de controle do que é postado e todos os riscos desta exposição virtual que ganha domínio público.

Quanto aos cibercriminosos adultos, estes se encontram sempre um passo à frente do avanço das investigações, que permanecem em seus “calcanhares”, identificando-os e punindo-os, pois existem ferramentas tecnológicas e legislativas para tanto, sempre em desenvolvimento.

Portanto, o velho ditado “melhor prevenir que remediar”, se aplica também para a Internet, especialmente nestes casos de “nudes”, por adentrar em um universo incontrolável, tanto para o bem, quanto para o mal.

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    é advogado criminalista, mestre e doutor pela USP e presidente da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo.

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    é advogado criminalista do D’Urso e Borges Advogados Associados, membro do Comitê de Estudos sobre Criminal Compliance da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção São Paulo, membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM) e auditor do Tribunal de Justiça Desportiva (TJD) da Federação Paulista de Futebol (FPF).

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