Opinião

Violações contra a advocacia produzem resultados nefastos

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11 de agosto de 2017, 10h11

*Artigo originalmente publicado no jornal Folha de S.Paulo desta sexta-feira (11/8).

Nesses quase 30 anos de vigência da atual Constituição, não foi possível acabar inteiramente com o fosso entre o texto legal e o mundo real. Qual brasileiro nunca se deparou com ironias sobre a distância entre a teoria, o que está no papel, e a prática?

Num cenário de grave crise institucional, chegamos ao nível mais baixo de apreço às normas quando um dos principais órgãos de fiscalização da lei propôs liberar o uso de provas e métodos ilegais de investigação e também a restrição do habeas corpus.

Neste 11 de agosto, Dia da Advocacia, é preciso celebrar o trabalho dos advogados que se empenham, todos os dias, pela aplicação correta da lei, zelando pelo fim do abismo entre o texto e a prática.

É desse esforço cotidiano que resulta a manutenção dos pilares republicanos e democráticos sobre os quais foi reerguido o Estado brasileiro na redemocratização.

Presenciamos, agora, um ministro de Estado defender a prática criminosa de grampear conversas entre advogados e clientes.

É fato que o incentivo dado às violações contra a advocacia surte resultados nefastos. Um episódio recente, e muito triste, foi a morte do advogado catarinense Roberto Caldart, agredido por policiais enquanto atuava em defesa de seus clientes.

Uma das funções da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) é atuar em defesa das prerrogativas profissionais — elas servem, objetivamente, para assegurar os direitos de todos os cidadãos que buscam a Justiça ou são acionados judicialmente.

Cabe repetir à exaustão que não se combate o crime cometendo outro crime. Trata-se de um recado válido para este momento em que são registradas, por exemplo, conduções coercitivas feitas sem que o conduzido sequer tenha sido previamente intimado, como manda a lei.

Os desafios cada vez mais complexos impostos à advocacia exigem do profissional, mais do que nunca, uma formação teórica robusta e multidisciplinar, espírito crítico, rigor ético e solidariedade. Só assim nossa profissão pode fazer frente aos desafios que lhe são impostos.

Por isso, é cobrado alto padrão de qualidade das instituições de ensino e preparo dos bacharéis interessados em exercer a profissão. A sociedade precisa ser servida de forma qualificada.

É orgulho para qualquer advogado integrar a OAB, maior entidade civil brasileira, e representar os mais de 1 milhão de colegas.

A estrutura democrática da ordem permite, por exemplo, consultas como as que realizamos em 2016 e em 2017 sobre a possibilidade do impeachment de Dilma Rousseff e de Michel Temer. Por meio de seus representantes legitimamente eleitos, a quase unanimidade da advocacia concluiu que, nos dois casos, houve crime de responsabilidade.

Trabalhar em favor da lei significa não abrir mão de que toda e qualquer pessoa, seja quem for, tenha acesso à ampla defesa, ao contraditório e ao devido processo legal.

Significa ainda não aceitar que o destino do país seja trilhado de maneira torta sob a batuta de quem não está integralmente compromissado com o interesse público.

O Brasil precisa de líderes acima de qualquer suspeita. As instituições públicas não devem servir de escudo aos que enfrentam acusações.

A advocacia tem mostrado que acredita no Brasil. Por isso, a classe tem trabalhado, por meio da OAB, pelas reformas de que o país precisa, sempre dizendo não à corrupção.

É preciso, por exemplo, uma reforma política radical, uma redução drástica no foro privilegiado e tornar mais efetivo o combate ao desperdício de dinheiro público.

Não se pode aceitar, contudo, a aprovação de reformas a esmo, sem debate, apenas para salvar o grupo que, momentaneamente, está no poder. Isso seria o mesmo que não fazer reforma alguma.

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