Benefícios à empreiteira

Ex-ministro da Fazenda Antônio Palocci é preso em nova fase da "lava jato"

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26 de setembro de 2016, 9h12

O ex-ministro da Fazenda Antônio Palocci foi preso temporariamente nesta segunda-feira (26/9) em uma nova fase da operação "lava jato". Também foram presos o ex-secretário da Casa Civil Juscelino Antônio Dourado e Branislav Kontic, que atuou como assessor na campanha de Palocci a deputado federal em 2006.

De acordo com a Polícia Federal, a suspeita é de que Palocci teria ligação com o comando da empreiteira Odebrecht. A operação investiga se o ex-ministro e outros envolvidos receberam dinheiro para beneficiar a empreiteira em contratos com o governo.

Estão sendo cumpridos 45 ordens judiciais, sendo 27 mandados de busca e apreensão, 3 mandados de prisão temporária e 15 mandados de condução coercitiva nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Bahia, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Distrito Federal. 

A Polícia Federal afirma que há indícios de que o ex-ministro atuou de forma direta a propiciar vantagens econômicas ao grupo empresarial em diversas áreas de contratação com o Poder Público, tendo sido ele próprio e personagens de seu grupo político beneficiados com valores ilícitos. 

Dentre as negociações identificadas, está a que envolve a conversão em lei da Medida Provisória 460, de 2009, que tratava de crédito-prêmio do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), além do aumento da linha de crédito da Odebrecht no Banco de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para um país africano, além de interferência em licitação da Petrobras para a aquisição de 21 navios-sonda para exploração da camada pré-sal.

A Polícia Federal também apura pagamentos efetuados pelo chamado “setor de operações estruturadas” do Grupo Odebrecht para diversos beneficiários que estão sendo alvo de medidas de busca e condução coercitiva. São apuradas as práticas, dentre outros crimes, de corrupção, associação criminosa e lavagem de dinheiro. 

E-mails e anotações
De acordo com o Ministério Público Federal, as evidências de que o ex-ministro atuou em favor dos interesses do Grupo Odebrecht, entre 2006 e o final de 2013, foram obtidas a partir da análise detalhada de e-mails e anotações registradas em celulares apreendidos em outras fases da "lava-jato". Segundo o MPF, Palocci contou com constante auxílio de seu assessor Branislav Kontic. O ex-assessor de Palocci, Juscelino Dourado, também teria atuado no recebimento de propinas.

O MPF identificou que o ex-ministro tratava com a empreiteira assuntos relativos a pelo menos quatro diferentes esferas da administração pública federal: a) a obtenção de contratos com a Petrobras relativamente a sondas do pré-sal; b) a medida provisória destinada a conceder benefícios tributários ao grupo econômico Odebrecht (MP 460/2009) c) negócios envolvendo programa de desenvolvimento de submarino nuclear – PROSUB; d) e financiamento do BNDES para obras a serem realizadas em Angola.

Segundo os investigadores, a atuação do ex-ministro e de Branislav ocorreu mediante o recebimento de propinas pagas pelo grupo empresarial, dentro de um contexto de uma espécie de “caixa geral” de recursos ilícitos que se estabeleceu entre a Odebrecht e o Partido dos Trabalhadores (PT). De acordo com o MPF, uma planilha apreendida durante a operação possibilitou identificar que entre 2008 e o final de 2013, foram pagos mais de R$ 128 milhões ao PT e seus agentes, incluindo Palocci. Os investigadores afirmam ainda que remanesceu, em outubro de 2013, um saldo de propina de R$ 70 milhões, valores estes que eram destinados também ao ex-ministro para que ele os gerisse no interesse do PT.

De acordo com o MPF, a prova colhida aponta na direção de que os valores ilícitos eram repassados a Palocci de forma reiterada, tanto em período de campanha eleitoral quanto fora dele. Por envolver pagamentos reiterados, o extrato dos pagamentos era consolidado em uma planilha — denominada “Posição Programa Especial Italiano” (utilizando-se o termo “italiano” como codinome para se referir ao ex-ministro) — a qual era periodicamente atualizada conforme os valores fossem entregues a Palocci. O MPF afirma que a análise das anotações registradas nesta planilha aponta para o fato de que grande parte dos valores utilizados para o pagamento das vantagens indevidas se originaram da Braskem, empresa petroquímica que possui diversos contratos com a Petrobras.

Os investigadores afirmam que os encontros entre Palocci e executivos da Odebrecht continuaram a ocorrer até maio de 2015, quando a operação "lava jato" já havia sido iniciada. Segundo o MPF, neste período final, as comunicações passaram a ser realizadas de forma mais cautelosa, por meio da utilização de dispositivos criptografados.

Compra de terreno
O Ministério Público Federal afirma que os subornos repassados a Antônio Palocci também envolveram a aquisição do terreno inicialmente destinado à construção da nova sede do Instituto Lula, referido na planilha pela rubrica “Prédio (IL)”.

A partir das provas analisadas, os investigadora encontraram indicativos de que a aquisição do terreno inicialmente destinado ao Instituto Lula foi acertada com o ex-ministro, tendo sido o valor debitado das vantagens indevidas pactuadas.

Foram identificados ainda registros de que, além do repasse de mais de R$ 12 milhões anotados na planilha “Programa Especial Italiano”, vinculados a “IL”, Antônio Palocci participou de reunião com Marcelo Odebrecht e Roberto Teixeira, bem como recebeu, por intermédio de Branislav Kontic, documentos encaminhados via e-mail pelo presidente do grupo empresarial, relacionados à compra do terreno (em mensagens sob o título “Prédio Institucional”, “Prédio do Instituto” e planilha intitulada “Edificio.docx”).

Outra prova analisada se refere à minuta de contrato do terreno encontrada no sítio usado pelo ex-presidente Lula, em que constava José Carlos Bumlai, como adquirente, e representado por Roberto Teixeira. Em depoimento, Bumlai afirmou que se recusou a figurar como comprador do imóvel, tendo sido, de fato, identificado que a compra se deu em favor de pessoas vinculadas à Odebrecht.

Falta de colaboração
Ao justificar o nome desta fase da operação, batizada de omertà, a Polícia Federal afirmou que o atual comando da Odebrecht "se mostra relutante em assumir e descrever os crimes praticados". Procurada, a empreiteira afirmou que não vai se manifestar sobre esta fase da operação.

Em março deste ano, a Odebrecht havia anunciado que seus acionistas e executivos decidiram “por uma colaboração definitiva” com as investigações da operação “lava jato”. O anúncio ocorreu no mesmo dia em que a empreiteira foi alvo de novos mandados de busca e apreensão. Na ocasião, o advogado Nabor Bulhões, que defende Marcelo Odebrecht, afirmou que o objetivo era estimular que funcionários e executivos façam delações premiadas de forma voluntária.

Marcelo Odebrecht está preso desde junho de 2015. No início de março, ele foi condenado a 19 anos e 4 meses de prisão, mais multa de R$ 1,3 milhão, por ter integrado “clube” de empreiteiras que fraudou contratos da Petrobras, segundo o juiz Sergio Fernando Moro. A sentença diz que anotações no celular demonstram que o presidente tinha plena ciência dos atos de corrupção praticados por seus diretores. Outros quatro executivos foram condenados.

Aviso prévio
Neste domingo (26/9), o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, havia adiantado que haveria nova fase da "lava jato" nesta semana. De acordo com o jornal O Estado de S. Paulo, o ministro teria afirmado a integrantes do Movimento Brasil Livre (MBL) que uma nova fase da operação aconteceria nos próximos dias.

"Teve a semana passada e esta semana vai ter mais, podem ficar tranquilos. Quando vocês virem esta semana, vão se lembrar de mim", disse o ministro, de acordo com o jornal. O ministro estava em Ribeirão Preto (SP), onde participou de um ato de campanha do deputado federal Duarte Nogueira, candidato do PSDB à Prefeitura daquela cidade.

Horas após a declaração de Moraes, o Ministério da Justiça divulgou nota em que negou tratar-se de informação privilegiada do ministro em relação às ações da operação. "(A frase) não foi dita porque o ministro tem algum tipo de informação privilegiada ou saiba de alguma operação com antecedência, e sim no sentido de que todas as semanas estão ocorrendo operações", diz a nota do ministério. Segundo a assessoria de imprensa do ministério, a declaração de Moraes sobre a Lava Jato foi "força de expressão".

Ministro da Justiça do governo de Dilma Rousseff, o subprocurador-geral da República Eugênio Aragão criticou neste domingo as declarações de Alexandre de Moraes. Segundo ele, a fala de Moraes mostra que o ministro "é um incapaz ou é irresponsável". 

"Incapaz porque estaria a brincar com coisa séria. Um ministro não pode se manifestar de empolgação em campanha, entregando ao público assuntos sigilosos de sua pasta", afirmou. "Ou irresponsável, porque, no momento em que vivemos, autoridades públicas não devem provocar clamores. Devem, isto sim, acalmar a população." 

Para Aragão, a declaração de Moraes "dá margem à suspeita de que ele, governo, e a Lava Jato, estão agindo de comum acordo com finalidade política". "Fico só imaginando se, quando ministro, eu desse uma declaração desse teor, o que aconteceria. O mundo vinha abaixo", afirmou.

*Notícia alterada pela última vez às 9h50 do dia 26/9 para acréscimos.

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