Luto no Direito

Cachapuz honrou como ninguém a consultoria jurídica do Itamaraty

Autor

  • Valerio de Oliveira Mazzuoli

    é professor-associado da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) pós-doutor em Ciências Jurídico-Políticas pela Universidade Clássica de Lisboa doutor summa cum laude em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e advogado em Mato Grosso São Paulo e Distrito Federal.

16 de setembro de 2016, 15h01

Às 7h da manhã desta sexta-feira (16/9) recebi um telefonema dando notícia, em primeira mão, do falecimento do meu mestre e amigo professor Antonio Paulo Cachapuz de Medeiros. Não acreditei! Mas era, infelizmente, verdade. Perdi, portanto, aquele que me acompanhou durante toda a minha trajetória acadêmica, desde os bancos da graduação até o meu mestrado (Unesp) e doutorado (UFRGS). Por ele eu nutria a maior admiração e, de sua parte, me tratava como pupilo. Me senti realmente vazio. De saída para a universidade, quase não consegui dirigir e, consequentemente, dar a minha aula. Um dia, em suma, muito triste para mim!

Cachapuz honrou como ninguém a Consultoria Jurídica do Itamaraty durante quase 20 anos (só perdendo para Clóvis Beviláqua, que ficou 28 anos na Consultoria Jurídica). Ainda, para a honra do país, foi eleito juiz do Tribunal do Mar, com sede em Hamburgo, Alemanha (para onde viajaria neste sábado!).

Nos vimos pela última vez, há poucos meses, em Fortaleza, e lá, para a minha surpresa, num jantar muito reservado, me convidou para substituí-lo na Consultoria Jurídica do Itamaraty, de onde já se despedia para assumir a judicatura internacional. Lembro-me, com toda a riqueza de detalhes, o seu olhar fixo em mim, dizendo: “Não escolherei outro! Te acompanho há tantos anos, conheço o que escreves, os estudos de direito internacional que publicou, e serás, portanto, meu sucessor!”. Por motivos pessoais (uma mãe com 81 anos que depende de mim em Cuiabá, um escritório de advocacia recém inaugurado em Brasília, aberto com o dispêndio de um razoável investimento e, ainda, uma vida acadêmica que seria — segundo o próprio mestre — praticamente interrompida em razão do trabalho!) não pude aceitar. Mas a confiança em mim depositada, para muito além da amizade que nos unia, me marcará para sempre!

Também em Fortaleza combinamos de escrever um livro em coautoria, que seria intitulado Direito das Relações Internacionais, em que ele resgataria toda a sua experiência no Ministério das Relações Exteriores junto a uma parte minha sobre a aplicação do Direito Internacional no Brasil. Seria a nossa primeira coautoria, agora também interrompida.

Hoje, portanto, é um dia triste para o Direito Internacional no Brasil, particularmente para mim. Estão nos deixando aqueles que construíram o Direito Internacional em nosso país, e que, sobretudo, eram JURISTAS com todas as maiúsculas, como atualmente não mais se vê, infelizmente. Que suas lições, contudo, continuem a ecoar no Direito brasileiro e que nós, seus amigos, não deixemos morrer a obra que ele, durante anos e anos, duramente construiu e que, talvez, pouco se valorizou.

Que Deus o receba, Professor Cachapuz, de braços abertos no céu!

Saudades sem fim do amigo de sempre.

Autores

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    é pós-doutor pela Universidade de Lisboa, doutor summa cum laude em Direito Internacional pela UFRGS, professor da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e sócio do escritório Mazzuoli & de Pieri Advocacia.

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