Reflexões Trabalhistas

Controle do conteúdo das normas coletivas autônomas pelo Judiciário Trabalhista

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9 de setembro de 2016, 8h01

A forma ideal de solução dos conflitos entre empregados e empregadores é denominada autocomposição, que significa a solução pelas próprias partes envolvidas no conflito, sem a interferência de um terceiro, isto é, a produção de uma norma coletiva autônoma. Tecnicamente esta forma de solução direta expressa-se pelo acordo coletivo de trabalho (quando envolve uma ou algumas das empresas da categoria ), ou a convenção coletiva de trabalho (quando envolve a totalidade da categoria ).

E assim é porque são os protagonistas do conflito quem melhor conhece seus detalhes, seus reflexos e a capacidade da parte contrária de resistir e ceder no processo de negociação, motivadamente. Com efeito, a visão que tem o terceiro sobre o problema a ser resolvido é sempre menos rica do que aquela que detêm as partes e, portanto, não raro a solução por ele encontrada é insatisfatória.

Assim, nosso ordenamento jurídico privilegia a autocomposição dos conflitos coletivos no âmbito do trabalho, com o reconhecimento das convenções e acordos coletivos pelo inciso XXVI, do artigo 7º da Constituição Federal, além do próprio texto constitucional permitir negociação coletiva sobre as garantias de salário e duração da jornada de trabalho, como decorre do mesmo dispositivo. Tudo isto aponta no sentido da nossa afirmação de que a negociação direta dos conflitos do trabalho merece o privilégio de nosso ordenamento jurídico.

Indaga-se a propósito, então, o motivo pelo qual os tribunais trabalhistas interferem no conteúdo de alguns acordos e convenções coletivas, não reconhecendo validade a algumas cláusulas ajustadas, mesmo quando tais instrumentos são celebrados formalmente de acordo com as regras legais aplicáveis? Num primeiro olhar pode sugerir uma interferência indevida. Mas o tema merece alguma reflexão para buscar a compreensão deste fenômeno.

A questão central refere-se ao modelo escolhido para a nossa representação sindical. Escolheu o legislador do Estado Novo, e resiste até os dias de hoje, o modelo da unicidade sindical, que significa a existência de um único sindicato representativo de uma dada categoria, em cada base territorial. 

Este modelo opõe-se ao modelo da pluralidade sindical, que significa a existência lícita de tantos sindicatos quanto desejarem os interessados, e que representam somente os associados em cada localidade. Opõe-se também o modelo aqui escolhido à idéia da unidade sindical, hipótese em que também só há um sindicato por categoria, mas por decisão dos interessados, e não por imposição legal.

Sucede que nosso modelo, da unicidade sindical, dá ao sindicato a representação de toda a categoria, independentemente do número de pessoas associadas. Assim, temos com muita frequência um sindicato com apenas uma centena de sócios, mas com a representação de alguns milhares de pessoas. 

Basta meditar um pouco sobre este modelo de organização para concluir que nem sempre a vontade expressa pela direção sindical coincide com a vontade da maioria dos representados, embora possa coincidir com a vontade dos associados. Eis, a nosso ver, a razão preponderante para que a jurisprudência trabalhista, mesmo reconhecendo a autocomposição dos conflitos com modo ideal de solução, veja os acordos e convenções coletivas com certa reserva.

Encontrando-se a grande maioria dos integrantes da categoria alheia ao processo de negociação e à solução alcançada, esta em muitos casos não representa uma negociação de benefícios, ou uma melhoria às condições de trabalho, sendo rejeitada quando questionada em juízo.

Eis o motivo da interferência do Judiciário Trabalhista no conteúdo de algumas negociações coletivas, e que não se mostra indevida, com poderia parecer. Nosso problema a resolver não é a forma de solução dos conflitos coletivos, ou eventual crivo judicial, mas sim a estrutura sindical brasileiras, que não assegura a excelência das soluções propostas aos conflitos coletivos do trabalho.

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