Opinião

É ilegal sacrificar salário de servidores por discurso orçamentário

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30 de outubro de 2016, 9h16

Os servidores do Executivo do Distrito Federal estão desapontados com o anúncio do governador Rodrigo Rollemberg de que não honrará o pagamento dos reajustes salariais. Diversos sindicatos prometem revidar com paralisações ante a ameaça de corte de ponto.

Vale lembrar que, em 2015, para acabar com as greves deflagradas pela maioria do funcionalismo público distrital, os servidores “aceitaram” proposta do Executivo de adiar os pagamentos dos reajustes para outubro de 2016. Também é importante lembrar que esse acordo ocorreu muito próximo à decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal que julgou válidos todos esses aumentos, pois foram judicialmente questionados pelo Ministério Público.

No entanto, mesmo diante de acordo firmado com a categoria e de decisão judicial, o governador alega que não terá dinheiro para pagar os reajustes principalmente por conta de suposta redução no repasse de verbas federais e do limite de gasto com pessoal imposto pela Lei de Responsabilidade Fiscal.

Claro que impressiona a justificativa da falta de dinheiro nesse cenário de crise, contudo a legislação orçamentária há muito tempo prevê ferramentas para contornar esse tipo de problema, mas parece faltar aptidão do governo usá-las.

Por exemplo, em vez de prejudicar os servidores efetivos, o governador deveria cumprir sua promessa de campanha bem como a determinação da Constituição da República, pois esta ordena o corte mínimo de 20% de servidores comissionados (cuja moralidade na escolha é muito questionada para os órgãos do Distrito Federal).

Mas levantamento divulgado pelo próprio governo em julho de 2016 demonstra um percentual de 41,09% de comissionados sem vínculo efetivo, ao passo que, em 2015, era de 38,57%. Da mesma forma, quando anunciou um corte de comissionados sem vínculo efetivo, aumentou a expectativa de gastos com a criação de funções de confiança para servidores com vínculo.

A correção de desvios também é outro princípio de gestão privilegiado pela Lei de Responsabilidade Fiscal que não vem sendo observado pelo governo, pois pressupõe a adoção de medidas inteligentes e menos drásticas para o reestabelecimento do equilíbrio das contas públicas. Isso porque a restrição que o governo quer impor aos reajustes não parece ter sido precedida da economia com gastos supérfluos de 2016, já que o gasto bruto com publicidade só do último trimestre é maior que R$ 16 milhões e os dispêndios com a realização de 10 partidas da Olimpíada foram de aproximadamente R$ 30 milhões.

O mesmo problema ocorreu ano passado, quando o governo quis parcelar o salário dos servidores, pois, concomitantemente, abriu crédito suplementar de quase R$ 800 mil para, entre outras finalidades, publicidade e propaganda, de cerca de R$ 1,6 milhão para o apoio de eventos, além do Orçamento de Dispêndio da Companhia Imobiliária de Brasília, com destinação de R$ 2 milhões para atividades de comunicação e marketing e R$ 22 milhões para publicidade e propaganda.

Fato é que, sem uma justificativa razoável e sem o prévio uso das medidas de gestão fiscal, o pretendido “sacrifício” dos salários dos servidores é ilegal.

Nesse cenário, de um lado, os servidores podem buscar a Justiça para cobrar o pagamento integral e tempestivo da remuneração reajustada por Lei, conforme assegura a Lei Orgânica do Distrito Federal e inúmeras decisões do TJ-DF.

De outro, mesmo com os transtornos causado aos administrados, a Lei de Greve (7.783/1989) assegura aos servidores públicos o direito de paralisarem suas atividades, sob dois aspectos: descumprimento do acordo de 2015 por parte do governo e falta de pagamento de salários (o reajuste).

Embora o governo do Distrito Federal tenha anunciado o prematuro corte de ponto dos eventuais grevistas, clara medida antissindical para barrar o exercício de um direito legítimo, a Câmara Legislativa do Distrito Federal “derrubou” o decreto que previa tal medida. E se o governo insistir com isso, o entendimento do Supremo Tribunal Federal (MI 708) pode proteger os servidores contra a perda salarial em razão do desrespeito do quanto foi negociado com a categoria.

Ao agir ilegalmente para não “quebrar Brasília”, o governador ignora que o “rombo” nas contas públicas será muito maior se não houver o pagamento dos reajustes, seja por conta das prováveis derrotas judiciais do governo, seja pela paralisação indeterminada dos serviços públicos, inclusive os de arrecadação.

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