Suporte a Litígios

Tecnologia potencializa o conhecimento que está em sua cabeça

Autor

  • Marcelo Stopanovski

    é diretor de produção da i-luminas – suporte a litígios especializada em análise de quebras judiciais de sigilos. Doutor em Ciência da Informação pela Universidade de Brasília mestre em Inteligência Aplicada na Engenharia de Produção e Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina.

19 de outubro de 2016, 13h11

Spacca
Existe uma discussão teórica dentro da Ciência da Informação sobre se é possível gerir conhecimento ou somente a informação.

Explico: para alguns, a informação é o elemento a ser gerido, o que é palpável, o que pode ser quantificado, medido, positivado; já o conhecimento seria um elemento próprio da formulação íntima humana, uma capacidade evolutiva superior, um processo mental de cada indivíduo. Em resumo: temos determinado conhecimento, mas quando vamos explica-lo, só conseguimos passar informações.

Acho mais interessante considerar o conhecimento como mais um tipo de informação. A informação que, contextualizada a partir dos dados esparsos, serve para a tomada de decisões. Sigo a separação didática de Dados à Informação à Conhecimento, já citada em uma coluna anterior sobre o escritório jurídico como uma unidade de produção de informação(ões).

Partindo deste pressuposto teórico a coluna de hoje reflete sobre questões do cotidiano dos escritórios e de qualquer organização na ‘era do conhecimento’.

A situação é conhecida: um advogado que trabalhou anos no escritório, atuou e liderou causas estratégicas e produziu diversas peças em vários processos, resolve sair da banca, montar a sua ou se incorporar a outra. Neste momento fica claro o que é o capital intelectual do escritório, pois dentro da cabeça deste advogado geralmente e, talvez também em seu HD portátil, vai embora junto parte da memória da banca.

Um escritório jurídico é uma unidade de processamento de informações. Nele entram informações dadas por clientes ou colhidas pelos advogados, então ocorrem uma série de processos de transformação destas informações e novas são geradas, saindo de uma linha de produção intelectual os produtos do escritório, as peças processuais, contratos, pareceres e tudo mais que se possa chamar de objetos informacionais.

Há duas décadas, mais ou menos, uma dupla de professores, Nonaka e Takeuchi, escreveu um livro, hoje um clássico, sobre como as empresas japonesas criavam inovação e identificou processos que ficaram conhecidos como a Gestão do Conhecimento. Hodiernamente esta cadeira pode ser encontrada facilmente em cursos de Administração de Empresas, Ciência da Informação e Engenharia de Produção.

Um dos legados da dupla citada foi um quadro didático de conversão dos tipos de conhecimento construído para nortear estratégias de absorção daqueles conhecimentos que eram perdidos na cabeça dos colaboradores e que eram ativos intangíveis, mas valiosos, da organização.

No quadro abaixo o conhecimento é dividido em tácito e explícito. Em resumo tácito é o que não foi positivado, é o que é falado, pensado, que está na cabeça dos colaboradores, na própria cultura do grupo e complementaridade ao explícito, que é o que está escrito, gravado, publicado.

Fonte: Adaptado de Nonaka e Takeuchi [1]

Quando dois advogados se encontram na hora do café e comentam seus casos, acontece ali o que se chama de socialização do conhecimento, a união do conhecimento tácito de um com o do outro. É uma maneira de fazer o conhecimento do escritório fluir de uma cabeça para outra, aumentando a capacidade de que o grupo esteja ciente do todo e aumente a chance de que este conhecimento não seja perdido. Neste momento o conhecimento é do tipo compartilhável, fluido.

Em um outro momento do cotidiano do escritório, quando o advogado escreve uma peça, por exemplo, acontece a externalização do conhecimento, a migração do tácito que está na cabeça para o texto que é explicitado. Este tipo de conhecimento é conceitual, definindo assuntos.

Quando da união dos conceitos, da utilização dos textos já produzidos em outros novos, ocorre a conversão chamada de combinação, a qual gera o conhecimento sistêmico, o conhecimento que representa a memória organizacional palpável.

Finalmente, quando um advogado lê uma peça ou estuda um parecer já produzido, por exemplo, ele está internalizando o conhecimento explicitado, transformando seu entendimento em mais um conhecimento tácito. Esta ação trabalha o conhecimento do tipo operacional, responsável pela capacidade de aprendizado do grupo.

Estas conversões ocorrem o tempo todo dentro do escritório de maneira natural, formando uma espiral constante de aprendizado e produção de conhecimento.

Ocorre que estes processos podem ser potencializados pela ecologia cognitiva. Deve-se este termo a Pierre Levy [2] que no livro, também um clássico, As Tecnologias da Inteligência, refletiu que a absorção e produção de conhecimentos podem ser potencializadas pelo ambiente.

Imagine um escritório com ambiente climatizado, cadeiras confortáveis e silencioso. Neste local a produção e absorção do conhecimento são, por obvio, potencializadas. Mas imagine que cada advogado tenha duas ou três telas, que seu computador esteja bem configurado, que o link de internet seja rápido e que seu ‘Word’ seja a última versão. Isso seria uma nova camada de potência à produção e absorção, essa camada digital, esse ambiente da rede, que facilita as conexões entre as informações é o que Levy se referiu como uma nova ecologia cognitiva.

Se pensarmos em que o local do “café” na rede pode se das nos ‘feeds’ (notícias distribuídas para grupos de um caso, por exemplo) ou que o Facebook e o Twitter podem nos dar informações sobre a própria atuação do escritório, teremos uma multiplicação de possibilidades de conversão dos conhecimentos.

A pergunta sobre onde está o melhor modelo para tal tipo de peça frequentemente usada pelo escritório pode ser resolvida com a utilização de sistemas de gestão de conteúdo, como o SharePoint da Microsoft, citado em uma coluna sobre escritórios na nuvem. Este sistema, que transcende a antiga árvore de pastinhas nos diretórios nas redes, por exemplo pode gerenciar os modelos de peças e manter todos no escritório cientes, por meio de notícias, até automáticas, sobre as últimas alterações realizadas.

A lista de discussão por e-mails se transformou nos grupos do WhatsApp, mas as duas ferramentas tratam de potencializar a absorção e a produção do conhecimento, o tema de interesse da Gestão do Conhecimento.

Fazer rodar a espiral de conversão de conhecimentos com apoio da tecnologia da informação, pode significar uma redução de prejuízos na próxima vez que um colaborador de seu escritório alçar novos voos.

*Informe: Nesta e na próxima quarta-feira (19 e 26/10) estarei, às 19h, com alunos da graduação da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília realizando um minicurso sobre estes nossos assuntos aqui da coluna, tecnologias para suporte a litígios. A iniciativa é do Professor de Criminologia e Processo Penal Evandro Piza.

[1] NONAKA, Ikujiro; TAKEUCHI, Hirotaka. Criação de conhecimento na empresa: como as empresas japonesas geram a dinâmica da inovação. Rio de Janeiro: Campus, 1997.

[2] LÉVY, Pierre. As tecnologias da Inteligência – O futuro do pensamento na era da informática. São Paulo: Editora 34, 1993.

Autores

  • é bacharel em Direito, especialista em Gestão de Sistemas de Informações e, atualmente, mestrando em Mídia e Conhecimento pela Engenharia de Produção da UFSC. Orientado pelo Professor Hugo Hoeschl, Dr..

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