Opinião

Há prepotência e onipotência daqueles que deveriam prezar pelas leis

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11 de outubro de 2016, 11h29

*Texto originalmente publicado como editorial na edição desta terça-feira (11/10) do jornal Folha de S.Paulo.

Pelas boas razões que se conhecem, têm crescido no Brasil o prestígio e a credibilidade de instituições como o Judiciário, o Ministério Público e a Polícia Federal. Seu ativismo e sua influência no cenário político, contudo, parecem cada vez mais trazer consigo o risco de desfigurar-se em atitudes salvacionistas ou prepotentes.

O noticiário dos últimos dias oferece exemplos lamentáveis dessa exaltação na subjetividade de atores sociais aos quais cumpre, acima de tudo, manter o equilíbrio de julgamento e o respeito à lei.

A pedido de um delegado da PF e contando com a anuência de uma procuradora da República no Distrito Federal, uma juíza de primeira instância em Brasília determinou a quebra do sigilo telefônico de um jornalista da revista Época, que havia publicado reportagem sobre uma lista de correntistas brasileiros num banco suíço.

A relação constava de relatório sigiloso do Conselho de Controle das Atividades Financeiras (Coaf). A lei prevê punições aos responsáveis por vazamentos desse tipo.

Convocado pelas autoridades, o jornalista recusou-se a revelar suas fontes. Seu silêncio é garantido pela Constituição; trata-se de princípio adotado em qualquer democracia, no intuito de proteger o exercício dessa profissão. Violá-lo seria fazer da imprensa não um representante do interesse público, mas linha auxiliar das forças policiais.

Zelar pelos segredos sob sua guarda é dever do Estado. À imprensa cabem outros papéis, entre os quais lutar pela transparência em assuntos republicanos.

Enquanto se tenta romper o sigilo telefônico de um jornalista, projeta-se do Ministério Público Federal uma bizarra iniciativa contra a liberdade de expressão.

Um cartaz aparece no portão de um colégio no Rio de Janeiro. Dizia "Fora, Temer". Indignado, o pai de um aluno pede providências. Num equivocado acesso de partidarismo, a diretora da instituição diz concordar com o teor da faixa. Não se tratava disso, evidentemente, mas de garantir o direito dos alunos à livre expressão.

O MPF solicita o enquadramento dos funcionários da escola em delitos administrativos e a retirada dos cartazes. É censura, e das mais ridículas, haja vista a disseminação de tais mensagens.

Também a internet está na mira. A fim de retirar do ar uma simples página que continha ataques a um candidato à Prefeitura de Joinville, um juiz eleitoral ameaçou suspender as atividades do Facebook por 24 horas, o que prejudicaria milhões de usuários da rede no país.

Quando se abandonam o senso de proporção e o respeito aos pilares da democracia, o desequilíbrio e a onipotência surgem como verdadeira patologia dos responsáveis pela guarda da lei e da justiça.

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