Consultor Jurídico

Padre não deve ser réu por associar espiritismo ao demônio, diz STF

29 de novembro de 2016, 20h44

Por Redação ConJur

imprimir

Não cabe ao Poder Judiciário censurar manifestações religiosas de pensamento, mesmo que infelizes, pois o livre exercício de consciência, crença e culto integra as garantias constitucionais. Assim entendeu a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal, nesta terça-feira (29/11), ao decidir pelo trancamento de ação penal contra o monsenhor Jonas Abib, fundador da comunidade Canção Nova.

O Ministério Público da Bahia acusou o sacerdote de incitação à discriminação religiosa em trechos do livro Sim, Sim, Não, Não – Reflexões de cura e libertação. Na obra, Abib afirma que o demônio “hoje se esconde nos rituais e nas práticas do espiritismo, da umbanda, do candomblé […]” e que “o espiritismo é como uma epidemia e como tal deve ser combatido: é um foco de morte”. O autor defende a queima de livros e de imagens.

Para o MP-BA, um problema relevante é que o livro teve mais de 400 mil exemplares vendidos e chegou à 85ª edição em 2007. A obra chegou a ser recolhida em 2008 por ordem da Justiça da Bahia. 

A defesa afirmou que as declarações tinham a intenção de evangelizar, sem representar discurso de ódio contra as religiões citadas. Em sustentação oral, o advogado do padre disse que a publicação é destinada a convencer católicos hesitantes, aqueles que também recorrem ao espiritismo ou à umbanda.

O relator do caso, ministro Edson Fachin, declarou que defende o respeito a todas as crenças, mas disse que declarações infelizes sobre crenças de terceiros fogem ao espectro de atuação do estado-juiz.  “Liberdade de religião é a liberdade de acreditar e de fazer proselitismo em um ou outro sentido”, disse ele.

Fachin entendeu que os trechos citados, ainda que façam comparações incômodas, não configuram o tipo penal previsto no artigo 20 da Lei 7.716/1989 — que pune a prática, indução ou incitação à “discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”. Para o ministro, há uma tentativa de demonstrar a superioridade da religião católica com vistas a um resgate ou salvação de terceiros, mas não de sua subjugação.

“Apesar de as afirmações serem indiscutivelmente intolerantes, pedantes e prepotentes, entendo que elas encontram guarida na liberdade de expressão religiosa e, em tal dimensão, ainda que reprováveis do ponto de vista moral e ético, não preenchem o âmbito proibitivo da norma penal incriminadora”, escreveu o relator.

Único a divergir, o ministro Luiz Fux entendeu não ser caso de trancamento da ação penal. Já os ministros Rosa Weber, Marco Aurélio e Luís Roberto Barroso acompanharam o relator.

Em junho, Fachin havia rejeitado pedido da defesa para atribuir efeito suspensivo a recurso contra decisão do Superior Tribunal de Justiça que, ao rejeitar Habeas Corpus lá impetrado, negou o trancamento da ação penal. O ministro concluiu, na ocasião, que a medida era reservada aos casos de evidente constrangimento ilegal. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

RHC 134.682