Parentes vetados

Senado aprova novo programa de regularização de ativos no exterior

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24 de novembro de 2016, 10h11

O plenário do Senado aprovou nesta quarta-feira (23/11) o projeto de lei que reabre o prazo para a regularização de recursos mantidos por brasileiros no exterior sem a devida declaração à Receita Federal. O texto foi aprovado na forma da emenda substitutiva do senador Romero Jucá (PMDB-RR) e segue agora para a Câmara dos Deputados.

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Projeto de Romero Jucá aumenta em 4% as alíquotas totais da regularização de ativos

O projeto estabelece que os recursos poderão ser legalizados mediante o pagamento de 17,5% de Imposto de Renda e mais 17,5% de multa (no programa anterior, as alíquotas eram de 15%), desde que eles sejam de origem comprovadamente lícita. O novo prazo será de 120 dias, contados 30 dias após a publicação da lei.

O ponto mais polêmico do texto era o trecho que estabelecia a permissão para que parentes de políticos pudessem aderir ao programa. A proposta inicial de Romero Jucá previa a permissão, que foi justificada pelo senador pelo fato de que os donos do dinheiro terão que comprovar a origem e licitude dele.

"Os parentes estão sendo liberados desde que provem que têm patrimônio de origem distinta dos políticos. Exatamente porque o que estava se fazendo, na verdade, era uma penalidade a pessoas que em tese não tinham nenhuma relação econômica com esses políticos. Para dar um exemplo: o irmão do Fernandinho Beira Mar em tese poderia declarar. Um sobrinho do Eduardo Suplicy, que é vereador de São Paulo, não poderia declarar porque é parente de um vereador”, explicou.

No entanto, uma emenda do senador Humberto Costa (PT-CE) foi aprovada por aclamação no plenário para retirar a permissão de que parentes de políticos possam aderir ao programa de repatriação. O temor era de que recursos ilegais oriundos de esquemas de corrupção e enviados ao exterior pudessem ser legalizados.

“Temos que ter cuidado. Sabemos que todo cidadão brasileiro não pode, por razões de parentesco, ser prejudicado. Ele é um cidadão como outro qualquer. No entanto, nesse momento, efetivamente, que estamos vivendo e nas condições em que não haja a possibilidade efetiva de comprovação de origem absolutamente lícita, no meu modo de ver, é um equívoco, um erro. Essa emenda está sendo chamada por aí afora de emenda Cláudia Cruz, a mulher do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ)”, alegou o líder petista.

Divisão com estados e municípios
Outra questão que estava pendente no projeto original era a previsão de divisão do valor arrecadado com as multas com estados e municípios. O presidente Michel Temer (PMDB) fechou acordo com os governadores para repassar aos estados parte do dinheiro arrecada com as multas do programa de regularização de ativos no exterior, instituído pela Lei 13.254/2016.

Os valores eram objeto de disputa no Supremo Tribunal Federal. A União já tinha repassado a estados e municípios o dinheiro recolhido com o Imposto de Renda, mas os governadores defendiam também o direito à divisão dos recursos arrecadados com as multas.

O montante, segundo os governadores, é de cerca de R$ 5,2 bilhões, dos R$ 46,8 bilhões obtidos com a "repatriação". De acordo com Raimundo Colombo (PSD), governador de Santa Catarina, o acordo fechado prevê que os estados retirem as ações reivindicando o repasse que tramitam no STF.

Inicialmente, o senador Romero Jucá tinha estabelecido que a multa iria integralmente para o governo federal, que posteriormente repartiria os recursos com os executivos estaduais e municipais, segundo acordo firmado pelo presidente Michel Temer.

No entanto, após intensa pressão do plenário do Senado, o senador incluiu em seu substitutivo a previsão de que 46% dos recursos arrecadados com as multas serão destinados aos entes federados, de acordo com os critérios dos fundos de Participação dos Estados e Municípios.

Reforço no caixa
Encerrado em 21 de outubro, o programa de regularização de ativos não declarados no exterior arrecadou R$ 48,8 bilhões de Imposto de Renda e multa. Inicialmente, a Receita Federal informou que esse montante era de R$ 50,9 bilhões, mas o dado foi retificado.

O regime, instituído pela Lei 13.254/2016, proporcionou a regularização de R$ 169,9 bilhões, sendo R$ 163,9 bilhões de pessoas físicas e R$ 6,06 bilhões de pessoas jurídicas. Com alíquota de IR de 15% e multa de 100% desse valor — totalizando uma taxação de 30% sobre os valores mantidos ilegalmente em outros países —, o Fisco obteve uma adesão maior do que à do programa semelhante aplicado nos EUA, de acordo com o secretário da Receita, Jorge Rachid.

Empolgado com o sucesso do programa, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), anunciou que vai apresentar um projeto de lei para reabrir o prazo para que pessoas que têm recursos não declarados no exterior possam repatriar o dinheiro pagando imposto e multa.

A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal, concedeu liminares favoráveis aos estados do Piauí e Pernambuco, que estão pedindo para ficar com parte do que o governo federal ganhou com a multa paga pelos contribuintes para regularizar os recursos não declarados fora do país. Posteriormente, o entendimento foi estendido a mais 16 estados.

Programa polêmico
O programa de regularização de ativos no exterior gerou polêmica no mundo jurídico. Alguns consideraram que a medida anistiava quem desrespeitou a lei. O desembargador federal Fausto De Sanctis disse que a norma “merece censura porquanto subverte valores democráticos de uma sociedade que, sem perceber, permite o reingresso de valores ilícitos outrora sonegados”.

Nessa mesma linha, o juiz responsável pelo braço da operação “lava jato” no Rio de Janeiro, Marcelo Bretas, afirmou que a medida “é um insulto para quem paga imposto”. Além disso, houve quem considerasse que a alíquota do IR e da multa coibiriam a adesão ao programa.

O tributarista Luiz Gustavo Bichara, por sua vez, destacou que outro ponto que deveria ser reajustado é a necessidade de comprovação da licitude da origem dos recursos, algo que em muitos casos ele classifica como “impossível”.

Além disso, criminalistas avaliaram que, ao sancionar a Lei 13.254/2016, a então presidente Dilma Rousseff foi contra um dos pilares do direito de defesa: a presunção da inocência. A presidente vetou o dispositivo que exigia o trânsito em julgado para impedir que pessoas condenadas em ações penais fossem beneficiadas pela lei.

Esse veto vai contra a Constituição, a lei e todos os tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, segundo o criminalista Augusto de Arruda Botelho, conselheiro do presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD). “Uma condenação criminal só pode ser considerada para fins legais com trânsito em julgado. O veto causa espanto, pois qualquer estudante de Direito saberia que o que está sendo feito é inconstitucional”, critica Botelho.

O tributarista Marcelo Knopfelmacher concorda que o veto é claramente inconstitucional e aponta que a supressão do trecho vai agitar os tribunais, “pois abre espaço para que a questão seja levada para discussão em juízo”. Com informações da Agência Brasil.

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