Dinheiro em caixa

2ª Turma do STF concede liminar e garante repasse financeiro ao TJ-RJ

Autor

22 de novembro de 2016, 21h16

A 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal concedeu liminar para que o governo do Rio de Janeiro repasse os duodécimos ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Os valores são correspondentes às dotações orçamentárias até o 20º dia de cada mês.

Apesar da liminar, o repasse pode ser menor do que o valor integral previsto para o TJ-RJ, pois a decisão garante ao Executivo fluminense a possibilidade de descontar 19,6% da receita corrente líquida prevista na Lei Orçamentária Anual estadual (Lei 7.210/2016). O percentual corresponde ao déficit na arrecadação projetado até dezembro.

A decisão foi tomada no julgamento de medida cautelar no Mandado de Segurança 34.483, impetrado pelo TJ-RJ. O relator do caso, ministro Dias Toffoli, destacou em seu voto que, segundo informações do governo do RJ, a receita corrente líquida registra déficit de 18,82% no quinto bimestre, se comparada ao orçamento definido na Lei Orçamentária Anual.

O valor totaliza R$ 10 bilhões, com projeção de aproximadamente R$ 12 bilhões em dezembro. “É uma frustração de arrecadação de praticamente 20%”, ressaltou o ministro. Toffoli afirmou também que, depois de impetrado o Mandado de Segurança, foi sancionada a Lei estadual 7.483/2016, que reconhece o estado de calamidade pública na administração financeira do estado.

Ele ponderou, no entanto, que o TJ-RJ colabora com as dificuldades financeiras do estado ao conceder empréstimo ao Executivo e firmar convênio que permitiu acesso aos depósitos judiciais pela administração estadual. Segundo Toffoli, em decisões recentes, o STF passou a relativizar a necessidade de se adequar a previsão orçamentária à receita efetivamente realizada pelo Executivo para fins do repasse dos duodécimos aos demais Poderes e órgãos autônomos, sob risco de se chegar a um impasse em sua execução.

No precedente citado pelo ministro (MS 31.671), o Plenário determinou, de forma semelhante, o desconto do déficit na arrecadação no repasse dos duodécimos. A decisão ressalva, além da possibilidade de compensação futura, a revisão do que foi decidido caso não se demonstre a queda no recolhimento de impostos alegada pelo estado ou não se confirme o déficit projetado. Essas informações devem constar em um relatório que o Executivo se comprometeu a encaminhar à Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro em até 30 dias da publicação da lei que reconheceu o estado de calamidade.

Em grupo
Dias Toffoli afirmou que decidiu levar a liminar à turma por causa da gravidade da situação financeira do Rio de Janeiro e tendo em vista outros casos que já chegaram ou que devem chegar ao STF sobre o tema. “A matéria ora sob análise é complexa e sua condução reclama o diálogo entre Poderes e órgãos autônomos, a fim de se tentar chegar a uma solução conciliatória para o quadro revelado pelas dificuldades declaradas pelo estado do Rio de Janeiro em suas finanças, agravada pela queda na arrecadação prevista no orçamento de 2016 não apenas no referido estado-membro, mas quiçá na quase totalidade dos entes da federação brasileira.”

O ministro adverte ainda que, no tocante aos duodécimos do meses de novembro em diante do TJ-RJ, os repasses deverão respeitar a decisão na liminar, “devendo ser paralisada qualquer medida restritiva nas contas do Tesouro do Estado do Rio de Janeiro e de suas autarquias determinada por autoridade judiciária distinta do STF”.

Situação complicada
O governo do Rio de Janeiro está em maus lençóis. Apesar de enviar projetos à Alerj para reduzir gastos e promulgar decretos com o mesmo objetivo, algumas das propostas já estão sendo barradas na Justiça. Uma delas é o desconto de até 30% no salário dos servidores estaduais para equilibrar a Rio Previdência.

O projeto, que aumenta a contribuição previdenciária, prevê uma alíquota suplementar de 16% para todos os servidores. Esse adicional, em alguns casos, comprometeria 30% do salário dos funcionários públicos, mesmo os que ganham menos de R$ 5,1 mil, atualmente isentos da taxa. O desconto extra, que duraria por 16 meses, também valeria para aposentados e pensionistas.

Para o desembargador Custódio de Barros Tostes, que suspendeu a tramitação do PL 2241/2016 na Casa legislativa, o alto comprometimento salarial que será imposto em caso de aprovação é preocupante. “Sem que se adentre em demasia o mérito da causa, tem o condão de causar surpresa, mesmo para quem não seja servidor público, tamanha a sua monta, percentual que, assomado à alíquota do imposto de renda, pode consumir mais da metade das remunerações e proventos dos servidores.”

Além disso, o presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, desembargador Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, criticou, na segunda-feira (7/11), as medidas de austeridade propostas pelo governo do Rio de Janeiro e alertou que a apropriação do Fundo Especial da corte pela administração estadual sucateará a Justiça, inclusive com o fechamento de fóruns.

O desembargador chegou a classificar a atitude do Executivo estadual de “um verdadeiro abraço do afogado”. O desembargador contou que, em 2014, o TJ-RJ emprestou R$ 400 milhões ao governo do Rio de Janeiro, o que permitiu ao governador fechar as contas e tomar posse.

Segundo Carvalho, o empréstimo, cujo valor corrigido chega a R$ 500 milhões, ainda não foi pago, “causando evidente prejuízo ao Poder Judiciário”. Além do empréstimo, o presidente do TJ-RJ lembrou que, em 2015, para ajudar o governo fluminense na superação da crise, encaminhou à Assembleia Legislativa projeto de lei conjunto com o Poder Executivo estadual para liberação de valores de depósitos judiciais, que somaram R$ 7 bilhões.

Somados a valores dos precatórios, a quantia liberada atingiu R$ 12 bilhões. O Executivo, por sua vez, se comprometeu a pagar ao TJ valores honrados anteriormente pelo Banco do Brasil e que constituem recursos para custeio do Poder Judiciário, o que não ocorreu, segundo Carvalho, gerando dívida de cerca de R$ 100 milhões.

Para o presidente do TJ-RJ, o governo fluminense não se esforçou para reduzir gastos e evitar o agravamento da crise. “Ao contrário, houve manutenção de despesas expressivas com propaganda, isenções fiscais e nomeação de inúmeros cargos em comissão, como noticiado na mídia, e de gastos também elevados em obras olímpicas.”

Sem dinheiro
A crise financeira do Rio de Janeiro chegou ao seu ápice quando o vice-governador Francisco Dornelles publicou, em junho, decreto declarando estado de calamidade pública. A medida forçou a União a fazer um aporte de R$ 2,9 bilhões no estado e deu ao poder público o direito de tomar diversas medidas para manter a saúde dos cofres públicos.

Entre as razões citadas para a decisão à época estão as Olimpíadas, a queda na arrecadação com o ICMS e os royalties do petróleo e problemas na prestação de serviços essenciais, como segurança pública, saúde, educação e mobilidade.

O Supremo chegou a determinar que o governo estadual repassasse aos poderes Legislativo e Judiciário, ao Ministério Público e à Defensoria Pública, até o dia 20 de cada mês, os recursos destinados por lei a esses órgãos. A decisão foi do então presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Ricardo Lewandowski.

Há também uma decisão de outubro que obriga o estado a pagar os salários dos servidores até o décimo dia útil de cada mês. Além disso, o governo do RJ está proibido de conceder novas isenções fiscais até que apresente um estudo do impacto orçamentário-financeiro de todos os incentivos tributários já concedidos.

Para voltar a conceder isenções, o governo deverá encaminhar à Justiça do Rio, em 60 dias, a relação das empresas beneficiárias dos incentivos (concedidos como créditos tributários futuros), com informações sobre os benefícios fiscais então vigentes.

Segundo o Tribunal de Contas estadual, o Rio de Janeiro deixou de arrecadar R$ 138 bilhões em ICMS entre os anos de 2008 e 2013. O documento constatou que abrir mão desse valor contribuiu para a crise financeira que o estado vive hoje.

O mais recente Projeto de Lei Orçamentária enviado pelo governo à Alerj prevê mais isenções projetadas para os próximos três anos em R$ 33 bilhões. Só no ano que vem seriam R$ 11 bilhões. O professor Luiz Fernando Prudente do Amaral, do Instituto de Direito Público de São Paulo, pondera que as algumas das medidas amargas são necessárias e estão dentro da legalidade, mas que outras são absolutamente questionáveis.

“Todos imaginavam que a decretação se dava para que os eventos relativos às Olimpíadas fossem realizados a contento. No entanto, as medidas anunciadas pelo governador Pezão apenas demonstram que aquele decreto de calamidade não estava baseado apenas nas Olimpíadas, mas sim numa clara crise econômica pela qual passa o Estado, especialmente em razão de uma série de benefícios fiscais que foram dados e pela diminuição de participação nos royalties do petróleo”, explica. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

Clique aqui para ler o voto do relator.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!