Honra no noticiário

Processar jornalista não ataca liberdade de imprensa, defende advogado

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9 de novembro de 2016, 6h30

O direito de propor ação penal em razão de notícia considerada prejudicial à imagem de alguém não pode ser confundido com um ataque à liberdade de imprensa. A argumentação é da defesa do empresário André Luiz Duarte Teixeira, que obteve a condenação do jornalista Aguirre Talento à pena de prisão de 6 meses e 6 dias pelo crime de difamação. A decisão é da 15ª Vara Criminal de Salvador.

Para o advogado do jornalista,  Edil Muniz Junior, o empresário busca “reprimir o trabalho da imprensa baiana” ao mover queixas-crime contra repórteres em vez de entrar com ações de indenização contra os veículos que publicaram as reportagens.

A defesa de Teixeira, representado pelo advogado Gamil Föppel, rebate o argumento. Para ele, a ação foi uma resposta à ofensa à honra de seu cliente. Além disso, ele alegou que o argumento de Muniz Junior visa encobrir o abuso da atividade de imprensa praticado pelo profissional. Ele ressalta que o empresário não pediu que o texto fosse retirado do ar.

“O exercício do direito de propor ação penal em razão das graves máculas à sua honra nem de longe pode ser confundido com tentativa de repressão à atividade da imprensa. A alegação defensiva de Aguirre Peixoto é, em verdade, uma tentativa de mascarar a realidade fática e tentar justificar mais esta condenação. Os textos difamatórios não representam exercício responsável e regular da atividade de imprensa, haja vista que, repita-se, foi veiculada dolosamente uma inverdade que atingiu, de forma grave, a honra do querelante”, afirma Föppel.

Em reportagem, publicada em 2010 no jornal baiano A Tarde, Talento relatou a acusação do MP por supostos delitos ambientais na construção do Parque Tecnológico da Bahia, em Salvador. Na ocasião, os promotores denunciaram os donos e diretores da empresa Patrimonial Saraíba e o então secretário de Ciência e Tecnologia da Bahia, Ildes Ferreira.

Acontece que o jornalista afirmou no texto que o MP também havia pedido a prisão dos suspeitos — algo que o órgão não havia feito. Os empresários André Teixeira, Humberto Riella Sobrinho e Carlos Seabra Suarez moveram queixas-crime por difamação contra Talento. Os dois primeiros já obtiveram sentenças favoráveis. “O que uma pessoa de bem faria se alguém mentirosamente afirmasse que foi pedida sua prisão no principal jornal da capital do seu estado?”, questiona o advogado.

Questão de dolo
Edil Muniz Junior também classificou a condenação de "absurdo". Segundo ele, o juiz não demonstrou que o jornalista agiu com dolo de difamar o empresário ao noticiar erroneamente que o MP pedira sua prisão. Segundo explica, a informação só foi publicada por falta de conhecimento jurídico: Talento, diz ele, achou que o pedido de condenação dos acusados à prisão, que consta da denúncia, fosse um pedido de prisão.

Föppel também rechaça essa argumentação. “Todos os elementos do tipo penal, sobretudo o dolo específico de macular a honra do querelante, foram devidamente comprovados na instrução processual, a qual transcorreu em observância ao devido processo legal”, explica. 

Ofensiva contra a imprensa
Jornalistas e veículos brasileiros vêm sofrendo ataques (e derrotas) nos tribunais que violam os princípios constitucionais de liberdade de imprensa e resguardo ao sigilo da fonte.

Em maio, ao proibir que o jornalista Marcelo Auler publicasse reportagens com “conteúdo capaz de ser interpretado como ofensivo” a um delegado federal, a juíza Vanessa Bassani, do Paraná, praticou censura prévia e contrariou entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre o assunto.

No início do ano, três repórteres, um infografista e um webdesigner da Gazeta do Povo, do Paraná, sofreram 41 processos em 19 cidades do estado por juízes e promotores que se sentiram ofendidos com a divulgação de reportagens que mostravam que eles recebiam remunerações acima do teto do funcionalismo.

Em ação coordenada, todos as petições foram idênticas, pedindo direito de resposta e indenizações por danos morais, que somam R$ 1,3 milhão. De acordo com a Gazeta, os pedidos são sempre no teto do limite do juizado especial, de 40 salários mínimos. Como corre no juizado, a presença dos jornalistas em cada uma das audiências se torna obrigatória. As ações foram suspensas no Supremo pela ministra Rosa Weber — o mérito ainda não foi julgado.

Já o Diário da Região, de São José de Rio Preto, e seu jornalista Allan de Abreu tiveram seus sigilos telefônicos quebrados por ordem da 4ª Vara Federal da cidade. O objetivo era descobrir quem informou à imprensa detalhes de uma operação da Polícia Federal deflagrada em 2011. A decisão foi suspensa liminarmente pelo ministro Ricardo Lewandowski. A liminar foi cassada por Dias Toffoli e um pedido de vista do ministro Gilmar Mendes suspendeu o julgamento da ação ajuizada pela Associação Nacional dos Jornais.

O jornalista Murilo Ramos, da revista Época, também teve seu sigilo telefônico quebrado, em decisão da juíza Pollyanna Kelly Alves, da 12ª Vara Federal de Brasília. A medida foi adotada para apurar quem havia passado para a revista um relatório do Conselho de Controle das Atividades Financeiras (Coaf) com nomes de pessoas suspeitas de manter dinheiro irregularmente no exterior.

Além disso, por ter publicado o valor do salário de um servidor público que atua como contador na Câmara Municipal de Corumbá (MS), Erik Silva, editor-chefe do site Folha MS, está sendo processado por calúnia, injúria e difamação. O jornalista colheu e interpretou dados que estavam disponíveis no Portal da Transparência, constatando que o profissional lotado no órgão Legislativo recebeu, em março, vencimentos de mais de R$ 45 mil — acima do teto permitido por lei, de R$ 33,7 mil, correspondente ao salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal.

Processo 0053399-43.2011.805.0001

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