Crime de difamação

Por conduta "censurável", jornalista é condenado à prisão na Bahia

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5 de novembro de 2016, 16h15

O jornalista baiano Aguirre Talento foi condenado a 6 meses e 6 dias de prisão, em regime aberto, pelo crime de difamação. Além disso, ele também deverá pagar multa de R$ 293. A decisão é da 15ª Vara Criminal de Salvador, segundo a qual a notícia sobre uma denúncia do Ministério Público causou danos à imagem de um empresário. 

Em reportagem, publicada em 2010 no jornal baiano A Tarde, Talento relatou a acusação do MP por supostos delitos ambientais na construção do Parque Tecnológico da Bahia, em Salvador. Na ocasião, os promotores denunciaram os donos e diretores da empresa Patrimonial Saraíba e o então secretário de Ciência e Tecnologia da Bahia, Ildes Ferreira.

Acontece que o jornalista afirmou no texto que o MP também havia pedido a prisão dos suspeitos — algo que o órgão não fez. Os empresários André Teixeira, Humberto Riella Sobrinho e Carlos Seabra Suarez moveram queixas-crime por difamação contra Talento.

Ao julgar a ação de Teixeira, o juiz da 15ª Vara Criminal de Salvador Antônio Silva Pereira considerou “censurável” a conduta de Aguirre Talento, e afirmou que “as consequências [da reportagem] foram danosas, visto que o querelante teve a sua honra maculada”. Com isso, ele condenou por difamação com pena aumentada em um terço pelo fato de o crime ter sido cometido por meio que facilite sua divulgação (artigo 141, III, Código Penal).

Perseguição à imprensa
O advogado de Aguirre Talento, Edil Muniz Junior, disse à ConJur que a condenação de seu cliente foi “um absurdo”. Segundo ele, o juiz não demonstrou que o jornalista agiu com dolo de difamar o empresário ao noticiar erroneamente que o MP pedira sua prisão.

Segundo explica o advogado, o jornalista só publicou essa informação por não ter conhecimento jurídico: Talento achou, conta, que o pedido de condenação dos acusados à prisão, que consta da denúncia, fosse um pedido de prisão.

Muniz Junior também criticou a postura de Teixeira e de seus companheiros da Patrimonial Saraíba. A seu ver, eles tentam “reprimir o trabalho da imprensa baiana” ao mover queixas-crime contra repórteres em vez de entrar com ações de indenização contra os veículos que publicaram as reportagens.

Embargos de declaração
A defesa de Talento opôs embargos de declaração contra a sentença. Neles, Muniz Junior diz que o réu teve seu direito de defesa cerceado, pois o juiz suprimiu a fase de diligências ao término da instrução e indeferiu depoimento de uma testemunha que não foi encontrada porque estava de férias.

E mais: ele questiona a nomeação de advogado dativo para Talento mesmo sem inércia da defesa, algo que contraria o entendimento do Superior Tribunal de Justiça sobre o assunto. Com isso, o dativo, e não Muniz Junior, foi notificado de andamentos processuais, prejudicando o contraditório e a ampla defesa.

Ao final da peça, o advogado requer que o julgamento seja refeito levando em conta tal depoimento e as alegações finais do jornalista.

Ofensiva contra a imprensa
Jornalistas e veículos brasileiros vêm sofrendo derrotas nos tribunais que violam os princípios constitucionais de liberdade de imprensa e resguardo ao sigilo da fonte.

Em maio, ao proibir que o jornalista Marcelo Auler publicasse reportagens com “conteúdo capaz de ser interpretado como ofensivo” a um delegado federal, a juíza Vanessa Bassani, do Paraná, praticou censura prévia e contrariou entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre o assunto.

No início do ano, três repórteres, um infografista e um webdesigner da Gazeta do Povo, do Paraná, sofreram 41 processos em 19 cidades do estado por juízes e promotores que se sentiram ofendidos com a divulgação de reportagens que mostravam o pagamento de remuneração acima do teto do funcionalismo.

Em ação coordenada, todos os pedidos foram idênticos, pedindo direito de resposta e indenizações por danos morais, que somam R$ 1,3 milhão. De acordo com a Gazeta, os pedidos são sempre no teto do limite do juizado especial, de 40 salários mínimos. Como corre no juizado, a presença dos jornalistas em cada uma das audiências se torna obrigatória. As ações foram suspensas no Supremo pela ministra Rosa Weber — o mérito da ação ainda não foi julgado.

O Diário da Região, de São José de Rio Preto, e seu jornalista Allan de Abreu tiveram seus sigilos telefônicos quebrados por ordem da 4ª Vara Federal da cidade. O objetivo era descobrir quem informou à imprensa detalhes de uma operação da Polícia Federal deflagrada em 2011. A decisão foi suspensa liminarmente pelo ministro Ricardo Lewandowski. A liminar foi cassada por Dias Toffoli e um pedido de vista do ministro Gilmar Mendes suspendeu o julgamento da ação ajuizada pela Associação Nacional dos Jornais.

O jornalista Murilo Ramos, da revista Época, também teve seu sigilo telefônico quebrado, em decisão da juíza Pollyanna Kelly Alves, da 12ª Vara Federal de Brasília. A medida foi adotada para apurar quem passou à revista um relatório preliminar de pessoas suspeitas de manter dinheiro irregularmente no exterior.

Além disso, por ter publicado o valor do salário de um servidor público que atua como contador na Câmara Municipal de Corumbá (MS), Erik Silva, editor-chefe do site Folha MS, está sendo processado por calúnia, injúria e difamação. O jornalista nada mais fez que colher e interpretar dados que estavam disponíveis no Portal da Transparência. Assim, constatou que o profissional lotado no órgão Legislativo recebeu, em março, vencimentos de mais de R$ 45 mil — acima do teto permitido por lei, de R$ 33,7 mil, correspondente ao salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal.

*Texto atualizado às 10h44 e às 12h03 do dia 6/11 para correção e acréscimo de informações.

Processo 0053399-43.2011.805.0001
Clique aqui para ler os embargos de declaração.

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