Opinião

Magistratura não se resume aos poucos do levante moralista da toga

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29 de março de 2016, 8h20

Hoje já se sabe que os movimentos das mulheres em 64, que tiveram um grande impacto político na época, longe de significar um empoderamento feminino, foram simplesmente instrumentalizações dos arranjos conspiratórios do Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD) e Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES).

A família, a bíblia e as bravatas contra a corrupção e o comunismo eram a marca das marchas desses movimentos que 'legitimaram' (?) o golpe militar, todas regadas pelo ufanismo integralista, pelo verde-amarelo, tendo como fundo musical o hino nacional brasileiro.

Uma nação sem memória, sem cultura e sem reverência à história é, contudo, o verdadeiro inimigo a se combater. De maneira sinistra, entretanto, as saias voltam a assombrar a nossa democracia, com o surgimento de um levante moralista da toga, de uma pequena parte da magistratura, que basicamente requenta o mesmo arsenal das manifestações que conduziram nosso país à ditadura, à tortura, à morte e à crise do enorme endividamento externo dos anos 80.

O Estado Policial-midiático, a datenização da política, não é filtrada, tampouco percebida por esses juízes. Sem reflexão crítica, e de forma precipitada, os miliciantes togados reproduzem a lógica da sociedade do espetáculo e até mesmo a ridícula mitificação de juízes-Batman.

Esse movimento da toga erige a corporação como valor-maior, acima da democracia e dos direitos humanos. Pari passu, ressurgem com força as corporações policiais e do Ministério Público. O corporativismo renasce, repaginado e neofascista, não apenas em segmentos do movimento sindical, mas, tenebrosamente, no coração do sistema de repressão do Estado. O mal, seminal, serpenteia-se.

Para não repetir a tragédia histórica, urge recordar o terrível Volksgerichtshof, o tribunal político da Alemanha dos anos 30 até o final da segunda guerra, presidido pelo juiz nazista Roland Freisler, conhecido por sua competência, eficiência e violência. Seu estilo teatral de constranger e humilhar os réus — geralmente presos — era muito popular. Seus julgamentos eram velozes. O juiz Freisler tinha uma imensa criatividade para elaborar novas teses jurídicas. Toda semelhança é mera coincidência.

Freisler foi o responsável por milhares de sentenças de morte, mas não obstante seu protagonismo histriônico, não agiu sozinho, já que a maioria dos juízes alemães, ainda que pudesse ter oferecido alguma resistência no início do nazismo, adaptou-se, rápida e comodamente, ao ordenamento do Führer, mesmo porque o seu perfil era conservador e oriundo das classes mais altas.

Mas a magistratura brasileira não se resume, de forma alguma, a esses pequenos grupos radicais. Somos uma das primeiras grandes democracias do ocidente a alistar juízes pelo método mais republicano possível: a via democrática do concurso público. A grande maioria dos juízes tem a inteira compreensão de que não se combate a corrupção, com a corrupção dos princípios jurídicos.

A democracia tem muitas falhas, os direitos humanos não militam a favor da eficiência e da produtividade, as garantias constitucionais são um estorvo ao deslinde de crimes e atos ilícitos. Mas sem observância dessas imperfeitas conquistas da civilização ocidental, o que nos resta é barbárie.

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