Olhar estrangeiro

Condução coercitiva e grampos na "lava jato" chegam à imprensa internacional

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22 de março de 2016, 17h17

A operação “lava jato” — considerada por procuradores, advogados e juízes como a maior investigação contra a corrupção já promovida no Brasil — é noticiada pela imprensa internacional desde que as cifras começaram a alcançar altos patamares — até o momento foram ressarcidos R$ 2,9 bilhões dos R$ 21,8 bilhões pedidos pelo Ministério Público Federal. Porém, depois da condução coercitiva do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da divulgação da conversa dele com a presidente Dilma Rousseff, obtida por grampos da Polícia Federal com autorização do juiz Sergio Moro, as reportagens estrangeiras ganharam novo foco.

Os novos temas debatidos pela imprensa internacional têm sido a atuação do juiz Moro. A rede Al Jazeera, do Catar, traz reportagem de quase 10 minutos sobre a operação "lava jato" e sobre como a imprensa brasileira tem influenciado a opinião pública e incentivado o clima político tenso que o país tem vivido.

Dizem ainda que essa força da mídia é usada pelo juiz Sergio Moro para conseguir apoio da opinião pública para que ele consiga conduzir as investigações na Petrobras com julgamentos que corroborem os apontamentos da imprensa. A atuação de Moro é questionada pela revista inglesa The Economist, que afirma, em um panorama que fez sobre os últimos desdobramentos da crise política brasileira, que o juiz federal pode ter passado dos limites impostos pela atuação da Justiça ao divulgar os áudios da conversa entre Dilma e Lula.

A revista inglesa cita que Moro, no passado, já tinha ultrapassado certas linhas institucionais em outras investigações contra a corrupção. Os excessos do juiz federal também são citados pelo jornalista Jens Glüsing, da revista alemã Der Spiegel. Ele classifica o julgador como “ambicioso”, o compara a um furacão por ter revirado a cúpula política brasileira, tornando-o um herói para a população, e afirma que o único objetivo do magistrado é prender Lula.

Porém, o jornalista alemão ressalta que a maioria das prisões autorizadas por Moro ocorreram sem condenação e com poucas evidências, apesar das delações premiadas — que não podem ser usadas como única prova. Ele afirma que o sucesso obtido pelo juiz federal até o momento “aparentemente subiu à cabeça”, pois o magistrado parece estar fazendo política, o que não é papel do judiciário.

A busca de Moro pela Justiça a qualquer preço também foi citada pelo jornal americano Washington Post, que usou como fonte em uma de suas notícias o professor de Direito da FGV-RJ Ivar Hartmann. O docente, apesar de considerar que o juiz federal tem feito um bom trabalho na “lava jato”, diz que ele passou dos limites ao retirar o sigilo de grampos que captaram conversas envolvendo a presidente da República.

Sobre as escutas, o diretor-adjunto do jornal espanhol El País, David Alandete, analisa o paralelo feito por Moro entre as gravações de Lula e Dilma e o caso Watargate, que envolveu o presidente norte-americano Richard Nixon, em 1974. Segundo o editor, o juiz federal tomou tal atitude por estar “convencido pelo papel que lhe foi designado pela história”. “Esquece que, no caso de Watergate, quem gravou seus adversários não foi um juiz, mas o próprio presidente, que foi obrigado a renunciar. Não é um mau exemplo para um magistrado, especialmente se ele tiver ambições políticas”, afirma.

Para a professora de jornalismo da Universidade Federal Fluminense, Sylvia Debossan Moretzsohn, a crise política vivida pelo Brasil é singular ao ser causada por juízes, que deveriam ser os responsáveis por “zelar pela serenidade”. Em artigo publicado pelo jornal português Público, a docente ressalta que não é de hoje que o juiz federal é acusado de “agir arbitrariamente ao utilizar a prisão preventiva” contra acusados para que eles aceitem firmar um acordo de  delação premiada.

Em seu texto, além de citar o grampo que captou a conversa entre Lula e Dilma, a professora também detalha a escuta autorizada no celular e no escritório de Roberto Texeira, advogado de Lula desde os anos 1980. “Tal é o grau do descalabro a que chegamos. Mas, como em Hamlet, há um método nessa loucura. Quem o apontou foi o professor de Direito Geraldo Prado: Moro 'sabia que mesmo o mais tolerante ministro do STF não concordaria em aproveitar em processo algum uma interceptação telefônica ilícita'. Contava, então, que a revolta de grande parte da opinião pública constrangesse o tribunal a acolher esse tipo de prova.”

Em editorial, o britânico The Guardian, afirma que a escolhas de Moro são questionáveis. Afirma ainda que toda a operação “lava jato” é uma oportunidade para a direita reconquistar parte do poder perdido durante as gestões Lula (2003-2010) e Dilma (2011-até o momento).

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