Justiça Tributária

Aumento do imposto sobre ganhos de capital só vigora em 2017

Autor

  • Raul Haidar

    é jornalista e advogado tributarista ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

21 de março de 2016, 8h01

Spacca
A Lei 13.259 publicada na última semana traz um erro elementar que pode prejudicar os contribuintes. Em seu último artigo afirma que produzirá efeitos a partir de 1º de janeiro deste ano. Trata-se de lei que deseja aumentar imposto com efeito retroativo!

Essa lei resulta da conversão da Medida Provisória 692/2015 e altera a redação da MP 685 que tratava do Programa de Redução de Litígios Tributários, o famigerado Prolerit.  Tais atos já foram comentados nesta coluna. Naquela ocasião, imaginei que o Congresso pudesse rejeitar a matéria e afirmei que se a aprovasse deveria criar para si mesmo o Prosuc (Programa de Suicídio Coletivo).

Quando comentei que o Fisco federal esforça-se para fazer a regra de que neste país, em matéria tributária,  nada está tão ruim que não possa piorar, assinalei que:

“Ao que parece os atos administrativos baixados pelo fisco em geral e especialmente pela Receita Federal estão sendo criados sem qualquer exame de sua legitimidade jurídica. Isso indica apenas duas hipóteses: a) as autoridades fazendárias não contam com qualquer assessoria jurídica; ou b) essa assessoria está ocupada demais com as respostas, explicações ou defesas para tentar consertar os equívocos praticados por jejunos em noções básicas de direito.”

Vemos agora que tal situação não se registra apenas nos escalões inferiores da República, mas alcança todos os níveis de governo, chegando ao topo da pirâmide, que hoje muitas pessoas já consideram como o ponto mais elevado do inferno.

Essa irresponsabilidade na elaboração de atos aos quais se dá o pomposo título de “legislação” tem ignorado solenemente as normas dos artigos 59 e 62 (inciso III) da Constituição Federal. Esse inciso proíbe MP para alterar o nosso Código Tributário Nacional, qualificado de forma indiscutível como lei complementar.

É clara a ilegalidade quanto ao aumento do imposto de renda sobre ganho de capital vigorar neste ano. Basta que se faça singela leitura do artigo 104 do CTN: “Art. 104. Entram em vigor no primeiro dia do exercício seguinte àquele em que ocorra a sua publicação os dispositivos de lei, referentes a impostos sobre o patrimônio ou a renda: I – que instituem ou majoram tais impostos”.

Na exposição de motivos apresentada pelo então Ministro da Fazenda, Joaquim Levy, o projeto da MP 692 foi explicado como consequência da previsão de alterações que nela o Congresso faria. Baseou-se o ministro na “necessidade de ajuste fiscal”  e alegou que era preciso que os contribuintes tivessem “regras claras, transparentes e seguras” para fazer o parcelamento previsto na MP 685, que teve resultados pífios sob o ponto de vista financeiro. Transferiu para os contribuintes, mais uma vez, o fracasso da ação de um governo que não sabe cortar gastos, mas apenas exigir tributação cada vez maior.

Desde sua posse em 2011 e até esta semana a presidente da República editou quase duzentas Medidas Provisórias! A maior parte delas não tem a urgência ou mesmo a relevância exigida pelo texto constitucional. Se o Congresso fosse respeitado, quase todas deveriam ser tratadas como leis ordinárias ou mesmo complementares.

Claro que para isso os congressistas deveriam trabalhar mais do que os cerca de 150 dias por ano em que os mais assíduos comparecem a Brasília. Quando o cidadão vê as tristes cenas de plenários vazios e ouve discursos dirigidos a uma platéia deserta, feitos apenas para ficar nos anais e no diário oficial, ao olhar-se depois no espelho vislumbra o rosto de um palhaço.

O artigo 104 do CTN não permite instituir impostos sobre renda e patrimônio para serem cobrados no mesmo ano em que a lei os tenha instituído ou aumentado.

Certamente que o Fisco, com a sua sanha de arrecadar cada vez mais que um projeto  amalucado ainda quer incentivar através de prêmios aos seus agentes, dará à lei a interpretação que mais prejudique o contribuinte. Com isso, o tal Prorelit (Projeto de Redução de Litígios Tributários) se transforma de vez na única intenção de nossos “governantes” que é a de espoliar cada vez mais o brasileiro, em especial esta parte da sociedade (os sustentadores) que dá 40% da riqueza nacional para manter os privilégios indecentes da outra parte (os sustentados). Até auxílio-moradia para quem tem casa própria!

Quem não aceitar mais essa espoliação, quem não concordar em pagar imposto criado retroativamente com base em evidente negação das leis que são nossa garantia como cidadãos, vai procurar o Judiciário.  

O que era para reduzir litígios vai criar milhares de discussões perigosas.

Sabemos que as defesas administrativas muitas vezes não são julgadas com imparcialidade e que os julgadores podem usar  o ridículo argumento de que não lhes compete apreciar inconstitucionalidade de leis, como se não devessem respeitar a Lei Maior. Ainda bem que temos um Poder Judiciário confiável.

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    é jornalista e advogado tributarista, ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

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